27 - Família Lancastre

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Nunca tinha tido um contato muito direto com as bruxas do submundo. A única que conheci fora a que me enfraqueceu no bar Alvorada para que os Otrocís de Baltazar tentassem de matar, fora isso nunca antes havia conhecido nenhuma delas, até agora pelo menos.

O recrutamento com a Alcatéia havia sido e ainda estava sendo complicado mas eficaz. Segundo Lucas, Theo estava treinando todos os lobos para lutarem quando a hora chegasse, e o dia da batalha estava de aproximando.

A Facção me venerava. Todos se prontificaram a lutar no segundo em que atravessei seus portões. Romero os havia unido justamente para isso, essa era a função dada a ele por Louis, me preparar um exército para quando chegasse a hora e assim ele o fez.

Enquanto todos treinavam e se preparavam para a guerra eu corria para conseguir mais aliados, uma busca que ia além de procurar os grandes grupos da cidade. Nicole e eu íamos frequentemente até a Evolute na tentativa de convencer nem que fosse apenas um deles a se juntar a nossa causa. Lucas me acompanhava até os acampamentos dos lobos mais distantes para tentar traze-los para o nosso lado enquanto Elena vasculhava os quatro cantos do submundo em busca de aliados de todas as formas e formatos.

Uma garoa fina caia sobre nós quando aquela mulher praticamente se materializou na nossa frente. Ela estava com os braços cruzados para trás e um semblante minucioso em seu rosto. Aquela mulher era Tânia Lancastre, minha última tentativa de conseguir aliados antes da invasão à Aliança que estava cada vez mais perto.

Vampiros e lobisomens eram inimigos antigos, porém as bruxas desprezavam ainda mais a minha espécie. Todos eles nos viam como uma deformidades de natureza, seres criados a milhares de anos de forma não natural, predadores assassinos que não possuíam controle sobre suas vontades e isso poderia vir a ser um problema com Tânia e suas ideias conservadoras.

Tânia parou diante de Elena e eu. Seu vestido púrpura arrastando no chão lamacento e seus cabelos negros soltos sobre os ombros formando uma cortina em volta de seu rosto moreno.

Estávamos em sua casa, um lugar distante e esquecido por muitos. Logo atrás dela podia ver as pequenas casas que se assemelhavam a ocas feitas de barro e palha, uma ao lado da outra.

- Diga o que quer.

- Queremos conversar sobr- Tânia interrompeu Elena estendendo a mão no ar.

- Estou falando com ela. Estou falando com Stella.

Minhas pernas tremeram.

- Eu vim até aqui pois quero sua ajuda para derrotar a Aliança.

Tânia sorriu, deixando a mostra seus dentes brancos.

- Imaginei. - ela se virou de costas e começou a caminhar em direção as casas - Venha comigo. Somente você.

Elena me lançou um olhar de preocupação e segurou em meu ombro.

- Lola...

- Fique. - deslizei minha mão em seu braço - Vou ficar bem.

Segui Tânia enquanto Elena voltava para o carro. Não haviam pessoas por perto mas pude ouvi-las me observando das sombras, sentia seus olhos sobre mim despertando aquela sensação incomoda de estar sendo vigiada.

Tânia caminhou por cerca de cinco minutos até entrar em uma casa no final do terreno murado. Ao lado de sua casa pode notar que havia uma pessoa parada, com olhos curiosos sobre mim, a primeira pessoa que via naquela noite. Uma mulher, de pele morena, cabelos compridos e roupas desgastadas que me observava de cima a baixo com seus olhos castanhos.

- Aurora? - Tânia surgiu na porta e olhou de relance para a jovem parada ao lado de sua casa. - Vá para casa Clara.

Clara me observou mais uma vez e sorriu gentilmente antes de sumir em meio a penumbra que assolava o lugar.

A casa de Tânia possuía um interior oval, com alguns poucos móveis brutos de madeira. Era quente, aconchegante e me despertou uma sensação de proteção, de relaxamento, como se agora tudo fosse ficar perfeitamente bem.

- Sente-se. - ela indicou uma cadeira ao lado da mesa - Gostaria de beber alguma coisa?

- Não, estou bem obrigada.

Ela puxou uma cadeira e se sentou na ponta da mesa com os braços cruzados sobre ela.

- O que faz você acreditar que iremos ajudá-la?

Respirei fundo. Desde o início sabia que ela seria a mais difícil de se convencer, havia treinado um discurso mas agora que estava diante dela todas aquelas palavras sumiram da minha cabeça.

- Vocês são o clã mais antigo do submundo, descendentes da mulher que criou a Irmandade e daquela que liberou minha alma anos atrás. Eu quero, eu espero na verdade poder ter vocês ao meu lado para libertar todos vocês da vida reclusa que a tirania Dimitri lhes impôs.

Tânia se debruçou sobre a mesa, seu rosto estava impassível e sua pose indecifrável.

- O que difere você de Dimitri Aurora? - ela pendeu a cabeça para o lado - Por que devo confiar em você tanto quanto confio nele?

- Serei sincera com você Tânia, eu não faço ideia do que estou fazendo. Toda essa responsabilidade foi jogada no meu colo sem eu ter tempo para me preparar para isso, porém agora que estou aqui, tão perto do acerto de contas, eu só anseio pela liberdade de todos. Eu sei o quanto sofri nas mãos de Dimitri e sei o quando o seu povo sofreu nas mãos dele também é a única coisa que quero é poder ajudar a todos.

"Não sei qual vai ser o resultado final, mas se obtivermos a vitória eu darei a você e todo o seu clã a opção de escolha, Dimitri escravizou vocês e as que conseguiram se libertar vivem escondidas, com medo, eu quero tirar esse medo de vocês porque para mim toda a vida é importante."

"Eu não vim aqui em busca de aliados para se sentar ao meu lado no Conselho, a única coisa que lhe peço é que você lute ao meu lado dessa vez, lute para libertar o seu povo."

Tânia se levantou e caminhou até o final da sala. Ela abriu a gaveta de um pequeno móvel e colocou sobre da mesa um livro de capa grossa e folhas amareladas. Ela o abriu e o folheeou até parar em um página específica, repleta de palavras e gravuras que não entendia.

- Este é o Grimório da minha família. Foi daqui que Dalia pegou o feitiço para liberar sua alma lhe causando a perda de seus poderes e da sua linhagem. - Tânia se agachou ao meu lado - Você faz parte da linhagem dela, o sangue Lancastre corre em suas veias Aurora. Esse aqui é o ritual que deve ser feito para liberar seus poderes e te consolidar como líder da Irmandade, como a nossa protetora e salvadora.

Tânia se levantou e apertou meu ombro, dessa vez a deixou transparecer uma emoção em seus olhos: esperança.

- Esse ritual só pode ser feito por alguém com o sangue Lancastre nas veias e eu irei faze-lo quando você for assumir o seu lugar. Eu vejo em você uma coisa que há muitos e muitos anos não via, nem mesmo em Stella Caine.

- O que?

- Poder Aurora. Um poder incompreendido que você um dia despertará. Você é a nossa única e última esperança.

Maldição de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora