(18) - O PONTO FINAL

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            Eu estava perplexa. Eu desejava Connor, mas não tanto quanto eu imaginava, até o momento acontecer. E a partir daquilo, era como se meu coração batesse por mais alguma coisa, como se parte daquelas batidas fossem direcionadas à alguém. Eu sentia o sangue correr mais rápido dentro do meu corpo e meus sorrisos eram mais radiantes do que qualquer outra coisa que emanava luz perto de mim. Nenhuma descarga elétrica, nem a mais potente no mundo, era capaz de chegar aos pés de quando nós nos abraçávamos. As voltas do mundo diminuíam a velocidade quando nós nos beijávamos.
            E aquela tarde serviu como um divisor de águas; se alguma parte de mim ainda duvidava de algo entre Connor e eu, talvez essa parte tivesse se afogado na piscina. Então, percebi que as coisas poderiam possivelmente dar certo.
            Chegando em casa, percebi que o carro do meu pai estava na garagem, assim como o de minha mãe, o que era estranho, pois meu pai costumava nos buscar no colégio e voltar para o trabalho logo em seguida. Caminhei devagar e percebi que a porta da entrada estava entreaberta. Coloquei o ouvido na pequena abertura para entender o que estava acontecendo ali dentro.
             - ... você precisa manter a calma, Lauren! – disse meu pai, mais baixo do que o costume.
             - Sei disso, Charles! – minha mãe respondeu brava. – Mas é impossível! Você acha que eu não sei que vocês ainda mantém certo tipo de contato? Pareço tão ingênua assim?
             - O que você está insinuando? – ele retrucou, bravo. O silêncio reinou por alguns segundos. – O que você está insinuando, Lauren?
             Minha mãe ficou calada. Aproximei mais minha cabeça da porta, até que essa se abriu um pouco mais e fez um grunhido enferrujado.
             Maldita casa velha.
             - Scott? – perguntou meu pai, voltando ao seu tom de voz normal. – Hannah, é você?
             Empurrei a porta com um pouco mais de força e entrei pela sala, tentando fingir que não tinha ouvido nada da conversa. Minha mãe estava encostada no marco da porta da cozinha e meu pai estava próximo a ela.
             - Tudo bem? – perguntei confusa, sem saber o que dizer.
             - Claro! – respondeu meu pai, tentando desconversar. – Eu e sua mãe só estávamos conversando sobre o jantar.
             Claro. Sobre quem ele estava jantando às escondidas, talvez.
             Caminhei em direção as escadas e dei um sorriso para meu pai. Minha mãe ainda demonstrava estar nervosa, mas não com raiva. Era um nervosismo diferente depois que a porta se abriu, como se algo a preocupasse além de uma simples traição, como se eu pudesse ter ouvido mais alguma coisa que não deveria. Ela arqueou uma sobrancelha, indicando que eu deveria ir para o quarto. E assim o fiz.
             Joguei minha mochila no chão, tentando esquecer completamente o que eu tinha acabado de ouvir acidentalmente lá embaixo. Me joguei na cama e balancei as pernas até que os tênis saíssem sozinhos dos meus pés. Dei um sorriso para mim mesma e fiquei ali por alguns minutos, pensando que aquele tinha sido o melhor treino de toda minha vida.
             Apesar de querer sigilo com tudo aquilo, peguei meu telefone e mandei uma mensagem para Victoria, apenas com um joinha. Não esperei resposta alguma. Eu queria aproveitar aquele resto de dia sem nenhuma interrupção. Nos próximos dias, no fim de todas as aulas, os treinos eram obrigatórios, até o dia do campeonato. Não que eu não estivesse com esperança, mas seria bom receber uma recompensa daquelas quando meus nados fossem satisfatórios.
            Minha respiração foi se tornando cada vez mais calma e meus batimentos tinham voltado ao normal. Toda aquela euforia havia diminuído e o cansaço repentinamente bateu forte em mim. Resolvi fechar os olhos e deixar que eu fosse carregada por um sono tranquilo e meu corpo se encarregasse de apenas descansar.


