Eu não conheço o Cris o suficiente para contar a minha historia, mas eu me sinto estranhamente confortável ao seu lado de forma que as palavras saem soltas pela minha boca.
— Ele faleceu a alguns anos. -digo ainda sentindo a familiar dor no peito cada vez que toco no nome do Jonah.
— Sinto muito - responde Cris parecendo realmente culpado por perguntar - eu... eu não sabia, desculpa.
— Não se preocupe, aconteceu faz tempo, e também, eu já aceitei o fato. -minto mais para mim do que para ele.
— E o pai de Jonah, o que aconteceu com ele? - ele diz.
— Olha ele sempre foi um idiota e é isso que ele sempre vai ser. você quer a sobremesa? - mudo de assunto porque não quero relembrar aquele momento - tem sorvete de doce de leite na geladeira.
O bonito homem na minha frente assente, entendendo a brusca mudança de assunto. Eu me levanto para ir buscar o sorvete e no mesmo instante, Cris se levanta não sei se como um ato de cavalheirismo o para me ajudar. Dois minutos depois percebo que ele está retirando a mesa. Eu observo enquanto ele se abaixa para recolher os pratos e sua blusa sobe alguns centímetros revelando um pedaço de uma tatuagem em preto no que parecem ser letras mas eu não consigo descifrar o resto porque ao parecer a tatuagem continua por seu abdome que lamentavelmente está coberto pela blusa. Depois de alguns minutos observando a paisagem percebo que estou com a porta aberta e o sorvete frio queimando minha mão. O Cris me olha meio estranho, acho que ele percebe que eu estava secando descaradamente o seu corpo sarado, mas ele não diz nada.
Comemos o sorvete em um silencio confortável e depois de lavar a louça, cada um vai para o seu quarto.
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Dois dias se passam e já temos uma rotina: acordamos, o Cris sai para correr, eu arrumo a casa, ele volta toma banho, faz algumas coisas no laptop, almoçamos, passamos o dia vendo um filme ou algo (não que eu não tenha oferecido levar ele para conhecer a cidade - em ônibus claro -, ele educadamente recusou a minha oferta), jantamos e vamos dormir. Como combinado, ele fica somente três dias comigo, e quando ele vai embora, eu me sinto estranhamente sozinha na minha enorme casa. Apesar de ter passado algum tempo com ele, eu não sei o que ele faz, onde trabalha, onde mora nem nada disso. Eu não quis perguntar porque eu sinceramente não quero me apegar a ninguém. Pelo menos não agora. Ainda não estou preparada.
Os dias continuam passando e infelizmente, meu descanso também chega a seu fim. Pode parecer cliché, mas eu sinto saudades de Cris. Ter uma companhia era bom.
O alarme no criado-mudo estilo colonial toca exatamente às 6:45 am e eu me levanto ainda com sono, tomo um banho rápido, visto minha saia risca de giz, minha camisa branca, mais conhecido como meu uniforme e desço pra tomar café antes de ir ao ponto de ônibus para ir ao trabalho.
Vinte minutos depois, estou na entrada do grande edifício Sofer, onde trabalho como contadora. Eu só aceitei esse trabalho porque o pagamento era bom e dava pra manter a mim e a minha casa, já que em nenhuma circunstância eu perderia o meu lar de infância para algum banco de meia tigela. E Deus me ajudou, porque meu chefe é um amor de pessoa. Todos estavam dizendo que ele iria se aposentar e que uma pessoa mais jovem entraria em seu lugar. Espero que não seja uma pessoa ruim.
Subo até o décimo andar onde fica o meu escritório, entro na sala e ligo o computador para começar a organizar as planilhas dos gastos e dos pagamentos de cada empregado da empresa. Ao abrir meu e-mail, vejo que temos uma reunião às 11:00 am na sala de reuniões principal.
Faço todos os ajustes que tenho que fazer na planilha e me preparo para a tal reunião. Entro na sala abarrotada de gente e fico em pé em um canto já que não há mais cadeiras disponíveis. Passam uns vinte minutos e a reunião não começa, meus pés já estão doendo e me arrependo de ter colocado este sapato de salto alto. Já estou quase pensando nas alternativas para fugir da reunião que nunca começa sem ninguem perceber, quando o meu chefe o Sr Medeiros entra pela porta com um enorme sorriso estampado no rosto.
— Mil desculpas a todos pela demora, eu sei que vocês preferiam estar indo pro almoço agora, mas eu tenho uma notícia pra vocês e é algo que não pode ser adiado. - diz o sr Medeiros ainda sorrindo.
— Bom a maioria de vocês já deve saber que eu estou me aposentando - ele continua — e depois de deliberar muito, escolhi quem seria o meu sucessor na chefia da empresas Sofer. E hoje eu vou apresentar a vocês o nosso novo CEO. Conheçam o seu chefe o sr Cristopher Swansen.
Depois de exatamente dois segundos, um homem de terno e gravata entra na sala com o rosto serio e profissional e só depois de outros dois segundos é que percebo que é o Cristopher, o meu Cris, o irmão do Joe, a pessoa pela qual senti saudades esses dias.
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Amelia
RomanceA pior dor que uma mãe pode sentir, é a dor da perda de um filho. Amelia sentiu na pele o que era ter que se despedir da pessoa que ela mais amava no mundo todo. Após anos de solidão, ela não esperava era que um engano fosse mudar toda a trajetoria...