Vinte e sete

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Fiquei meio não, totalmente sem graça com eles. E não via a hora das portas se abrirem e poder sair daquele cubo de tensão. Assim que as portas se abriram fui a primeira a sair. O manobrista estava preparando o carro cinza de Helena para sairmos. Entrei no banco de trás e fechei a porta, logo depois Helena sentou-se ao volante, Emilly ao seu lado e Nicoly ao meu. Helena ligou e saiu do Edifício Dreams.

- O que aconteceu? - Nicoly sussurrou olhando para frente.

- Não está óbvio que eu acabei de dar de cara com minha meia irmã que me odeia sei lá o por quê? - disse rápido e alto demais atraindo os olhos das outras duas pra mim.

- Ok, mas com o gostosão você falou sem problemas. - Emilly cutucou.

- Ele é ex marido dela. - disse me afundando no banco.

- Deixe-me adivinhar, você já pegou o boy! - Helena exclama e coloco as mãos no rosto pra esconder a vergonha.

Ouço a gargalhada geral dentro do carro e me sinto pior ainda. Devem estar me achando uma pervertida.

- De sem graça e estraga prazeres, a pegadora oficial dos boys gostosos da cidade grande. Quem diria em Maya? - Emilly solta uma gargalhada que me contagia, mas sei que se não cortar o assunto elas não vão parar.

- Eu não sabia que ela era a ex dele. E só pra constar, foi ele quem me agarrou dentro do elevador. - justifico e cruzo os braços. Os risos continuam, mas como eu previ o assunto está encerrado.

A conversa mudou de rumo, e meus ânimos se elevaram novamente. Depois de mais ou menos vinte minutos paramos em uma casa de show enorme. Vários canhões de luz dançavam de um lado para o outro emitindo cores vibrantes e havia clara agitação no ambiente. Uma fila gigante se estendia pela calçada, pessoas conversavam e riam, dançavam e gritavam de entusiasmo. A faixada do local era toda de preto fosco com desenhos de labaredas vermelhas e amarelas subiam pelas paredes causando um efeito legal. As letras em dourado davam um charme, HOT, era o nome do recinto. Helena estacionou o carro no estacionamento de uma lanchonete um quarteirão dali, uma vez que o da HOT estava lotado e as ruas transversais também. Descemos e andamos pela calçada no mesmo fluxo que um monte de gente animada. E então comecei a me sentir normal novamente.

Quando chegamos em frente à HOT de novo a fila estava duas vezes maior e me deu um desânimo na hora. Mas Helena foi em direção a entrada onde três segurança, com seus ternos pretos e gravatas vermelhas, iam organizando a entrada das pessoas. Observei as pessoas ao nosso redor nos olhando de cara feia. Helena se aproximou do primeiro homem e eu fiquei besta com a provocação que ela estava fazendo. Ela passava a mão pelo peito do moreno alto e sorria falando bem no seu ouvido. Os olhos dele se arregalaram na última frase secreta dos dois, ela deu uma mordidinha na orelha dele que engoliu em seco e abriu a porta pra entrarmos ao som dos gritos de protestos. Eu realmente me assustei com esse lado de Helena, sei que ela é bem doidinha, mas nunca imaginei que ela entraria aqui através destes meios.

- O que você falou pra ele? - Emilly grita tentando fazer sua voz ser ouvida ao meio das batidas fortes da música eletrônica.

- Que sou amiga da banda que vai tocar qui hoje. - ela responde aproximando o rosto para que Emilly pudesse ouvir.

- Por que mordeu a orelha de um cara que você nunca viu? - Nicoly pergunta assustada.

- Ele é o meu ex namorado.- ela diz e revira os olhos ao acrescentar. - Foi o Ó me livrar dele.

- Sei. E quem é a banda? - pergunto quando nos sentamos em uma mesa preta de mármore, com banquetas vermelhas, próximo ao palco.

- NXZero. - ela responde fazendo sinal para uma menina com um macacão mega apertado que mais parecia um maiô. - Espero que gostem.

- Gosto de algumas músicas deles. - comento quando a menina se aproxima com os cabelos arrumados em um coque perfeitamente alinhado. - Boa noite. Um suco de laranja por favor, um eggxbacon e uma porção de fritas. Vocês têm sorvete de morango? - todas me olharam com um as sombrancelhas arqueadas. - Comendo por dois lembram?

- Sim, temos sorvete de morango. Quer tudo junto? - a menina pergunta sorrindo simpática.

- O sorvete pode ser depois. - respondo sorrindo de igual forma.

Enquanto as outras fazem seus pedidos eu observo a casa de show por dentro. É enorme mesmo. Tipo, muito grande. Caberiam umas cinco mil pessoas confortavelmente, mas a capacidade do ambiente já havia sido esgotada e não parava de entrar gente. O ar condicionado do local já não estava dando vasão a quantidade excessiva de calor. As paredes eram pintadas de preto, e no topo delas vários espelhos, que davam a sensação de que estava muito, muito mais lotada. Confesso que me deu uma fobia ao notar a aglomeração. Mas evitei pensar em possíveis acidentes e foquei na música que agora inundavam os alto falantes num ritmo diferente da anterior, eu conhecia essa música. Cantei várias vezes com as minhas amigas nas noites de meninas, mas só então o sentido da letra de "Set fire to rhe rain " cantada por Adele, foi assimilado por mim . Meus batimentos cardíacos aceleraram ao comparar a letra com Cauê. Pensar nele nesse exato momento foi a pior coisa. Mas infelizmente era assim que seria minha vida, eu sei que sim. E essa música parece refletir exatamente as atitudes que ele tem comigo, as que eu tenho com ele. O calor que nos envolve quando fazemos amor, ou quando discutimos, o frio e solidão que sinto sem ele perto de mim. Como pode um sentimento tão forte assim nascer em tão pouco tempo? Passei cinco anos com Bernar e nunca senti um terço do que sinto por Cauê. Meu estômago estava revirado pelo balde de água fria que meus sentimentos acabaram de jogar em meu ânimo para o show.

As luzes do palco piscaram chamando minha atenção, vermelhas, amarelas, azuis, brancas, verdes dançavam de um lado para o outro criando um efeito lindo na fumaça que começava a cobrir o palco. Mas acho difícil que algo me empolgue de novo.

Viu, quem manda pensar naquele imbecil?

Minha mente grita para mim. Reviro os olhos e viro na direção das minhas amigas que conversam animadamente bebendo seus drinks coloridos. Logo a garçonete chega com uma bandeja com meu pedido. E assim que ela sai, ataco meu eggxbacon e só depois de devorá-lo inteiro é que percebo a boca escancarada das meninas e então Helena solta uma gargalhada, jogo uma batata frita nela, que segura e come.

- É por isso que eu não quero ter filhos. - Emilly zoa gargalhando também. - Pelo menos não agora!

Caímos no riso e elas devoram minhas fritas mesmo ao som do meu protesto. E alguns minutos depois a voz de Di Ferreiro já convoca a galera para cantar um música da minha época de escola. As pessoas pulavam ao ritmo da banda, e eu fiquei no meu lugar. Primeiro que eu estava grávida.

Tudo bem que você era pra estar de repouso e não em um show.

Segundo que a animação não voltou. Nicoly ficou comigo, e as outras duas saíram correndo para o meio das pessoas suadas e agitadas.

É vai ser uma longa noite!

Elo Perfeito #Wattys2017Onde histórias criam vida. Descubra agora