23 - Falsa Oferta

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Haviam algumas verdades irrefutáveis na minha vida. Eu era a reencarnação de uma vampira que nasceu há muito mais de duzentos anos atrás; a liderança da Irmandade me possuía e eu deveria pegar o que me era de direito; a vida de Stella era muito semelhante a minha apesar dos pesares; eu amava Nicole, não podia negar isso de forma alguma; porém também possuía sentimentos por Lucas. Eu não sabia o que fazer.

O amor que eu sentia por Nicole era esmagador, quase não dando Lucas chance alguma nessa disputa, se é que havia uma disputa. Eu quase acreditava no que Elena me dissera: que estávamos predestinadas, fadadas a ficarmos juntas. No entanto eu precisava jogar limpo, com todas as cartas na mesa e para isso precisava saber o que Lucas sentia por mim de verdade.

Nos últimos dias, após todo o trauma, quase não vi Isabela em casa. Ela estava pegando plantão atrás de plantão e quando não estava no hospital costurando as pessoas estava deitada ao meu lado na cama, com medo de dormir sozinha. Naquela segunda-feira chuvosa ela estava afogada em trabalho e eu estava indo atrás de respostas.

O ar estava quente dentro do carro, o caminho até a casa de Lucas era curto, porém demorei cerca de quarenta minutos sentada dentro do carro até decidir ir ou não. Quando finalmente liguei o carro e atravessei a saída da cidade com o velocímetro acima de não mais do que vinte quilômetros por hora ainda não sabia se era a coisa cert a se fazer.

- Merda. - sussurrei e pisei no acelerador.

Eu tinha de continuar e perguntar a ele. Perguntar não ofende, não é verdade? Eu só queria saber, precisava ouvir alguma coisa dele para pode riscar o seu nome da lista de uma vez por todas.

No entanto, antes de virar a curva, observei um corpo se formar diante do carro. Pisei no freio e o ar me escapou por longos segundos. Dimitri estava parado no meio da estradinha praticamente esquecida que saia da cidade. Todo de preto, com as mãos enfiadas no bolso de sua calça e um sorriso malicioso nos lábios.

A porta se abriu e ele estava sentado ao meu lado, com a mão repousada sobre a minha no volante.

- Oi minha querida. - ele sorriu.

Retirei minha mão rapidamente e abri a porta do carro.

- Não. Fique. - ele se virou e segurou meu braço - Tenho uma proposta interessante que você irá gostar de ouvir.

Endireitei-me no banco, porém deixei a porta aberta e o carro ligado. Estar na presença dele me causava ânsia, nojo e raiva. Trazia a tona todas as memórias daquele tempo que eu tentava esquecer.

- O que você quer? - perguntei rispidamente.

- Vamos até a sede da Aliança para podermos conversamos melhor. - Dimitri esticou sua mão com o intuito de encostar em meu rosto, porém desistiu.

- Se você quiser falar alguma coisa fale agora, caso contrário vá embora agora!

Dimitri sorriu, abriu a porta do carro e saiu. Deu a volta e esticou a mão cordialmente em minha direção. Sai do carro tentando ignorá-lo e me recostei no capô, com os braços cruzados em uma tentativa de esconder minhas mãos tremulas.

- Você está linda Aurora, realmente deslumbrante. - Havia esse olhar no rosto de Dimitri quando ele estava perto de mim que, se visto de fora, se assemelhava ao olhar de um homem apaixonado olhando para a mulher que ama, porém eu sabia o que havia por trás daquele olhar, era um homem cruel que não sabia a diferença entre certo e errado.

- Fale logo o que você quer Dimitri.

Ele gargalhou e um arrepio gelado se espalhou pela minha pele.

- Eu quero sua fidelidade, mas isso não é novidade. - ele parou a dois passos diante de mim, com as mãos novamente dentro dos bolsos - Mas novamente não vim aqui lhe pedir tal coisa. Eu só queria te ver, sem toda aquela algazarra que Baltazar arranjou naquela noite. Como está a sua amiga falando nisso? Isabela não é verdade?

