Sábado. Um dos únicos dias que eu poderia acordar tarde e não me preocupar com aulas e natação. Mas em especial naquele sábado de abril, eu me levantei mais cedo que o costume. Como no colégio e nos treinos, Connor parecia ser bastante pontual.
Fui acordada pelo barulho alto da televisão e os gritos de Scott. Ele havia perdido algum jogo de basquete na semana e resolveu vê-los no único dia em que eu precisava acordar tranquila.
Tentei me equilibrar com a perna doendo, e andei devagar até o banheiro, prendendo os cabelos. Lavei meu rosto com água fria e passei uma leve maquiagem. Olhei para a janela que dava para a janela de Connor, que ainda estava fechada, assim como a cortina laranja.
No closet, estava em dúvida sobre qual blusa vestir. Particularmente, preferia cores mais escuras, mas naquele dia eu usaria tons mais claros. Escolhi uma blusa rosa clara fina com manga e um short jeans largo com um cinto preto. Coloquei um tênis branco e desci para tomar café.
Depois de demorar um tempo maior para chegar até o primeiro andar, assobiei para Scott e fiz um gesto para que ele aumentasse ainda mais o barulho da televisão. Rindo, ele assentiu.
- Você pode, por favor, abaixar isso? – gritou minha mãe irritada da cozinha.
Scott deu um grito com o lance no jogo e depois abaixou o volume, rindo.
- Por que está acordada tão cedo? Odeia acordar cedo no sábado. Ainda mais acidentada. – retomou ela, debochando no final.
- Acidentados também sentem fome, mãe. – respondi, abrindo a geladeira e pegando um suco de caixinha.
Subi para meu quarto novamente e fechei a porta. Deitei na cama e comecei a mexer no telefone para passar o tempo até Connor aparecer. Meu telefone vibrou com uma mensagem."Você está bem? Pensei em visitar você ontem mas deixei para lá.", disse Victoria.
"Estou bem. Minha perna está menos inchada. Isso não vai ficar assim.", respondi na mesma hora.
"Espero que Raymond deixe você fazer o teste quando sua perna melhorar.",
Quando comecei a digitar a resposta, ouvi alguns barulhos vindo da minha janela. Olhei para o lado e vi Connor sentado no parapeito de sua janela, olhando para mim. Levantei o mais rápido possível da cama e fui até minha janela.
- Não achei que estava falando sério. – menti, para tentar acalmar minha ansiedade.
- De madrugada eu sou a pessoa mais sincera do mundo. – respondeu ele, descendo da janela. – Vou te esperar na porta da frente.
Peguei uma bolsa marrom e desci para o primeiro andar com calma. Olhei para cozinha e vi que estava vazia, assim como a sala. Havia um recado escrito pela minha mãe pregado na porta da geladeira, dizendo:"Scott precisou treinar no colégio esta manhã. Voltamos mais tarde."
Dei um sorriso satisfeito por não ter de dar explicações e fui para a parte da frente da casa.
Connor estava usando uma camisa preta de manga curta, uma bermuda jeans bege clara e um tênis velho cor vinho. De longe seu perfume era perceptível; um aroma amadeirado tomou conta dos trinta centímetros ao redor de seu corpo.
Assim que fechei a porta, ele se levantou do degrau onde estava sentado e deu um sorriso breve.
- Pronta para uma grande aventura, milady? – disse ele sarcasticamente, estendendo a mão para mim.
- Mas é claro, meu bom senhor. – eu disse, também lhe esticando a mão, de modo irônico.
Connor pegou minha mão e fomos caminhando juntos até o carro de seu pai. Senti uma dor levemente forte em minha perna e respirei fundo, tentando demonstrar que estava tudo bem. Entramos no carro e passei a mão firme em minha canela.
- Espero que esteja tudo bem. – disse Connor, ligando o carro. – Não quero ter que ser acusado por omissão de socorro.
Dei um sorriso sem mostrar os dentes e senti meu rosto ficar quente. Connor entrou na estrada principal e fomos em direção a parte mais antiga da cidade.
Connor me contou algumas histórias sobre o bairro em que morávamos; quem morava na casa assombrosa da esquina, quais eram as crianças que jogavam papel higiênico nas casas durante o halloween e até mesmo sobre os maridos adúlteros com suas esposas perfeitas. Ele sorria a cada parte cômica dos fatos e fazia algumas caretas com as desagradáveis. Era uma pessoa muito inteligente e carismática, que colocava um toque de humor em cada momento em que conversávamos. Estava sendo bom fazer uma amizade com alguém como ele.
- E assim que se deve agir diante da senhora Jenkins, ou ela pode ameaçar de jogar uma panela em você. – disse ele, estacionando o carro.
O movimento era grande perto da praça onde Connor e eu estávamos. Havia uma feira não muito longe dali e as pessoas carregavam muitas sacolas com frutas e guarnições por todas as direções. Connor cumprimentava algumas pessoas que passavam por nós. Ele também era muito comunicativo.
Enfim chegamos em um ponto mais calmo, onde as árvores soltavam folhas verdes e amareladas e a grama era tão limpa e macia que se assimilava a um tapete. Alguns bancos de concreto estavam espalhados pela praça e a pequena fonte jorrava uma água cristalina. Os pássaros cantavam e latidos de cachorros eram ouvidos de longe.
