Uma hora depois

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Uma hora depois

Pegamos muitas conchas, mais do que o esperado, e rimos muito uma da outra.

Eu sentia falta disso. Sentia falta dela.

Estávamos voltando para casa quando um carro parou do nosso lado e uma figura desceu do outro lado com o salto estalando no asfalto e o cabelo escondido por um lenço que cobria o seu rosto, porém eu reconheceria Vanessa em qualquer lugar do mundo.

Parei onde estava, ela também, nos encaramos, poderia sentir a corrente elétrica ao nosso redor, sentia minha pele arrepiando e minhas mãos se fechando em punho.

“Senti meu coração afundando dentro do meu peito, preso com amarras por causa das suas palavras. Eu precisava do seu amor! Eu precisava dele! Eu o amava!”

Balancei minha cabeça e virei o meu rosto para minha mãe, disse que ela deveria continuar e nós nos encontraríamos em casa.

Com um aceno cortês de cabeça ela seguiu a direção que deveria.

Esperei um pouco para que ela estivesse longe o suficiente e não ouvisse nossa conversa, não queria que ela descobrisse algo que ainda não sabia sobre William daquela maneira.

— Podemos conversar, Beth? Pelos velhos tempos? — ela me lançou um sorriso que qualquer um pensaria ser caloroso e amigável, porém eu a conhecia melhor do que isso, conhecia cada lado que ela desejava mascarar e sabia como ela o fazia.

Não seria enganada.

— Meu nome não é Beth, então não me chame desse jeito — disse com a voz cortante vendo o sorriso dela escorregar de seus lábios e ser substituído por um arregalar de olhos surpreso.

Eu não tinha mais nada a perder. Não possuía uma dívida com ela ou algo que me fizesse pensar duas vezes em minhas palavras.

— Não quero brigar, eu só queria dizer que... eu sinto muito, por Will — ela me olhou.

Eu estava prestes a retrucar quando ela abaixou o seu lenço e eu vi que seus belos cabelos ruivos pecaminosos estavam cortados, cortados tão ridiculamente curtos e desregulares que se olhasse apenas para o seu rosto, pensaria que era um homem.

Passou a mão por seus antigos cabelos, pelo lugar em que eles estariam, abaixo de seus ombros, em um pequeno e trabalhado cacho que ela estaria enrolando em seu dedo, mesmo sabendo que pouco depois ele voltaria a ser apenas liso.

— O que aconteceu? — minha voz estava menos ácida.

Pela expressão do rosto dela, as lágrimas que seus olhos estavam formando e a maneira como ela olhava de um lado para o outro da rua, eu sabia que algo estava errado.

— Nossos amigos. Seus antigos amigos e — ela hesitou engolindo a seco — eu acho que os meus também — sorriu e limpou as lágrimas com a sua mão, estava sem maquiagem — eu desmaiei depois de beber demais, quando acordei meu cabelo estava assim e havia algo escrito em meu braço...

Não resistiu, começou a chorar.

Andou até mim, abraçou-me procurando consolo, enquanto eu tentava encontrar uma palavra de auxílio que eu teria entregado de boa fé há algumas semanas; hoje eu olhava para ela e pensava que era isso o que acontecia com quem criava cobras como bichinhos de estimação.

— Eu não sei o que estava acontecendo até que todos estavam me ignorando — ela limpou as lágrimas e começou a rir — eles descobriram outro traficante e agora não precisam mais de mim.

— Você tinha amigos por causa das drogas? — perguntei com um tom acusatório não proposital, ela já estava em prantos, não precisava de mim para piorar a sua situação.

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