(13) - RELEMBRANDO

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            Na manhã seguinte, eu não me lembrava de muito o que acontecera na festa. Só me lembrava de uma bebida doce extremamente deliciosa, pessoas dançando, Victoria querendo socar Margarett por ela falar demais e...
            Minha declaração bêbada a Connor.
            Aquilo era algo que eu precisava esquecer. Coloquei o travesseiro no rosto como se ele fosse impedir qualquer coisa de me penetrar. Mas era falho. Como se defender de algo que já te possuiu por completo? Como tentar controlar os sentimentos quando eles simplesmente já explodiram? Eu não fazia a menor ideia do que fazer.
            Eu levantei da cama e minha cabeça doía fortemente. Não me lembrava como cheguei ao meu quarto, mas pelo jeito, a única coisa desastrosa foi o final da festa. O chão estava limpo e as roupas em cima da cadeira. Nenhum sinal de desordem. Um motivo a menos para preocupação.
            Olhei para o espelho do banheiro e vi que minha maquiagem estava toda borrada. Ao redor dos meus olhos, tudo estava preto. Joguei uma água e comecei a limpar os restos catastróficos do que sobraram da noite anterior. Saí do banheiro e verifiquei se a janela e a cortina que davam para a janela de Connor estavam bem fechadas.
             Não queria conversar com ele depois de tudo o que disse e esperava profundamente que ele não se lembrasse de nada. O que é a palavra de duas pessoas bêbadas? Se ele insistisse, eu poderia dize-lo que não me lembrava de nada ou que ele estava imaginando coisas. Mas era aí que as coisas se impactavam: eu já estava cansada de negar para mim mesma aquele sentimento.
             Olhei para o relógio do celular e vi que eram onze da manhã. Coloquei uma calça jeans larga e uma blusa preta justa, um tênis e mandei uma mensagem para Victoria. Não sabia se ela já estava acordada, então não esperei uma resposta imediata.
             Fui até o quarto de Scott e bati na porta.
             - Hm? – disse Scott, abrindo a porta, ainda um pouco sonolento. Ele usava pijamas azuis escuro.
             - Pode dizer pro papai que precisei sair? – eu disse, não esperando uma resposta positiva. Scott detestava ser acordado.
             Ele acenou com a cabeça positivamente e fechou a porta para voltar a dormir.
             Voltei para meu quarto para pegar meu telefone e uma mochila pequena, quando comecei a ouvir alguns barulhos de vidro vindo da minha janela. Parei paralisada e tentei não fazer barulho, para que qualquer coisa que fosse, pensasse que eu não estava ali. Dei passos silenciosos para pegar o resto das coisas que faltavam e desci as escadas o mais rápido que pude.
             Tentei me esconder nos pontos cegos entre as janelas para que ninguém me visse dentro de casa. Solicitei um táxi no aplicativo do celular e coloquei o destino na casa de Victoria. Eu só sairia de casa quando o táxi estivesse chegando.
             Sentei na poltrona verde e confortável da sala. Onde eu estava com a cabeça de dizer tudo aquilo para Connor? Em algum momento se passou a ideia de que somos vizinhos, de que ele comandava o time de natação que eu estava prestes a entrar? Por que eu simplesmente não me despedi dele e saí procurando por Victoria?
             O álcool nos faz fazer as coisas mais estúpidas do mundo.
             Quando o aplicativo soou um som de proximidade, saí rápido de casa. Fechei a porta da frente o mais silenciosamente possível e olhei para os dois lados da rua, que estavam vazios. Dei mais alguns passos até a calçada e vi que não havia sinal algum de carro por ali. Soltei um bufo de raiva. Talvez a internet estivesse lenta.
              - Hannah? – ouvi uma voz chamar ao longe.

              "Por favor, não seja quem eu estou pensando..." repeti várias vezes para mim.
               Olhei para trás e vi que Connor estava sentado na varanda de sua casa enquanto olhava sua irmã brincar no jardim da frente. Minhas pernas bambearam e minhas mãos congelaram instantaneamente. Permaneci parada, imóvel, apenas esperando alguma ideia de fuga em minha cabeça.
                Acenei com a mão e dei um sorriso fraco, sem mostrar os dentes, a ele. Ele veio caminhando em minha direção e aí que as coisas pareceram desmoronar. Assim que chegou perto o suficiente, ele disse:
                - Eu te avisei que seu teste é na segunda, certo?
                Senti meu corpo relaxar de alívio e pude respirar normal novamente.
                - Ahn... – eu disse, tentando me lembrar. – Sim, claro. De tarde, não é?
                - Isso! – ele disse, sorrindo. – Pensei que tivesse esquecido de avisar você de novo. São poucas as coisas que me lembro de terem acontecido ontem.
                Fiquei ainda mais aliviada. Olhei para o telefone para ver se o táxi estava se aproximando, atônita.
                - Também me lembro de poucas coisas. – eu disse, mentindo e tentando disfarçar enquanto olhava para os dois lados da rua. – Só me lembro de uma bebida roxa muito gostosa e pessoas dançando loucamente.
                Connor sorriu.
                - É... – ele disse, enquanto olhava para trás para verificar se irmã ainda estava perto de casa. – Alex tem uma habilidade muito boa em preparar bebidas que nos fazem esquecer das coisas.
                Finalmente, um carro amarelo apareceu no final da rua, vindo em direção a nós dois. Fiquei ainda mais aliviada. Aquela fora uma das conversas mais desconfortáveis que tivemos. Eu não sei se estava feliz ou triste por ele não ter se lembrado das coisas que eu havia dito a ele na noite anterior, mas estava animada pelo carro ter acelerado e chegado rápido até mim. Nós nos despedimos com um aceno simplório.
                Antes que eu abrisse a porta do carro, Connor disse, de longe:
                - É um bom disfarce. Maleta de meias.

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