Narrador: Messias (Jó)
Eu estava chocado, não sabia o que dizer, quais queres palavras estavam esmagadas contra o meu cérebro. Não sabia o que dizer, o que fazer.
Eu não a conheço, não sei o que poderei esperar dela, talvez nem saiba o seu verdadeiro nome ou a sua verdadeira história, não passa tudo de uma amalgama de mentiras que ela faz questão de sustentar ao ponto de nem mesmo ela saber diferenciar a verdade da mentira.
Procuro um lugar sossegado onde possa pensar, refletir, não posso ficar na sala, onde ela se encontra a limar as unhas com um ar de quem ganhou algo muito importante, como a minha submissão. Arrasto-me até à casa de banho.
Penso que se me matasse agora, ninguém daria pela minha falta, procuro à minha volta uma maneira de despachar o assunto rapidamente, como uma faca, uma garrafa, comprimidos, eletricidade, encontro um corta unhas, numa das gavetas da casa de banho, olho-o, observo-o, dirijo-o aos olhos, vejo a sua lâmina, percorro com o dedo a dita que me faria suspirar. Reflito sobre os danos morais e físicos que um simples corta unhas poderia provocar, imagino as feridas profundas e longas. Penso que um tal médico diria que eu não sobreviria, que não havia nada a fazer, só restava despedir-me.
O ultimo adeus, a ultima palavra, o ultimo som que sairia da minha boca, o espasmo do meu corpo, toda aquela ultima tensão corporal a ser despejada no nada no vazio. mas pergunto-me como o vazio existiria, se o próprio vazio é constituído de partículas, tornando-o cheio. assim percebo que seria mais uma partícula , ou um milhão delas, no meio de tantas outras.
Sinto-me preparado para fazê-lo agora, para acabar com isto. Pego na ultima coragem que me resta e arrasto o corta unhas em direção ao meu olho, pretendo ficar cego, não ver a cara das pessoas preocupadas comigo, apagar um sentido de cada vez, como se tratasse da iluminação de uma casa, onde desligo lâmpada a lâmpada, ou dirijo-me ao quadro geral, onde com um só clique desligo tudo de uma só vez, sem segundas alternativas, nem oportunidade , apagando todos os sentidos de uma vez, ou deixando os restantes prontos, experimento lâmina, cortando uma unha, viro-me para o espelho e digo adeus.
Levanto em câmara lenta o braço, dirigindo a lâmina para um dos primeiros locais escolhidos, sinto a lâmina a aproximar-se a tocar nas minhas pestanas, preparo os dedos, respiro fundo, sinto o coração a fazer a ultima contração.
Imagino o meu funeral, todos aqueles rituais sem importância para o morto, vejo pessoas a fingir sentir-se desoladas com a minha morte, apenas agrupadas só porque sim, vejo a Fátima num café numa esquina a chorar, percebo que a para ela faço falta, que tem necessidade do meu cheiro, do meu perfume, mas também não percebo a sua obsessão pelo dinheiro, pela fortuna.
Volto à ação, pego outra vez no corta unhas, volto a respirar fundo, fecho a mão contendo o corta unhas e atiro-o contra o espelho, deixando uma longa fratura no espelho.
Não grito, não esperneio, coloco àgua na banheira e penso que farei tudo por esta mulher, respiro fundo e mergulho na àgua negra que se alastra sobre o meu corpo nu.
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O Barulho do Silêncio #oscarliterario #escritoresdeouro
Mystery / ThrillerTudo começa com a morte, após a morte de seu pai, um rapaz entra em depressão, conhecendo uma rapariga ruiva, que o leva por caminhos, nunca navegados. Desde droga, prostituição, até matar, tudo por dinheiro, dinheiro é o que faz movimentar esta his...