Destino - Parte 5

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Eu e minha nova grande amiga nos tornamos inseparáveis. Eu era uma outra pessoa; abandonei, junto com os óculos, toda a vergonha de me comunicar. As piadas que sempre recaíram sobre a minha imagem perderam a graça naquele momento; foram sendo substituídas por lembranças esquecidas. Eu era firme, não olhava para baixo ou para cima, era segura. Os corredores se tornaram a minha praia. Eu passava o intervalo cumprimentando todos, parando em poucos grupos que me interessavam, abraçando as novas "melhores amigas" que eu tinha feito. O diretor descobriu meu nome e, por mais de uma vez, fui convidada a participar de reuniões de alunos.

Tempos depois, conversando com a minha melhor amiga sobre romances, beleza e diferenças sociais, comentei sobre o platônico sentimento que nutri pelo tal menino durante o fatídico primeiro grau. Descobri, nesse momento, recebendo a notícia com um frio no estômago, palpitações e uma sensação de fim do mundo, que ele estava lá também e ela era amiga do indivíduo. Um silêncio constrangedor se fez e ela notou, então, que eu ainda cobiçava aquela figura etérea. Para ser bem sincera, eu só percebi isso naquele momento, enquanto falava dele com saliva proeminente, rubor e uma sensação de quentura por todo o corpo. Desejo? Não sei. Talvez um gosto pelo proibido ou pelo impossível, uma necessidade de adrenalina ou de viver dissabores, de escalar o Everest ou de atravessar um oceano a nado. A vida seguiu e eu rezei, rezei com fé e força de vontade, para que ela nunca sequer mencionasse isso para ele. Pedi, não uma, mas inúmeras vezes para ela esquecer a descoberta. Obviamente, em vão.

Em um belo dia de sol, cabelos desgrenhados de quem nem se preocupou em pentear quando saiu atrasada de casa, ela me passou a notícia bombástica que fez meu lado tartaruga se recolher para a segurança do casco. Ignorando todas as minhas súplicas,  ela comentou com ele. Para mim, o simples ato de o bonitinho me cumprimentar doravante já seria motivo de muita comemoração. Após quase três anos sendo veementemente ignorada no outro colégio, eu seria vista por ele, mesmo que de soslaio. Mas ela foi além: marcou um encontro entre nós. Uma reunião romântica com intuito de união, para ser bem clara, e que aconteceria no dia seguinte. Pelo menos devo dar-lhe créditos: ela teve a decência de me dar um dia para pentear o cabelo e uma noite para passar em claro também. Olhei para a sala deles por impulso e, sentado na porta, ele sorriu para mim. Naquele exato instante, ele sabia qual era o nosso assunto. Certa de que teria um ataque do coração, sorri de volta, olhei para o chão e entrei na sala. Apavorada, preciso confessar. A timidez adormecida sorriu diabolicamente, cutucando com o tridente meu cérebro nerd.

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