Burn2

37.

No dia seguinte dei de caras com Anne no hospital. A mulher sorriu-me genuinamente e tentei mostrar o meu melhor sorriso, porém preferia não me ter encontrado com ela. Ainda recordo daquilo que me disse sobre Harry, que não devia desistir dele e que me amava. É difícil engolir em seco todas essas palavras, principalmente após o que presenciei ontem à noite. Não vou mentir, em parte eu queria que Harry tivesse lutado por mim, mesmo apesar de ter dito que a nossa relação estava terminada. Bem, parece que não fui suficiente para que corresse atrás.

Volto à realidade quando Anne me cumprimenta com um abraço caloroso e apertado. Já me tinha completamente esquecido que esta mulher é das pessoas mais afetuosas que tive o prazer de conhecer. Sou capaz de sentir uma certa tensão da minha parte. Os seus braços acabam por deixar de me envolver e afastamo-nos.

"É tão bom ver-te Sky." – fala e sei que o sente de verdade.

"A si também." – sorrio.

"Já te tinha dito que me podias tratar por tu. Quando falas dessa maneira fazes-me sentir mais velha e penso que ainda não tenho rugas suficientes para isso." – Anne brinca e ambas rimos.

Até que já tinha saudades disto, deste sentimento de nostalgia que sinto de momento. É difícil encontrar pessoas tão genuínas quanto Anne e fico feliz por a conhecer, foi das melhores coisas que Harry me proporcionou. Respiro bem fundo, tenho que parar de pensar nele, porém é algo penoso de se fazer quando praticamente tudo à minha volta me recorda dele. Sei demasiado bem que vai ser árduo desprender-me daquela pessoa uma vez mais, mas sempre ouvi dizer que por vezes as coisas mais difíceis são as mais acertadas a serem feitas.

"Como está o Harry?" – Anne coloca a questão óbvia e previsível.

Não sei ao certo o que responder, mas sei que tenho que agir como adulta que sou.

"Está bem." – tento ser o mais concisa possível.

"Pensei que viesse contigo. Quero dizer, sei que ele e Marcel nunca tiveram uma relação ótima como irmãos, mas..." – a frase é deixada em suspenso.

Fecho os olhos por breves segundos e respiro fundo. Não posso mentir para Anne, seria uma falta de respeito da minha parte e além disso ela não é merecedora desse comportamento vindo de mim, não depois da sua amabilidade para comigo. Então, mais vale dizer a verdade de uma vez por todas.

"Nós não estamos mais juntos." – digo-o e sinto as cordas vocais vibrarem a cada sílaba proferida.

A testa de Anne enche-se com pequenas rugas de expressão quando a franze, experienciando a confusão. Honestamente, toda esta situação é tão recente que não é meu desejo falar sobre a mesma. Talvez até seja egoísmo da minha parte, porém gosto de guardar o que é meu para mim, manter a minha vida pessoal em privado, custe o que custar. Só Marcel é que tem conhecimento que eu e o seu irmão já não estamos numa relação. E agora Anne também já tem conhecimento desse mesmo facto.