Eu olhava para meu avô, fascinada, e, para a palavra, como para um mistério que só quem sabia ler decifrava. SOLE, eu aprendia a ler: e logo a neve dos campos no inverno se derretia ao som da minha voz...
Depois vovô Leone me mostrava outro livro e outra palavra: PANE. E eu aprendia a soletrar: P-A-N-E, PA-NE, PANE. E via, enquanto lia, a colheita das espigas e a roda do moinho girando para fazer a farinha, e as mãos das mulheres amassando o pão, e o pão sendo cozido nos fornos de barro e sendo comido quentinho na hora de sair do fogo. PANE, PANE, PANE... E quem dizia que eu sentia mais fome?...
- Agora leia esta, Fortunatella. É uma palavra forte e bela.
- V-I-N-O, VI-NO - soletrava eu. E agora outros eram os campos que via: os vinhedos, com grandes cachos de uvas verdes e rosadas pesando nas parreiras. E, depois, os vagos amassados pelos pés dos camponeses, em grandes tinas, nos armazéns da aldeia onde se fazia o vinho. E depois o líquido vermelho e generoso escorrendo dos tonéis para os copos que despejavam o calor pela garganta fria. VINO, VINO, VINO...
E havia ainda outras palavras, altas e luminosas, que meu avô astrônomo me apontava nos livros: LUNA, STELLA... E eu lia o céu brilhante das noites da Saracena...
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A Menina Que Fez A América
ContoSaracena, Itália, final do século XIX. Pequenas aldeias de camponeses e artesão. Seus sonhos: sótãos repletos de alimento para o próximo inverno. O cotidiano interrompido pelos dias santos e festas populares. Aqui e assim viveu Fortunatella. Morre...