- É sério Dimitri, diga logo o que você quer ou eu vou embora. - tentei deixar minha voz firme o suficiente para que ele me levasse a sério.

Senti seus olhos vasculharem cada parte do meu corpo de modo invasivo, se pondo em algumas por mais tempo que outras. Dobrei minha mão esquerda de modo a esconder a marca sob o meu braço cruzado.

- Você me lembra muito alguém que conheci a muito tempo atrás. Ela era uma mulher mandona e cheia de si assim como você, porém, - ele deu um passo a frente e eu um para o lado - ela não tinha essa força que você tem, não tinha essa beleza esplendorosa.

Um sentimento ardeu no meu peito, um sentimento meu e de Stella. O ódio que ardia dentro da minha alma pertencia a nós duas e era um combustível e tanto que eu alimentava todos os dias.

Virei-me e fiz menção a voltar para o carro, porém sua mão se envolveu acima do meu cotovelo esquerdo firmemente.

- Está bem, está bem.. - Dimitri estendeu a mão no ar teatralmente - Eu quero te pedir uma coisa e preciso que você escute com muita atenção e leve em consideração a minha oferta.

Minhas pernas tremiam, havia medo dentro de mim se camuflando em meio ao ódio. Eu tinha medo dele e não tinha como negar isso, eu sabia do que ele era capaz de fazer, havia sentido toda a sua psicopatia na pele.

- Estou ouvindo. - respondi.

- Ótimo. - ele respirou profundamente - Estou disposto a esquecer tudo o que já aconteceu até aqui, estou disposto a deixar você livre. Uma renegada livre já viu isso? Viva sua vida ao lado da sua amiga médica ou do lobisomem que você estava indo visitar, farei isso por você porque você merece. - Dimitri veio até mim e segurou meu rosto em sua mão, acariciando minha bochecha com o polegar - E eu me importo com você, sabe disso.

Dei alguns passos para trás e ele cerrou o maxilar.

- Em troca de que?

- Eu quero só uma coisa, me dê essa pequena e única coisa e viva a vida que quiser, com quem quiser, aonde quiser.

- Fala.

- Nicole. - ele sorriu - Quero Nicole Regal. Viva de preferência, mas se estiver morta também tanto faz.

Senti uma vontade esmagadora de agarrar seu pescoço com as minhas mãos e quebrar todos os seus ossos. Aquele tremor irritante agora se espalhava por todo o meu corpo se transformando em raiva, um ódio puro ao imaginar aquelas mãos sujas tocando em Nicolr.

- O que você me diz?

Respirei fundo e esfreguei a testa em uma tentativa inútil de aliviar a dor que latejava na minha cabeça.

- Tudo bem. - respondi e suas sobrancelhas se ergueram - Mas você tem de me prometer que deixará Isabela e Lucas em paz, que me deixará em paz de uma vez por todas e então, somente assim eu a entrego para você.

Dimitri parecia que poderia pular de felicidade em meio a estrada vazia. Ele cerrou os punhos e mordeu o lábio inferior tentando conter um sorriso.

- Eu prometo Aurora, diante de todos os deuses, eu te prometo que assim que você me entregar Nicole Beaumont eu esqueço que você um dia existiu, será uma tarefa difícil, mas eu te prometo isso.

- Quanto tempo eu tenho?

- Vou ser um cara legal, te darei... Vamos ver, uma semana? - Dimitri passou a língua nos lábios - É tempo suficiente?

- Duas semanas. - Caminhei de volta para o carro - E não apareça na minha casa até lá, não mande ninguém atrás de mim ou das pessoas próximas a mim, quando chegar a hora levo ela até você.

- Tudo bem querida. - foi a última coisa que ouvi sair de seus lábios antes dele sumir.

Entrei no carro tentando controlar minha respiração e a tremedeira em minhas mãos. Dei partida e virei o volante de volta para a cidade, precisava encontrar Nicole.

Maldição de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora