Capítulo 22: Queima de Arquivo

73 11 4
                                    

30 de Março, 20h13

O tiro havia reverberado mata à fora. A cabeça de Mauro estava caída para a frente, seu corpo inclinado quase caindo da cadeira, o sangue lhe escorrendo pelas roupas. Matias pega a pistola que havia sido arremessada por Rafa.

Que merda foi essa?

Lândyson que estivera gravando o interrogatório tremia compulsivamente, jamais pensara em presenciar algo tão surreal. Tornara-se testemunha de um homicídio, o grupo criminoso que os ameaçava se mostrou bastante perigoso, tinham que sair dali antes que fossem as próximas vítimas.

O grupo se encarava, abismados. Estavam todos boquiabertos. Tremiam, malmente respiravam, todos olhavam fixamente para Rafael.

- Eu não atirei. - jura o rapaz.

Matias vai até a área externa da casa, arma em punho. Dava voltas em torno de si mesmo sob a chuva forte, analisando cada área da mata que os cercava em busca de um possível atirador. Algo parecia correr no meio da mata, mas, os passos estavam distantes, não valeria à pena perseguir o que quer que fosse.

Dentro do casebre em ruínas os três rapazes encaravam o cadáver, não sabiam o que fazer. Uma poça de sangue formara-se sob a cadeira.

Lândyson vai até a janela do recinto, segura o smartphone em modo de filmadora. Os raios ainda iluminavam o céu, a chuva cobria a noite como um manto, Matias estava parado com as mãos na cintura, pensativo.

O tiro havia acertado a parte de trás da cabeça de Mauro e saíra pela testa. O cheiro de sangue dominava o ar, suavam frio, seus estômagos pareciam se contorcer, um gosto metálico surgia-lhes na boca.

Silêncio.

O som de passos entrega a aproximação do investigador, que tinha o olhar vago, porém, sua frustração era evidente.

- Quem quer que seja o atirador já está bem longe.

Rafael se senta na outra cadeira, passa as mãos nos cabelos ainda úmidos e diz:

- Augusto dos Anjos.

- Quem?

Lândyson parecia estar longe, buscava criar um distanciamento daquela cena. Queria esquecer o que havia presenciado, o cheiro de sangue, a morte.

- Psicologia de um vencido. - continua Rafa - É um poema de Augusto dos Anjos que ele recitou antes de ser morto. O que será que ele quis dizer com isso?

Eram tantas perguntas, tão poucas as respostas.

- Depois descobriremos, agora temos que dar um jeito nisso. - objetiva Matias.

- Como assim? - indaga Lândyson - Não deveríamos chamar a polícia? Houve um assassinato aqui.

- E diremos o quê? - retruca o investigador - Que sequestramos esse homem, o interrogamos e atiramos nele? Isso é uma guerra garoto, estamos sozinhos. Temos que sair daqui o mais rápido possível antes que resolvam terminar o trabalho.

- Terminar o trabalho? - Maicon tremia, estava pálido, gaguejava - Você acha que eles vão voltar?

- É improvável, eles poderiam ter nos matado mas, por algum motivo, optaram por nos pulpar...

- Apenas se certificaram de que o capanga não falasse. - completa Rafael.

- Exato! - conclui o policial - Mas, tendo em mente que foi ordenado que vocês não procurassem as autoridades nem buscassem ajuda, temo pelo que possam fazer a minha filha.

Matias começa a chorar, mas enxuga as lágrimas e prossegue com seu discurso:

- Vamos sumir com o corpo desse miserável.

- Espera! - interrompe Lândyson - Vão procurar por ele, temos que limpar a cena do crime.

- Verdade. - admite Matias.

O grupo busca no casebre algo que pudesse ajudar, mas nada encontraram. Tinham que sumir com aquela bagunça e precisavam ser rápidos.

- E agora? - pergunta Maicon.

- Eu não sei.

Matias apoia-se na parede, fecha os olhos, precisava achar uma solução. Lândyson pede a palavra, havia achado a saída:

- Porque não vamos até o carro dele, buscamos algo que possa ser usado para limpar? - sugere - Aproveitamos e arrancamos a placa, pegamos todos os pertences que possam facilitar na identificação do dono do veículo. Podemos pegar a gasolina e ai vai parecer que foi um acidente rotineiro.

Matias concorda, era uma excelente ideia. Boa parte dos rastros seriam encobertos, todavia, ainda restava um detalhe a ser considerado:

- E quanto ao corpo? - questiona - E o sangue, as pegadas, as digitais que estão na casa?

- Queimamos!

Todos se voltam para Rafael que falava enquanto observava a tempestade pela janela, o rapaz segue com a explicação de seu plano:

- Já que vamos pegar a gasolina do carro dele, a usamos para incendiar a casa. - o grupo troca olhares desconfiados - Quanto ao corpo, o levamos para longe daqui e o enterramos.

- Pensando bem, Rafa tem razão. - concorda Maicon.

- Não vamos perder mais tempo, vamos agir. - disse Matias - Rafael e Lândyson, vocês dois devem ir até onde estão os carros e, com cuidado para não serem vistos, devem pegar tudo o que julgarem ser importante, colocar a gasolina num galão que tenho guardado no porta malas e venham para cá.

- Certo. - respondem em uníssono.

- E eu? - interroga Maicon.

- Fica aqui me ajudando a vigiar a casa e a sumir com as provas mais fáceis de serem ocultadas.

Assim foi feito. Enquanto Maicon e Matias iriam se livrando de algumas coisas na cena do assassinato, a dupla foi até a estrada onde estavam os carros. O primeiro passo foi achar o tal galão que o policial guardara no porta malas e o isqueiro posto no porta luvas, em seguida o encheram com a gasolina do tanque da caminhonete de Mauro. O último passo foi revirar o veículo pertencido ao desencarnado, porém, não encontraram muita coisa relevante, apenas a carteira com alguns documentos e o celular.

Enquanto retornavam para a cabana a chuva havia aumentado, tiveram que correr para não chegarem a se perder devido a baixa visibilidade. Quando avistaram o seu destino notaram que Maicon os esperava na entrada. O corpo de Mauro havia sido posto ao lado da porta para facilitar na limpeza do cenário no qual houvera a execução.

- Vocês demoraram. - grita o amigo.

- Vamos acabar logo com isso. - objetiva Lândyson.

A escuridão no recinto era cada vez maior, o flash de seus smartphones era a única iluminação do local.

Matias estava sentado no chão espremendo a camiseta branca, assim que os avistou vestiu-a e se colocou de pé.

- Trouxeram tudo?

- Sim. - responde Lândyson que em seguida o entrega a gasolina.

Matias espalha o combustível pelo cômodo, ascende o isqueiro e o lança no chão dando início ao incêndio.

- Agora vamos sair daqui e arranjar um lugar para enterrar o cadáver. - diz Rafael - E que seja o que Deus quiser.

Devoção Obsessiva Onde histórias criam vida. Descubra agora