             Fui acordada após algumas horas por um feixe de luz que vinha da janela de Connor. Levantei da cama, ainda um pouco sonolenta, e fui em direção a minha janela para procurar por ele em seu quarto. Contudo, não era só a voz de Connor que eu ouvia vindo do seu quarto. A voz de Margarett também estava lá.
              Eu me abaixei rápido e abracei minhas pernas, embaixo da janela. Aparentemente, os dois ainda não tinham iniciado a conversa.
              - Você sabe porque chamei você aqui. – disse Connor.
              Sua voz estava longe, mas ainda era possível distinguir suas palavras.
              - Não, eu não sei, Connor. – respondeu Margarett, impaciente.
              Eu imaginava sua pose: em pé, de braços cruzados e com um olhar ameaçador.
              - Eu quero encerrar o acordo. – ele disse. Suas palavras me acertaram como uma flecha, mesmo não sendo direcionadas a mim.
              Alguns minutos de silêncio foram o suficientes para me deixarem cada mais vez ansiosa.
              - Não... – disse Margarett, aparentemente desapontada.
              - O que? – perguntou Connor.
              - Você ainda precisa da bolsa! E eu ainda preciso de você! Você não entende, Connor? Eu ainda amo você!
              Connor ficou calado, mas logo se pronunciou:
              - Precisar? Maggie, você ainda não percebeu que isso é simplesmente uma troca? Não existem sentimentos aqui!
              - Você está me dizendo que não sente absolutamente nada por mim? – seu tom de voz aumentou e ficou mais raivoso.
              Connor novamente se calou.
              - Isso tudo é por causa da Collins? – Margarett perguntou indignada.
              - É! – ele respondeu, com raiva. – E por muitas outras coisas. Cansei de me prender a suas correntes invisíveis. Você não me escuta, você não me entende, você não sabe pensar em nada além de ganhar! A vida não é uma competição, Maggie! E você não me ganhou com essa bolsa!
              O choramingo de Margarett era alto o suficiente para que atravessasse o lote e entrasse em meu quarto. Ergui um pouco a cabeça e tentei ver por além da fresta da cortina de Connor, mas não consegui enxergar nada além da estante de madeira.
              - Isso não vai ficar assim. – ela disse, séria e firme, saindo do quarto e batendo a porta.
              Eu me levantei de onde estava e olhei em direção a janela. Connor não tinha apagado a luz, tampouco aberto as cortinas. Ele estava lá, parado em seu quarto, sentado em algum lugar, provavelmente pensando no próximo passo que daria. As palavras de Margarett não saíam barato e ele, mais do que ninguém, reconhecia isso.
              Olhei no telefone e vi que ainda eram onze da noite. Tarde para uma discussão daquelas, mas cedo para nossos encontros da madrugada. Mesmo assim, isso não me impediu de chama-lo para conversar. Sem jeito e sem saber o que falar, assoviei para que ele chegasse até sua janela. Mas o que eu falaria?
              Perguntaria o que ele achou do beijo? Idiota demais. Convidaria ele para mais um treino? Ofereceria alguns biscoitos que minha mãe tinha feito? Tarde demais para pensar.
              Connor apareceu na janela e se debruçou no parapeito de madeira. Ele arqueou uma sobrancelha e deu um sorriso sem graça, mas animado. Sorri de volta, no intuito de ainda pensar em alguma coisa, mas sem sucesso.
              - Os treinos vão ser todos os dias? – perguntei, sem pensar.
              Era a única coisa que estava na minha cabeça?
              Como se eu já não soubesse a resposta.
              Connor continuou sorrindo e me encarando, disse:
              - Vão. – respondeu ele, maliciosamente. – Mas os nossos não serão necessariamente no ginásio.
              Ficamos em silêncio por alguns minutos, até que ele o interrompeu:
              - Você ouviu?
              Eu não sabia o que responder e o tempo para pensar era curto. Abri a boca para responder, mas é como se as palavras tivessem ficado presas em alguma parte do meu corpo.
              - Ahn... – eu disse, tentando indagar algo.
              Connor fez um sinal com as mãos para que eu me afastasse. A lua não estava tão brilhante quanto nas outras vezes em que ele pulava em meu quarto, mas o suficiente para iluminar os locais onde ele pisaria para entrar. Assim que ele entrou, tranquei a porta do quarto e apaguei as luzes, deixando apenas o abajur aceso.
              Nós nos sentamos no chão um ao lado do outro, mais próximos do que todas as outras vezes. Connor pegou minha mão e deu um beijo suave em suas costas. Seus lábios quentes e macios arrepiaram todos os pelos do meu corpo.
               - Como você se sente? – perguntei, por fim.
               - Livre...? – ele disse, desengonçado. – Estranhamente livre. E mais sem rumo do que nunca.
               - Bem-vindo ao meu mundo. – eu disse, tentando quebrar o clima estranho que pairava ali.
               Um sorriso fraco se formou em seus lábios. Ele pegou minha outra mão e começou a acaricia-la de leve. Fechei os olhos e, apesar de estarmos em uma situação desconfortável, eu queria que o tempo passasse mais devagar.
               - E um pouco apreensivo. – disse ele, depois de algum tempo. – Os passos de Margarett são indecifráveis.

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