Capítulo Bônus: Linhas de Sangue

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Para todos que pediram por mais um pouquinho de C.S.

O vento frio versgatava meu rosto e o sol se punha no que deveria ser o horizonte se os prédios altos da metrópole chamada Nova Iorque não estivessem bloqueando os poucos raios que ousavam ultrapassar por entre as janelas prateadas e pintadas de fogo. Ainda assim, a brisa à minha volta fez com que eu apertasse minhas mãos mais fundo nos bolsos.
A ansiedade era uma sensação... diferente da apatia que me corroeu durante todo esse tempo. Meu coração pulsava desesperadamente. Junto com o dela. Eu sempre a sentia dentro de mim. Não sabia dizer se isso era uma bênção- pois ela ainda estava viva afinal- ou uma maldição- porque não a tinha em meus braços como desejava.
O outono estava bem intenso esse ano. As pessoas não davam sinais de querer sair de suas casas em uma noite tão fria como essa.
Olhei à minha volta, vendo as velhas ruas do Brooklyn. Com suas construções baixas de tijolos vermelhos e lixo espalhado pela calçada. Não era um lugar onde eles deveriam estar.
Não queria admitir isso, mas eu estava meio perdido. Ok... Estava completamente perdido. Como um cego em um tiroteio.
Caminhei mais alguns passos forçando meus neurônios ansiosos a pensar em uma forma de chegar logo onde eu queria. Um som alto de risadas chamou minha atenção para o outro lado da rua.
Havia um grupo de homens negros, grandes e atarracados conversando perto de um beco. Seu porte e suas roupas evidenciavam que não eram bons cidadãos batendo papo em um dia qualquer.
Parei de caminhar e fiquei os encarando. Eram quatro no total.
Eu podia pedir informação à eles.
Atravessei a rua, calmamente, com uma expressão obstinada. Tentei dar o meu melhor ar de gentileza.
Desde aquela noite horrível, não fui eu mesmo de novo. Antes, ficar sem ver pessoas e conversar com alguém parecia uma tortura horrível depois ter uma pequena estadia de quase duas décadas em uma prisão dimensional. Mas agora eu não me importava com mais ninguém.
Que se dane o mundo, pensei, tentando me livrar daquele aperto doloroso em meu peito.
- Aquela vadia mereceu!- ouvi um dos caras com tranças gargalhar, me arrancando de pensamentos depressivos- Eu disse pra ela que ninguém grita comigo.
- Você colocou ela no lugar!- um cara de bandana vermelha falou.
- Pena que esse lugar foi o hospital!- riu outro, com os braços cobertos de tatuagens.
- Podia ter sido pior...- murmurou um cara mais baixo e de cabelos raspados- Ela podia ter ido parar no cemitério!
O grupo irrompeu em novas gargalhadas, que foram morrendo à medida que notaram minha aproximação.
- Ih, qual é branquelo?- disse o de bandana vermelha, quando parei diante daquela imitação ridícula de gangue.
- Oi- falei, sorrindo abertamente- Eu tô meio perdido. Os cavalheiros poderiam me ajudar?
- Tá perdido mesmo- resmungou o baixinho me encarando de cima à abaixo, como se eu fosse uma espécie de verme de Marte- Tá muito longe da tua área, Branca de Neve.
Dei um sorriso de canto.
- Fico muito surpreso que conheça essa história. Minha filha adora. O que impressiona mais é fato de você saber ler. Sabe contar, também?
O baixinho me encarou com ódio e fez menção de puxar algo de debaixo da blusa, mas o da bandana o impediu.
- É a gente sabe, sim- rosnou, me fitando com escárnio- Cinquenta. É o número de bala que eu vou meter na tua cara, se não virar esse seu traseiro branco pra longe da minha área, babaca.
- Qual é o seu nome?- questionei sem me abalar.
- Quem quer saber?
- Eu sou Malachai Parker- falei, fazendo uma careta para o meu nome de batismo- Mas podem me chamar de Kai.
- Sou Bad Blood- seus olhos escuros me encaravam com nojo- E todo mundo sabe que essa é minha área. E branquelo nenhum fica passeando por aqui.
Que nome horrível, pensei com meus botões. Nunca mais reclamo do meu.
Franzi as sobrancelhas em falsa confusão. Girei a cabeça de um lado para o outro da rua.
- Engraçado...- murmurei em tom avaliativo- ... eu não vi nenhuma placa com seu nome aqui. Acho que é melhor eu procurar de novo.
- Tá de onda com a minha cara, seu otário?!- Bad Blood avançou, tirando uma pistola preta e reluzente do cós do jeans baixo.
Ele apontou a arma para o meu rosto.
Continuei no mesmo lugar, tentando segurar uma gargalhada. Era como ver uma criança ameaçando a outra com uma colher.
- Tá rindo do que, otário?- questionou o de tatuagens- Tá achando engraçado?
- Não é só que...- não consegui conter as gargalhadas.
- Jimbo, me dá a sua faca - disse o baixinho, pegando o utensílio com o outro- Vamos ensinar o branquelo aí, a ter mais respeito pelos irmãos.
Eles começaram a me cercar, ansiosos para me furar feito um queijo suíço.
- Que isso, pessoal...?- ergui os braços com um sorriso despreocupado- Eu só queria uma informação. Não vamos transformar isso em uma briga de rua...
- Pensasse nisso antes de vir provocar a nossa gangue- disse o cara com tranças.
Ouvi os clics das pistolas sendo engatilhadas e leve reluzir da faca no sol poente. Se acontecesse qualquer coisa comigo, não haveria ninguém para enterrar o meu corpo. Essa idéia me perturbava mais do que a morte em si.
E quando eles se preparavam para atirar... fiz um leve movimento de mão. Três dos homens desabaram no chão, com as cabeças voltadas em posições assustadoras.
- O quê?!- gritou o Bad- O-O que fez com eles, cara?! Você matou todos eles só mexendo as mãos?!
O homem havia perdido todo aquele ar de machão, olhando horrorizado para os corpos dos comparsas.
Bad Blood ergueu a mão trêmula que empunhava a pistola. Ele apertou o gatinho algumas vezes, mas um clic oco se fez no ar frio do crepúsculo.
- Merda!- berrou- O que você fez com a minha arma?! O que você é?!
Dei um sorriso diabólico.
- Sou um homem que não tem mais nada à perder. E você?
O homem ignorou as pernas trêmulas e soltou a pistola no chão, se virando para correr pela rua vazia.
Deixei que ele chegasse até a esquina, só por diversão.
- Motus- pronunciei e vi seu corpo ser arrastado de volta para mim. Usei a magia para prensá-lo contra a parede do beco, enquanto seus olhos arregalados me fitavam com descrença.
- O que você quer de mim, cara?!- sua voz saía entrecortada e assustada- Eu faço qualquer coisa... Só não me mata, por favor!
Revirei os olhos.
- É o que eu tô tentando te dizer desde o início, imitação do 50 Cent- resmunguei- Quero saber como faço pra chegar nesse lugar...
Tirei o papel do bolso do casaco preto e mostrei o endereço riscado na folha amassada para o meu novo amigo.
- Você matou meus amigos só pra saber como chegar em uma rua?!- ele berrou de novo.
Esses gritos estavam me irritando.
Dei de ombros.
- Como eu disse... não tenho mais nada à perder.
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Convergência Sombria | Bonkai | EM REVISÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora