Capítulo 11 - Guilherme

21.2K 1.8K 404
                                    


O mundo é tão pequeno, afinal.

(O Mundo é Tão Pequeno - Jorge e Mateus)



A primeira coisa que faço ao acordar na manhã seguinte é checar o celular na esperança de encontrar alguma mensagem. Não há nenhuma. Sento na cama e estalo as articulações do pescoço. Demorei para conseguir dormir ontem à noite e, quando menos esperava, recebi uma mensagem de Lara. Me pergunto o que pode ter acontecido entre ela e o namorado depois que fui embora.

Tomo uma ducha para terminar de acordar, me visto e vou para a mesa do café da manhã. Todos já estão lá: Anne, com o mau humor matinal habitual; minha mãe, ainda de roupão; e meu pai, de paletó e gravata, como sempre.

― Bom dia, família. ― Puxo uma cadeira e pego um pãozinho.

― Ainda não está muito bom ― Annelise resmunga. ― Não sei porque preciso acordar cedo se não vou trabalhar, nem nada.

― Annelise, mocinha. Já falamos sobre isso ― minha mãe a repreende. ― É um dos poucos horários no qual podemos ficar todos juntos.

― Eu sei,mãeeee! É que o sono suga todo o meu humor.

Meu pai, que até então apenas sorria enquanto mastigava um pedaço de bolo, me pergunta:

― Então quer dizer que recebemos uma ilustre visita ontem e eu não estava aqui?

― Pois é, Sr. Müller ― brinco com ele. ― Perdeu a oportunidade de conhecê-la. Demorou a chegar ontem, hein.

― O sócio majoritário aqui, ao contrário do que pensam, trabalha, viu. Principalmente quando meus outros sócios não vão trabalhar ― ele diz, rindo, e eu reviro os olhos.

Meu pai sempre foi um homem batalhador. Abriu seu próprio escritório de advocacia que, com o passar dos anos, foi crescendo e ganhando espaço e notoriedade na cidade. Hoje o escritório é um dos mais conceituados do estado e conta com vários sócios minoritários, aí eu me incluo, e também com advogados associados. Seguindo a ordem hierárquica, meu pai, claramente, deveria ter menos trabalho e mais tempo livre, mas ele é um incorrigível viciado em trabalho. E isso quase custou o casamento dele.

Ele saía muito cedo, voltava tarde, trazia trabalho para casa e isso desgastou o casamento. Meus pais estavam à beira de um divórcio quando Annelise sofreu o acidente.

Dizem que existe um propósito em tudo que acontece e, hoje, Anne gosta de pensar que, graças a ela, eles estão juntos. Acredito que ela tem razão, pois os dois se uniram como nunca após o acidente, um sempre apoiando o outro. Quando um deles começava a fraquejar, o outro se mostrava forte. Foi um período difícil e turbulento, mas a tempestade, por mais incrível que pareça, não deixou um rastro de destruição. Ela apenas fez com que os dois construíssem um abrigo mais resistente e seguro.

Meu pai ainda é viciado em trabalho. Não se muda de personalidade como se fosse uma peça de roupa, mas agora ele só fica até mais tarde no escritório quando é algo inadiável e faz questão de não trazer trabalho para casa. Minha família hoje está mais unida do que nunca.

― Nem vem, chefe. Deixei meu trabalho todo em dia. Aposto que nem sentiram minha falta ontem.

― O serviço nunca acaba!

Ele tem razão. Por mais que tudo esteja em dia, basta uma ausência e as coisas começam a se acumular novamente. Mas, se aprendi algo com meus pais, foi não permitir que o trabalho roube todo o meu tempo e a minha vida. Sempre que posso, saio mais cedo ou adianto o serviço e não vou ao escritório. Essa é uma das vantagens de ser sócio.

Dois PassosOnde histórias criam vida. Descubra agora