Capítulo 4

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Alemanha – Abril, 1951

Um ano havia se passado e Ellie não recebera mais nenhuma carta. Cada dia lhe dava uma esperança de encontrar mais um envelope perdido. Cuidou de frequentar todos os lugares que deixou de ir à procura de mais uma carta. Mas acabou desistindo logo que as demais estações surgiram na Alemanha. Por mais que soubesse que Josh, depois de todos esses anos, estava morto, ler algumas de suas cartas em fora de época, lhe acalentava. Era uma forma de ela ter a certeza de que Josh morreu ainda a amando. De que ele nunca a esquecera.

Como de costume entrou em seu orquidário e abriu a pequena caixinha de chumbo. As gérberas decoravam todo o ambiente, pois Ellie fizera questão de cuidar para que ficasse assim. De certa forma o tempo passava. Como Josh havia dito, não conte os dias, pois é tortura demais, só lembre que a primavera chegará.

Dessa vez não havia uma única carta, mas três. Eram três para que ela pudesse ler e lhe tomar o tempo tedioso durante doze anos. Limpou os olhos em todas elas e sentiu que deveria olhar a caixa de correio. Era loucura e ela sabia disso. Mas morrer na incerteza é como ter vivido sem ter valido a pena.

E então lá no fundo, quase que inalcançável estava um envelope. Sorriu e seu peito encheu. Suspirou como uma garota apaixonada que recebe o primeiro convite para sair. Correu até o orquidário, e pôs se a ler a quarta carta.

Rússia – 1943

Querida Ellie,

As derrotas estão constantes. Há mortes de milhões de soldados alemães e números assustadores. Com a graça de Deus e com a esperança de lhe ver novamente, eu consegui sobreviver.

Ellie, minha doce Ellie, corta-me o coração pensar em sua solidão. Chega a arder o peito pensar em como você deve estar. Eu poderia morrer para que você estivesse livre, mas a vontade de lhe ver não me permite. Pelo contrário, impulsiona-me a continuar vivo e a lutar com toda a minha devoção por você. Eu sei, pode ser egoísmo de minha parte, mas meu amor é tão imenso que chega a ser possessivo. Entretanto Ellie, eu jamais serei feliz sabendo que choras a noite pensando em mim. Jamais serei feliz se estiver triste.

Sendo assim, por não saber qual será meu destino nesses últimos anos, e por se fazer quatro que estamos separados, peço-lhe que não me espere. Que siga sua vida e que ame outra pessoa. Por mais que me corrói escrever isso, sei que estará protegida. Não sabe como eu me sinto quando a noite fria chega e eu não posso lhe abraçar para lhe aquecer do frio rigoroso da Alemanha.

Viva a sua vida com a única certeza de que meu coração pertence a você. Nenhuma moça em nenhum dos cantos em que eu estive tem a beleza e doçura de vossa pessoa. Vá Ellie, não se prenda, pois a vida é curta demais para esperar por alguém que não tem como saber se voltará ou para sempre permanecerá. No final de tudo isso, nos encontraremos em um universo melhor, sem guerras e sem sofrimento. Não estou dizendo que me entregarei, mas saiba que se seu coração continuar a caminhada, eu não voltarei. Não tomarei o lugar de outro homem. Apenas te olharei e te admirarei de longe.

Peço lhe apenas que mostre essa carta a ele, pois sei que ninguém te amará no mundo, como eu a amo. Sei que ninguém conseguirá entender seus momentos de aflição, ou de reconhecer as suas dores. Só eu decifro seu sorriso e seu humor. Só eu sei o que lhe dá prazer e o que lhe agrada. Então mostre a ele, o quanto você é especial, pois eu juro que se ele lhe maltratar, serei eu para sempre seu pesadelo.

Ellie, essa será minha última carta. Serei para sempre um convencido quando se tratar de você. Sei o quanto me ama, mas sei também que não se pode depender de mim. Eu fui injusto quando eu aceitei entrar em sua vida. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde isso aconteceria, mas eu queria levar comigo o fato de ter conseguido o coração da moça mais bela de todo o mundo. Eu queria poder ter o privilégio de tocar pele tão macia.

Cartas que nunca enviei Onde histórias criam vida. Descubra agora