Nos sentamos em um dos bancos e Connor começou a dizer:
- Sempre vinha aqui com meus pais quando eu era mais novo. Eu e meus amigos gostávamos de ver quem conseguia se equilibrar na borda da fonte. Hoje, metade deles estudam na Marquette e a outra metade foi embora da cidade.
Engoli seco mas não consegui dizer nada.
- É horrível pensar que o esporte pode nos tornar tão distantes.
- Você compete contra seus amigos de infância? – perguntei, assustada.
Connor balançou com a cabeça. Daquela vez, não havia nada cômico para eufemizar a situação, até que ele disse:
- Mas sempre ganhamos! Marquette é boa no basquete e na queimada. MCHS é boa na natação e vôlei.
Lembrei da sensação de ganhar um campeonato de natação e respirei fundo.
- Já ganhei alguns campeonatos com meu colégio antigo. – eu disse. – Meu capitão era incrível.
- Então você já se envolveu com outro capitão antes?! – disse Connor, colocando a mão na boca com uma expressão irônica no rosto.
- Alguns gays são bastante perfeccionistas, não? Talvez seja por isso que me considero tão boa nos saltos.
Connor ficou em silêncio por alguns segundos, depois de uma longa risada de alívio, aparentemente.
- Então... como você pôde cair de lá de cima?
- Eu. Não. Caí!
Connor sorriu sem graça e cutucou minha costela, me fazendo cócegas. Dei um sorriso sem graça e comecei a dizer:
- Scott entrou para os Wolves. Espero que pelo menos nesse esporte a Marquette possa ganhar de nós.
- Eles ganham tudo, menos a natação. MCHS só é boa em natação, o resto é simplesmente uma porcaria.
- Ei! – eu disse, repreendo-o. – Victoria é do time de vôlei e eles jogam muito bem!
- Ah, claro! – disse Connor se corrigindo. – Victoria é uma excelente capitã. Um pouco mandona e grita muito, mas é desse jeito que ela consegue colocar o time nos eixos.
Após dizer isso, Connor e eu resolvemos caminhar um pouco. Apesar de minha dor na perna, senti que precisava movê-la com mais frequência para que eu pudesse nadar logo. Tentei novamente demonstrar que tudo estava bem a Connor e estava conseguindo. Aquela dor na perna precisava durar por pouco tempo.
- Por que você e Margarett estão juntos há tanto tempo se você não se sente confortável mais? – perguntei, enfim.
Connor respirou fundo e demorou alguns segundos para começar a falar:
- É complicado, Han. A Maggie era uma pessoa muito... boa, há alguns anos. Eu não queria sair com ela porque ela sempre era muito histérica. Mas no nosso primeiro encontro, ela se demonstrou uma pessoa totalmente diferente e começou a conversar sobre uns assuntos bem interessantes. A pedi em namoro duas semanas depois, no pátio do colégio.
Ele chutou uma pedrinha que estava no meio do caminho e fez uma pausa.
- Depois de alguns meses, ela começou a impor. Dizia o que eu teria de vestir pra ir ao colégio e sobre como me portar diante dos pais dela. Controlava minha alimentação e decidia se eu sairia ou não com meus amigos. Começou a se tornar insuportável, mas... prefiro esconder esse assunto. Não estamos mais juntos. Quer dizer, estamos mas não estamos.
Connor parou novamente e olhou para mim.
- E você, Han? Qual seu desastre amoroso? Algo que possa superar meu grande armazenamento de paciência?
Dei uma risada sem graça e um filme veio em minha cabeça.Petter estava correndo atrás de mim na piscina e eu tentava fugir dele o mais rápido possível. Meu coração estava acelerado e um leve desespero tomou conta de todas as células do meu corpo. Meu riso descontrolado estava me impedindo de ter mais fôlego para nadar, até que senti algo puxando meu pé.
Dei um grito e comecei a rir mais ainda quando Petter saiu da água e balançou seus cabelos loiros, jogando gotículas de água por todo o lado. "Peguei você", ele sussurrava bem perto de meu rosto, até que nossos lábios se encostaram.
- Tive um namorado. – eu disse, fechando os olhos e voltando para a realidade. – Mas nada tão estranho quanto você e Margarett. A única coisa que importa é que o sentimento era unilateral e instável. E isso não tem influência nenhuma sob mim hoje. Então está tudo bem.
Caminhamos até uma pequena lanchonete no final da praça. Seus vidros estavam sujos e embaçados, mas o letreiro iluminado permanecia aceso, mesmo durante o dia. Connor entrou lá e saiu minutos depois segurando dois croissants e me entregou um.
- Esse é o melhor brunch que você pode ter. – disse ele, dando uma grande mordida em seu salgado. – E esse é o croissant mais incrível que você vai comer em qualquer lugar do mundo.
Dei uma mordida e senti o queijo derretido deslizar em minha boca. O salgado era realmente delicioso.
- Agora sou o vizinho legal que curte conversar com pessoas divertidas como você – perguntou Connor. – Ou ainda um capitão desconhecido, mas não gay?
- Você é meu vizinho que me apresentou o melhor croissant de queijo do mundo inteiro. – respondi, dando mais uma mordida no salgado.
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No Nível Da Água
Romantik"É sério, eu não sei como, mas sou uma pessoa que atrai muitos problemas. E naquela mudança, eu tentaria ser diferente. Sim, eu ia focar na natação e fazer novos amigos. As pessoas não ficavam muito tempo na minha vida. Mas tudo mudou quando eu bat...