“Querida Ellie,
Não sei se sabe que dia é hoje, mas foi o dia do nosso primeiro encontro. Então cuidei para que a carta chegasse exatamente neste dia. Espero que o café ainda esteja funcionando e que ele ainda sirva aquele famoso cappuccino com chantilly e avelã que você odeia. Eu sei, estou rindo neste momento por me lembrar de sua cara quando eu pedi um desse. Seu repúdio por avelã chega a ser fofo. Você sempre reclamava o quanto aquela castanha lhe causava dores de cabeça.
Eu ainda me lembro do seu preferido. Ele tinha um toque de licor de morango e você parecia uma criança sempre que tomava. Fazia sons engraçados quando o líquido lhe preenchia o paladar. E agora estou rindo feito um idiota.
Querida Ellie, se você estiver acompanhada, ignore este convite. Mas se estiver livre, peço que aceite. Vá até o café e reserve uma mesa para duas pessoas. Peça o seu preferido e o meu também. Eu não irei, pois estarei um pouco longe, quem dirá vivo. Mas você pode tentar tomar do meu, quem sabe lhe agrade.
Prometo que meus pensamentos estarão no café. Prometo que fecharei meus olhos e imaginarei você. Como deve estar depois de todo este tempo. Acredito que ainda continua linda. Ah! Vá com a mesma roupa que esteve. Aquela roupa lhe caíra tão bem que até suspiro ao lembrar.
Não se esqueça do laço em seus cabelos. Não sei se ainda estão na moda, mas não se importe. Você fica linda de qualquer jeito. E claro, passe um marcante batom vermelho. Eu estarei bem aqui. Contemplando-te em meus pensamentos. Caso sinta-se incomodada, feche os olhos, eu estarei bem ali.
De seu eterno apaixonado, Josh”.
Secou o rosto e levantou-se para um banho quente. Sentiria falta das cartas de Josh e prometera a si mesma que reviveria todos os momentos. Que a cada dia viveria como se Josh estivesse ao seu lado. Colocou a roupa que ele havia pedido. Por coincidência, a carta, mesmo depois de tantos anos chegara ao mesmo dia. O dia do primeiro encontro.
Arrumou-se com o ânimo da época de adolescente. Quis ficar impecável, como se Josh pudesse realmente vê-la. Andou pelas ruas, saltitante. Sorriu em alguns momentos quando pensou do quão tímido era seu marido. Olhou para aliança em sua mão e a beijou.A chuva havia ido embora e um lindo arco-íris se fazia presente. Riu. Ou melhor, gargalhou pelo fato de mesmo depois de tanto tempo, e mesmo ausente, Josh ainda era capaz lhe arrancar sorrisos.
Chegou ao café e foi até a atendente.
– Com licença. Eu fiz uma reserva para duas pessoas.
– Claro, mesa 51. – a jovem atendente apontou a mesa.
– Obrigada – agradeceu saindo, mas a balconista lhe interrompeu.
– Ah! Senhora! Pediram para eu lhe entregar esta carta.
– Quem?
– Eu não sei. Faz muito tempo que a carta chegou até aqui. Eu nem trabalhava aqui na época. – ela entregou e Ellie a pegou com o cenho franzido. – A senhora quer fazer os pedidos ou quer esperar a outra pessoa chegar?– O que? – Ellie estava distraída com a carta em suas mãos.
– Quer pedir alguma coisa?
– Um cappuccino de chantilly com avelã e outro com licor de morango, por favor.
Foi até sua mesa com as mãos ainda trêmulas. Cada carta nova era uma surpresa. Respirou fundo e pôs se a ler.
“ Querida Ellie,
Se estiver lendo essa carta, é porque eu estou morto. Meu coração não bate mais, pois já não posso escrever a você. Essa por sua vez foi a única que eu consegui lhe enviar e dessa vez será a última. Infelizmente a primavera chegará e o correio não ira passar pela sua casa, a não ser para deixar as contas pendentes.
Estou morto, porque meus pensamentos me consomem. Porque a ansiedade de te ver por perto é tamanha e o fato de estar atrás de uma grade é assustador, pois não saberei qual será meu destino.
Estou morto porque a notícia que você recebera três anos após minha partida disse que Josh Weiss havia morrido em um combate conta URSS. E pensar em você sofrendo pela minha morte, é como se alguém me desse um tiro. E eu lhe juro, nenhuma dor se equivale àquela de lhe ver sofrer. Se algumas cartas chegarem atrasadas não foi minha culpa. O sistema está cada vez mais rigoroso e a situação cada vez pior.
Ellie, eu estou morto porque o tédio me faz lembrar-se do quanto estamos tão longe. Eu estou morto, porque daqui de dentro eu não sei quando é a primavera e eu só encontro escuridão. Estou morto porque o azul do céu não mais se parece com os seus olhos, ele agora está borrado para mim.
Estou morto porque uma simples peça de teatro traçou todo o meu destino. Porque do mesmo jeito que me levou até você, me tirou de você. Estou morto Ellie, porque não posso mais lhe ver e muito menos te tocar.
Não estou escrevendo isso para lhe fazer chorar, então, por favor, seque essas lágrimas. Eu precisava me explicar e lhe dizer o porquê morri, o porque não lhe enviei mais nenhuma carta. Eu precisava me despedir. Lembra? Eu disse a você que quando eu partisse, eu lhe diria o quanto eu te amo.
Ellie, eu te amo desde o primeiro instante em que pousei meus olhos em você. É um amor bobo, agressivo, intenso e dolorido. Um amor verdadeiro, puro e grandioso. Um amor sem medidas, um amor sem limites. Um amor que me fez sobreviver durante todo esse tempo. Eu continuarei vivo. Eu estarei vivo, não importa se seja com você do meu lado ou te olhando de lá de cima, mas eu estarei vivo, simplesmente pelo fato de te amar incondicionalmente. Eu estarei vivo porque nos encontraremos em cada primavera.
Eu te amo Ellie.
De seu eterno apaixonado, Josh”.
Colocou as mãos sobre a boca contendo um soluço. Com os olhos molhados, leu e releu a carta inúmeras vezes. A garçonete lhe entregou os cappuccinos dispostos de forma correta. Olhou para a cadeira vazia a sua frente e então fechou os olhos. Tentou primeiramente controlar suas emoções. Depois sentir o cheiro intenso do café até que ele se misturasse com o cheiro de Josh. Ele estava parado a sua frente com o seu sorriso de canto preferido. Sorriu e gargalhou em seguida pela sensação parecer tão real. Sentiu seus olhos arderem, apesar de estar rindo. Ainda de olhos fechados, um vento tomou conta de seu rosto balançando algumas mechas de seu cabelo. No mesmo instante sua expressão se fechou. O cheiro estava intenso e sentiu falta dele. Queria abraça-lo e senti-lo em sua pele.
– Abre os olhos Ellie, minha doce Ellie.
– Josh!– disse logo que abriu os olhos.
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Cartas que nunca enviei
Historia CortaCARTAS QUE NUNCA ENVIEI reúne sete escritoras talentosas de diferentes gerações que por meio de contos, mostram que em uma unica carta ou até mesmo várias, podem haver grandes sentimentos sendo eles secretos ou não que expressam toda subejtividade d...