Viagem_ Ação de se deslocar de um lugar para outro, geralmente, percorrendo uma longa distância; jornada: a cidade vizinha está a cinco dias de viagem.
A minha última noite em Haringey foi horrível.
As lágrimas rolavam pelo meu rosto a toda a hora e quando finalmente pararam, os pensamentos reverberavam pela minha mente como milhares de vespas irritadas. As minhas malas estavam o mais próximo possível da porta. Acumuladas num canto, prontas para embarcar comigo. À meia-noite tomei um duche. De qualquer forma, não conseguia dormir e apeteceu-me fazer algo útil. Apliquei uma camada extra de maquilhagem no meu rosto e guardei-a na minha mala. Vesti o vestido que tinha deixado preparado para a minha partida. Era comprido, de um cor-de-laranja claro e com um decote em V. Prendia no pescoço, com um laço e o seu aspeto esvoaçante fazia-me lembrar a praia, o Havai. Encaracolei o meu cabelo, tirando-o do habitual estilo liso e impessoal. O resultado agradou-me bastante. Talvez a partir de agora o frisasse mais vezes.
Nos meus pés, umas sandálias rasas, com detalhes em dourado e preto. O conjunto parecera-me agradável na noite passada, mas agora, comparando-o com o meu estado de espirito, assemelhava-o a uma outra personalidade.
As revelações da minha mãe ainda me ocupavam a mente quando fiquei pronta. Não compreendia como é que ela havia sido capaz de esconder isto durante tanto tempo. Nunca na vida julguei ter um irmão. O meu pai raramente me dirigia a palavra e a minha mãe evitava falar em algo relacionado com o casamento deles. Por mais incrível que pareça, nunca me apercebi de que a minha mãe era violada. Sabia que o meu pai lhe batia, chegou a acontecer à minha frente, mas as memórias que tinha dele nunca me mostraram o seu lado mais obscuro.
O meu pai morreu quando eu tinha perto de quinze anos. Não me lembro bem desse dia. Sei que a minha mãe chorou e eu a abracei durante horas, apesar de não saber o que se passava. Tenho algumas lembranças do funeral dele. Estava pouca gente e a minha mãe e eu eramos as únicas que chorávamos. Mais por alivio do que por lamentar. O finamento dele foi o melhor que nos aconteceu. Nos mais de vinte anos que passei com a minha mãe a seguir á sua morte, ela revelou-se uma mulher completamente diferente.
Quando eles estavam juntos, a minha mãe raramente tinha a pele imaculada. Grandes nódoas negras e por vezes cortes, cobriam a sua face. Nunca lhe cheguei a ver o que ele lhe fazia no resto do corpo, apesar de uma vez ter de desinfetar uma ferida na sua lombar, provocada por uma queda nas escadas. Penso que foi a única vez que ela me pediu ajuda para se tratar, ela aprendera a fazê-lo sozinha.
Nunca senti falta do meu pai. A minha relação com ele era bastante restrita. Não o via durante o dia e à noite ele ia para as tascas embebedar-se.
Com cerca de dez anos comecei a ajudar o centro comunitário da aldeia. Servia sopa aos almoços e desinfetava feridas aos sem-abrigo. Acho que foi nessa altura que comecei a ficar interessada em medicina.
Depois de ler a carta que a minha mãe me deixou, procurei alguma pista nas fotografias. Atrás daquela primeira fotografia, com as quatro pessoas sorridentes, encontrei um nome.
Christian Colm.
Suspeitava ser o meu irmão. Tinha de começar por algum lado.
Apesar de a minha mãe se julgar fraca, eu não concordo. Uma mulher que aguenta ser brutalmente espancada e violada pelo marido durante anos a fio, é mais forte do que qualquer coisa. Tenho pena de a minha mãe nunca ter confiado em mim o suficiente para desabafar da dor que sentia e tenho vergonha por não ter estado mais atenta.
Sei que a única forma de me redimir é cumprir o seu último desejo. Encontrá-lo. Tenho de ir à procura de Christian. Do meu irmão.
O meu voo é às cinco da manhã. Devo estar lá duas horas antes para levantar o meu bilhete. São duas e meia da manhã quando ligo à Rose para me vir buscar. Ela vai levar-me até o aeroporto e esperar comigo até a hora de ir embora. Não avisei mais ninguém das horas a que partia. Não me queria despedir.
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FROM KATE
ChickLitKatherine é o pesadelo de qualquer homem. Corpo definido, cara bonita, divertida, inteligente, independente e incrivelmente teimosa, a mulher loira atrai os olhares da população masculina. No entanto, há cerca de dois anos, desde a sua última re...