FROM KATE

Proposta

Valor_ Qualidade atribuída a quem tem talento, prestígio, competência, virtude, mérito ou merecimento intrínseco.Qualidade conferida a quem tem bravura, coragem e valentia. No sentido figurado, valor é a importância dada a quem se tem estima, afeto, apreço e consideração.

O Kevin e eu separámo-nos há dois anos.

A decisão foi minha e não me arrependo.

Cada vez que o olho dói-me o peito ao imaginar o que perdi, o futuro que eu rejeitei. Mas é exatamente aí que me lembro dos meus motivos para o abandonar. Nós não tínhamos futuro.

Eu e o Kevin tentámos ser pais durante mais de cinco anos. Nos primeiros tempos, a dificuldade em engravidar foi encarada como sendo, talvez, um efeito secundário dos anos em que tomei a pílula. Ambos acreditávamos que quando fosse a altura certa, um pequeno embriãozinho seria plantado dentro de mim e não nos importávamos de continuar a tentar. À medida que o tempo foi passando, a pressão dos amigos foi-se tornando insuportável. Todos brincavam com a ideia de que nós não queríamos livrar-nos da nossa vida sexualmente agitada e aquilo que eles não sabiam era que nós só queríamos era um pouco de mais responsabilidade na nossa vida conjunta. Porque... vá lá! Qualquer casal que tenha um bom emprego, estável, com uma vida bastante agradável, tanto de dia como de noite; o seu maior desejo era ter mais. Alargar a nossa família. Procriar. Dar ao mundo outra vida. Passar ao próximo passo. E começava a ser stressante não o conseguir.

Comecei a entrar em paranóia. Literalmente. Tudo o que eu queria era um filho e bastou umas semanas de sexo a toda a hora para o Kevin começar a estranhar. Eu não falava em mais nada. Todos os nossos almoços, jantares, conversas, acabavam comigo e com ele numa fase mais avançada. E não é que ele não aguentasse! Ele nunca me desiludiu, mas a verdade é que o cansaço evidente começou a manifestar-se em si, como o mau humor em mim. Ele tentou acalmar-me. Dizer-me que mais cedo ou mais tarde iriamos conseguir, mas era exatamente essa a minha preocupação. Ser mais tarde. A idade avançava e eu via os anos a passar e imaginava-me a ser mãe com cara de avó. É claro que o meu relógio biológico não mo permitiria, e eu sabia que dentro de dez anos, se tanto, seria demasiado tarde. Não haveria mais chances para nós.

Foi mais ao menos nessa altura que eu percebi que algo se passava. Acho que já há algum tempo sabia que aquilo não era normal, mas também sei que nunca quis aceitar o óbvio. Fiz uns exames. O resultado era o esperado.

Eu não podia engravidar.

Não podia dar ao Kevin a família que ele tanto queria e a culpa disso era minha. Eu era uma mulher com defeito e não servia para aquilo que vim ao mundo. Nunca havia notado nada no meu corpo que me desse sinais de que algo não estava bem, e a verdade é que, se não fosse pelo atraso em chegar uma gravidez, eu jamais teria reparado. E isso era frustrante.

No dia em que o resultado dos exames, finalmente chegaram, eu não corri a contar ao Kevin. Tinha vergonha do meu próprio corpo, de não ser a mulher que ele pensava que eu era. Pelo contrário, escondi tudo de todos e enclausurei-me na minha própria gaiola. Se eu própria não me conseguia aceitar, como é que o homem que eu amava o iria fazer? Foi a pensar nisso que eu tomei a minha decisão. Se o Kevin queria ser pai e eu não podia ser mãe, também não iria ser eu a privá-lo disso. Ele teria de encontrar outra mulher, e eu teria de me contentar a vê-lo ser feliz com outra. Sabia que ele jamais concordaria com a ideia, e portanto, fiz o que me pareceu melhor na altura. Deixei-o.

Não me consegui despedir dele pessoalmente. Deixei-lhe uma carta e fui uns tempos de férias para Paris. Sabia que era cobardia partir assim, fugir dele, mas não conseguia encará-lo naquela altura. Nós estávamos a distanciar-nos à medida que o tempo passava, desde o momento que eu descobri ser infértil que nós não nos tocávamos e ele sabia que algo se passava.