Três horas depois

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Três horas depois

Nós andamos pelas ruas. Eu estava segurando meus sapatos com uma mão e a mão dele com a outra. Fazíamos piadas de alguns cartazes e ríamos das pessoas bêbadas demais que não conseguiam encontrar o caminho de suas casas.

Ele não soltou minha mão um segundo, por nada.

Nós andamos para cima e para baixo, passamos por algumas casas mais de duas vezes e em momento algum ele comentou que estava cansado.

Jamais paramos de falar, nem mesmo quando acabamos falando de William, não falamos dos seus últimos feitos, porém de suas virtudes.

Pedi para que ele me levasse até a minha casa, então começamos a criar caminhos imaginários tentando cobrir todos os pontos turísticos da ilha até o tal lugar, entretanto acabamos optando pelo caminho mais rápido.

Ele começou a me contar algo sobre mecatrônica e mecânica, sobre os cursos que estava fazendo, contudo acabou parando quando percebeu que aquilo era algo muito mais avançado do que eu sabia e que não estava entendendo nada.

Paramos na porta de minha casa ainda conversando, eu estava rindo de alguma desventura que ele narrou e não conseguia retomar o meu fôlego.

Quando o fiz, pensei que o melhor seria se eu não o tivesse feito.

Não estava pronta para lidar comigo mesma.

— Então agora é o momento que eu digo boa noite? — ele perguntou bocejando e se espreguiçando, o sol ainda não havia nascido, contudo eu tinha certeza que estava prestes a nascer.

— Boa noite, boa noite, não importa quantas vezes eu diga boa noite, não parece ser suficiente — comentei, melodramática, esperando e ouvindo a risada dele preencher o silêncio da calada noite.

Nossas mãos ainda estavam juntas, não por muito tempo, percebi, e eu não queria soltá-lo. Algo nele, em seu semblante, me fazia pensar que se eu soltasse, talvez eu não conseguisse recuperá-lo depois.

Algo poderia ser perdido de um dia para o outro.

— Eu... — hesitei, não sabia direito como agradecer por tudo o que ele fez por mim naquela noite, durante tanto tempo, suportando-me até mesmo nos momentos que eu não me suportava — posso pedir um favor?

— Claro — ele olhou para o seu relógio e sorriu para mim, como se estivesse mostrando que ainda tinha tempo.

— Eu não queria ficar sozinha — murmurei olhando para ele e depois desviando meus olhos.

Sabia como a minha frase havia saído e sabia que ao longo de meses muitos garotos queriam que eu a tivesse pronunciado, porém, talvez pelo fato de ele não esperar aquelas palavras, foi esse o motivo que me fez dizê-las.

— Seus pais estão viajando? — ele questionou olhando para mim sem entender direito o meu ponto.

— Eles estão em casa, eu só... eu só não queria ter que ir dormir e acordar sozinha — se tivesse uma brisa passando por nós, ela provavelmente seria mais alta do que o meu sussurro.

Havia dúvida em seu olhar, lógico que haveria dúvida, o que eu estava pedindo não era algo básico, eu estava basicamente implorando para que ele dormisse com as suas roupas na mesma cama que eu.

— Eu não posso — ele meneou a cabeça e eu soltei sua mão.

Não queria forçá-lo a ficar, forçá-lo a desobedecer uma ordem ou pedido de seus pais, porém não poderia negar a mim mesma que eu queria que ele aceitasse minha oferta.

“Eu estava com medo depois de acordar do meu pesadelo. Não costumava tê-los, porém quando eles surgiam, eu nunca conseguia voltar a dormir.”

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