narrador: jó
Eu estou esgotado, repleto de emoções que não controlo e que não procuro controlar.
Sinto o sangue de outros a escorrer-me pelas mãos a pingar a relva da casa que não conheço ou acabei de conhecer e nunca esquecerei.
Ainda sinto o corpo deles preso ao meu, as suas almas a agarra-me a puxar-me para a morte.
Ainda sinto as suas palavras de amor, os seus vocábulos santos deslizam e dão me chapadas, lambadas, acusam-me que matei, matei por fúria, por desgosto, sinto-me um criminoso, um cobarde, um ... Sinto-me morto como eles, como se matar alguém nos desse um vislumbre da nossa própria morte, uma certa melancolia.
Já não oiço o coração a palpitar, o oxigénio a entrar e o dióxido de carbono a esvaziar-se pelo vazio.
Arrasto-me até ao carro, vejo a expressão normal de Babilónia como se tivesse acabado de derrubar um peão num jogo de xadrez.
Sei para onde vai, percorre a estrada em alta velocidade, chegamos ao local, ela nem perguntou, tal estava a minha cara chocada, deu-me um pacote de cocaína que suguei, tudo de uma vez só.
Estou na lua, sinto a lua a derreter, o queijo a ficar fundido, sinto um arco-íris a invadir a minha pálpebra, uma explosão de cores, não sinto dores, nem amor, nem arrependimento, sinto-me perfeito, a levitar pela casa de Babilónia.
Vejo a sua expressão séria, vejo-a a arrumar as malas, a gritar para mim, mas ela que se lixe, quero desfrutar este momento.
Bato com a cabeça.
Acordo, vejo-a a acordar-me:
-Jó, temos de ir!
Volto a mim mesmo, com umas pequenas levitações.
Temos de ir onde?Embora, não é seguro aqui, temos de continuar noutro lugar, já tenho passaportes falsos que nos assegurarão uma vida no estrangeiro. Mas para isso temos de fazer mudanças de visual, entendes?
Aceno que sim, mas na realidade não percebo nada, para mim toda esta ideia é uma amálgama que não se encontra localizada dentro de mim.
Sento-me a seu lado, dirijo-me-nos para um salão de cabeleireiro um pouco convidativo a pessoas nada convidativas, uma mulher dirige-se a nós, acho que os três sabemos o que estamos lá a fazer, não comunicamos, sentamos-nos nas cadeiras onde a mulher começa por mim.
Cortou-me o cabelo, retirou-me todos os caracóis, deixando-os a pender no chão. Por fim, sem a minha autorização retira-me todos os cabelos negros e pinta-me o cabelo de um loiro, quase branco, deixando a minha cara numa nova figura por admirar.
Passa depois para a Babilónia, cortando-lhe o cabelo pelos cotovelos,e fazendo-lhe uma franja, pintando-o de seguida de um preto escaldante.
A Babilónia retira do bolso uma nota de 100 deixando a conta paga.
O carro corre levando-nós para um beco sem saída.
Eu vou buscar os passaportes, tomei a liberdade de levantar todo o teu dinheiro, e tive de pagar caro pelas coisas e documentos que arranjei. Neste momento, temos 400 paus.O quê? O que fizeste com tanto dinheiro que eu tinha?Assegurei que o teu futuro não será atrás da prisão, neste momento fomos dados como mortos, e farão um funeral. Eu adoraria ir ao meu próprio funeral e apreciar, tentar perceber qual é a sensação de morte, tentar ver quem iria e quem choraria por mim.
Faz o que quiseres, eu não quero saber, eu estou morto.Ok
Ela sai do carro, desloca-se até uma casa a cair aos pedaços e regressa com dois envelopes, o seu cabelo escarlate desvaneceu-se, deixando uma escuridão.
Fomos de avião, até a outra ponta do planeta, onde também se fala português, chegamos a um país de terceiro mundo, Portugal.
Será aqui que deixarei de ser o Jó e passarei a ser o Messias, a Babilónia por sua vez passou a ser a Fátima.
Sentamo-nos em frente um do outro numa espelunca, falamos durante horas e juramos que nunca mais diríamos os nossos verdadeiros nomes, tentamos decorar as nossas novas identificações.
Então, eu sou o Messias, tenho 19 anos, na realidade 18, sou de origem portuguesa, filho de pais brasileiros. Tudo isto são coisas novas que terei de saber.
O meu novo eu começa aqui e o Jó morreu ali com uma overdose com a primeira dose de cocaína e nasceu um novo homem, Messias, que está pronto para cumprir o desejo de Fátima ( Babilónia), criar riqueza e espezinhar todos aqueles que no passado nos fizeram frente.
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Como o Jó disse a partir de agora os nomes das personagens estão diferentes, assim como o lugar da ação, a história mesmo dita está prestes a começar.
Adão
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O Barulho do Silêncio #oscarliterario #escritoresdeouro
Mystery / ThrillerTudo começa com a morte, após a morte de seu pai, um rapaz entra em depressão, conhecendo uma rapariga ruiva, que o leva por caminhos, nunca navegados. Desde droga, prostituição, até matar, tudo por dinheiro, dinheiro é o que faz movimentar esta his...