Voz

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Semelhança_ Característica do que é semelhante.

No dia seguinte não resisti. Liguei-lhe.

A voz dele estava exatamente como me lembrava. Rouca, baixa e ligeiramente áspera.

-Quem fala? – perguntou pela terceira vez depois de eu não ter respondido.

Agora estava levemente irritada e pareceu-me que respirou fundo.

-Se não me responderem, eu vou desligar!

Pronto, oficialmente irritada.

-Não, não desligues. – pedi mas a minha voz não passava de um sussurro.

-Kate?

Passou de irritada a surpresa em menos de cinco segundos. Recorde!

-Katherine, és tu? Fala comigo! – ele disse mas eu não consegui responder. Ainda estava demasiado alucinada para raciocinar direito. – Foda-se! Estás bem? O que se passa? Porque não respondes? Foda-se, diz alguma coisa!

A sua voz tornou-se preocupada, irritada e sem dúvida, brusca e ofegante.

-Eu estou bem. Está tudo bem. –tranquilizei-o. – Só queria ouvir a tua voz.

-Oh... - ele parecia novamente surpreso. – Estou feliz que tenhas ligado.

-Eu também estou feliz por ter ligado.

A minha voz estava baixa, calma e quase saía num sopro.

-Tens a certeza que está tudo bem? Pareces esquisita!

Agora estava desconfiado.

-Tu queres dizer louca.

Ironia.

-Uhum... como queiras.

Ele riu-se do outro lado da linha.

Fechei os olhos com o som a reverberar-me na mente.

-E então? Como estão as coisas no teu hospital? – ele trouxe-me novamente para a realidade.

-Uhum. Na verdade, podiam estar melhores. Ainda não conseguimos o material ortopédico.

-Quê?

Foda-se! Esqueci-me que ele não estava a par da situação financeira do meu hospital.

-Deixa pra lá! – disse eu e tentei distrai-lo. – E tu como estás? A Eva?

-Ahh... eu e a Eva, meio que demos um tempo.

Arqueio a sobrancelha. A voz dele parece cautelosa.

-Porquê? – pergunto sem conseguir evitar esganiçar.

-Acho que me apercebi que não era com uma amizade boa que se esquecia um amor incrível.

Não respondi. Não consegui arranjar palavras para rebater a sua afirmação.

-Kate? Ainda aí estás? – ele pergunta passado algum tempo sem ninguém falar.

-Sim. Sim. Eu... só fiquei um pouco surpresa. – gaguejo.

-E tu como tens estado?

Não me apercebi da resposta até já a ter dito.

-Conheci um homem.

As palavras faltaram-lhe a ele. Imaginava-o sentado no sofá, ou na cadeira almofadada do consultório e a prender a respiração enquanto esperava que eu dissesse que estava a brincar.

FROM KATEOnde histórias criam vida. Descubra agora