22 - Déjà Vu

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Dezembro de 2005

Campinas

A noite estava fria e agradável. O vento beijava agradavelmente a pele de Aurora. O cheiro doce de flores se misturavam a um outro agridoce que ela não sabia de onde estava vindo, mas que se espalhava por todo o ambiente ao seu redor.

O grito de horror e dor vindo de algum lugar em meio ao mato alto chegou aos seus ouvidos. Ela estava tentando não prestar atenção, porém era impossível não ouvir aquilo. Parado diante dela havia um vampiro trêmulo e magricela de estatura mediana que havia acabado de jurar sua fidelidade à Dimitri e ganhara a função de vigiar a atual prisioneira.

As mãos de Aurora estavam uma posta sobre a outra e pregadas a um tronco de madeira com dois grandes pregos que impediam a cicatrização do ferimento. O cheiro do corpo ao lado estava repugnante. O que um dia havia sido a mulher que ela amava agora era um corpo frio pregado a um tronco semelhante com uma estaca presa no coração.

Aurora não se virava para olhá-la e não conseguia mais chorar sua perda. Já não tinha mais noção de que dia era ou a quanto tempo Laura já não era mais a Laura que ela conhecia. O corte profundo e em carne viva em sua barriga estava começando a cicatrizar, o que significava que Dimitri voltaria a qualquer instante para abri-lo novamente.

Dito e feito. Menos de meio segundo após esse pensamento rondar a mente da fraca Aurora Dimitri surgiu diante dos seus olhos. Em suas mãos havia uma grande faca ensanguentada e em seu rosto um sorriso enorme e sombrio.

- Consegui mais um para a coleção minha querida. - ele se aproximou de Aurora e prendeu a faca na cintura - Demorou, mas ele cedeu eventualmente. Vocês renegados são difíceis de se convencer.

Aurora não retirava seus olhos de uma pequena pedra que havia no chão próximo aos seus pés. Ela estava desgastada, fraca e mal conseguia se manter acordada. Dimitri segurou em seu rosto e o levantou, para que ela pudesse olhar em seus olhos negros.

- Você está um caco amor. - ele aproximou seu rosto e encostou seus lábios no dela, sua língua dançando dentro da boca fria de Aurora - Ah vamos lá! Vamos lá!

Ele sacudiu o corpo mole de Aurora, que não reagiu. Dimitri bufou de ódio, gritou na verdade. Cerrou os punhos e socou o rosto dela, várias vezes seguidas até que sua mão começasse a sangrar. Aurora ofegou e cuspiu uma grande quantidade de sangue no chão gramado.

- Vamos lá Aurora! Vamos meu amor, não aguento te ver assim, sofrendo desse jeito. - ele ergueu novamente seu rosto ensanguentado, seus olhos agora fechados pelo inchaço das pancadas.

Ele esperou por alguma reação com as sobrancelhas erguidas e as mãos apoiadas nos joelhos. Aurora no entanto não reagiu. Ela não conseguia. Tudo o que queria era que Dimitri fosse piedoso e acabasse de uma vez com seu sofrimento. A dor que se espalhava por todo seu corpo era cada vez menor, a incomodava menos a cada soco, pois ela estava aprendendo a controla-la, aprendendo a afastar essa parte de si.

Dimitri bufou novamente. Puxou a faca de sua cintura e cortou o cinto que impedia a calça de Aurora de cair. Ele a puxou para baixo e abriu seu zíper puxando seu membro para fora. O rapaz magricela parado atrás dele fez menção de sair, mas Dimitri o deteve.

- Fique aí mesmo seu filho da puta! - proferiu ele enquanto puxava o restante da roupa de baixo de Aurora - Quero que assista tudo de pertinho, para aprender como esses Renegados de merda devem ser tratados.

Aurora gemeu de dor quando Dimitri entrou dentro dela. Ela já havia perdido a conta de quantas vezes ele a tinha socado, esfaqueado e ate mesmo queimado, mas o estupro era novidade.

O ato em si não demorou, mas para ela havia durado uma eternidade. Quando Dimitri ajeitou com certa delicadeza suas roupas e logo depois puxou para cima sua calça ela sentiu um líquido quente escorrer por suas pernas e seu estômago se rebelou. A ânsia era incontrolável e o vomito possuía um gosto horrível e um cheiro ainda pior.

Dimitri se afastou e franziu o nariz com nojo.

- Vou sair está bem? Tem mais um grupo para captura. - ele se virou para o rapaz - De um pouco de sangue a ela para ver se melhora esse rosto dela. - ele se virou para Aurora novamente - Quero ver seu rostinho novo em folha quando retornar meu amor. Desculpe-me por tudo isso.

Aurora ouviu Dimitri se afastar e entrar em algum veículo que saiu cantando pneu para longe dali. O rapaz continuava parado a sua frente, em choque. Ela capturou outros passos apressados vindo do norte, se aproximando rapidamente. Aurora tentou levantar a cabeça para ver quem era a pessoa porém não teve forças.

Ainda encarando o chão ela viu o olhos frios do rapaz a encarando quando caiu no chão aos seus pés. Ela teve seu rosto erguido por alguém desconhecido que não conseguia identificar. Os pregos em sua mão foram arrancados a força e seu corpo puxado para longe do tronco de madeira e depois velozmente levado para longe do acampamento de Dimitri em meio ao matagal.

Aurora desmaiou no meio do caminho e quando seus olhos se abriram a lua ainda estava alta no céu. Seu corpo foi ajeitado de qualquer maneira dentro de um carro enferrujado e abandonado com cheiro de mofo e fezes de animal em um terreno baldio longe de onde ela estava.

- Ei, ei olha para cima. - Aurora ouviu e captou uma voz feminina da qual nunca havia ouvido, porém não possuía forças em seu corpo nem ao menos para erguer sua cabeça - Tudo bem então. Aqui está, beba.

Algo quente tocou seus lábios e ela sugou gradativamente o sangue que não tinha certeza de onde estava vindo.

- Tem uma mochila no banco da frente com roupas novas e uma passagem para Cuba para amanhã às dez, não perca o horário. - a voz comandou - De lá você pode ir para qualquer lugar que quiser, mas para isso você precisa reagir está bem?

Aurora conseguiu erguer os olhos agora que estava começando a recuperar suas forças graças ao sangue que havia recebido. Ela tentou identificar o rosto da pessoa parada a sua frente, mas não conseguia enxergá-la decentemente.

- Tem mais sangue na mochila também. Só... Só reaja tá bom? Só reaja Aurora.

Nicole saiu do carro e fechou a porta enferrujada deixando cair alguns pedaços de tinta velha em seus sapatos. Como aquela garota estúpida poderia ter uma responsabilidade tão grande?

Ela se afastou lentamente, com os ouvidos presos em todos os sons que vinham do carro, sua vontade era ficar ali e esperar que a garota se recuperasse, porém havia sido instruída especificamente a não ficar tão próxima dela, então partiu, apenas torcendo pelo melhor.

- Obrigada. - a voz rouca de Aurora chegou aos seus ouvidos e ela apressou o passo, deixando para trás aquela pessoa tão importante que ainda não estava pronta para encarar o futuro tão incerto que a aguardava.

Maldição de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora