XXII

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Na manhã seguinte, acordei com toques de Kelsey. Não abri os olhos e somente senti-a, sem que ela percebesse que eu havia acordado. Ela circulou minhas sobrancelhas, afastou-me o cabelo do rosto. Depois de um tempo, ela suspirou e começou a se afastar devagar, nesse momento apertei meus braços ao volta dela e a puxei de volta para mim.

— Nem pense em sair daqui. - murmurei.

Ela se encontrou em meu peito e relaxou ali. Após alguns minutos, me virei e beijei sua testa. Quando perguntei se ela havia dormido bem, Kells começou a gaguejar e confirmou. Eu disse que foi a melhor noite de sono de meus muitos anos de vida. Pois era verdade. Ela pigarreou algo e nos preparamos para ir. Começamos nossa caminhada, o tempo todo Kelsey andou em silêncio, perdida em pensamentos.

Eu havia dormido e acordado super feliz, mas algo começou a acontecer entre a gente, o que me deixou desconcertado muitas vezes. Toda vez que eu tentava pegar na mão dela, ou encostar em seu braço ela se afastava, sem dizer nada. Isso aconteceu várias e várias vezes. Quando perguntei a ela o que havia de errado, ela apenas desconversou e mudou de assunto.

Continuei tentando chegar perto dela, mas nada adiantou, de mágoa, meu sentimento começou a se transformar em raiva. Eu até onde sei, não fiz nada a Kelsey. Ela não queria me tocar, nem mesmo me olhar. Estava com repulsa de mim. Não sei o motivo. 

Ao chegarmos a um lado, avistei muitos kappas, e disse a ela que não dava para atravessar nadando, então, ela me indicou colocar um tronco entre os dois lados do rio e usar como ponte. Ponderei e concluí que a ideia era boa. Fui para o lado dela e virei-a delicadamente para pegar a ''gada'', ela começou a ficar nervosa e perguntou o que eu estava fazendo.

— Só estou pegando a gada. - e então acrescentei sarcástico: - Não se preocupe. Isso é tudo que vou fazer.

A peguei e fechei o zíper. Me dirigi para o meio das árvores e descontei minha raiva nela, cortando o tronco ao meio.  Quando ela tombou no chão, Kelsey se aproximou e ofereceu ajuda. Não me virei para responder, disse que não precisava de ajuda, que só temos uma gada. 

E então ela me fez uma pergunta ridícula.

— Ren, por que está com raiva? Tem algo aborrecendo você?

Eu simplesmente não entendo a Kelsey. Tenho que usar todo o meu auto controle e educação para não respondê-la com grosseria. Me virei e me dirigi a ela.

— Não tem nada me aborrecendo, Kelsey. Tudo bem - menti.

Me virei e voltei a arrancar os galhos. Quando terminei, peguei numa extremidade da árvore e a arrastei até a beira do rio. Kelsey correu para pegar a outra extremidade, mas novamente disse para que se afastasse. Não queria que ela se machucasse com os espinhos.

Ela olhou a árvore e quando me virei para olhar o riacho e medir o tamanho, Kelsey pediu para olhar minhas mãos e meu peito. Que agora estavam sangrando.

— Esqueça, Kelsey. Eu vou sarar.

— Mas, Ren...

— Não. Agora se afaste.

Agora sou eu que nao quero que ela me toque. Parece que ela tem repulsa por mim. Ergui o tronco por sobre meu peito e fiz uma careta quando as agulhas se enterraram no peito e ombros, mas ignorei a dor. Ao colocar o tronco no lugar certo, me transformei em tigre para sarar mais rápido e o atravessei e esperei ela atravessar. E com uma decisão na cabeça, resolvi ficar no corpo de tigre a partir dali. Pelo menos assim Kelsey fica perto de mim. Parece que não gosta do lado humano.

Depois de um momento andando, Kelsey quebrou o silêncio.

— Você não precisa se manter como tigre só por minha causa. - falou.

Respirei fundo e continuei olhando pra frente. Controle-se Ren, controle-se. Ela insistiu e pediu para mim não ficar nessa forma, e então antes de ela terminar a frase eu estourei. Me transformei em homem, girei e parei de frente a ela.

— Eu estou com raiva! Por que não deveria ficar na forma de tigre? Você fica mais a vontade com ele do que comigo! - gritei.

Ela me encarou.

— Eu me sinto mais a vontade com ele, mas não porque eu goste mais dele. - argumentou - É complicado discutir essa assunto com você agora.

Ela virou para o outro lado.

Frustrado perguntei.

— Kelsey, por que está me evitando? É porque estou indo rápido demais? Você não está pronta pra pensar em mim dessa maneira, é isso?

Ela disse que não era isso, e sim estava com medo de começar algo que não desse futuro, e disse que não queria discutir esse assunto aqui. Ela olhava para todos os lados, menos para mim. Fiquei a observando. Assenti. Não quer conversar sobre isso, e não posso obrigá-la, vou esquecer... por enquanto. Mas iria querer mais explicações.

Desisti, nesse momento.

— Ótimo. - digo.

— Ótimo?

É. Concordei e peguei a mochila para carregá-la. Continuamos caminhando e atravessar a cidade dos macacos. Seguíamos o caminho de Fanindra, que ia nos guiando pela caminho. Durante o caminho, Kelsey não dirigiu nenhuma palavra à mim, nem mesmo uma troca de olhar. 

Chegamos a extremidade do tanque e li a descrição que estava escrita ''Escolha o macaco''. Kelsey me perguntou como eu sabia tanto sobre macacos, e eu estourei novamente.

— Ah, então macacos são um tema de conversar aceitável? Talvez, se eu fosse um macaco e não um tigre, você me desse uma pista do motivo por que esta me evitando.

Ela disse que não estava me evitando e que não tinha haver com minha espécie e sim outras coisas. Se aquilo não é evitar, eu não sei o que é. Ela gritou comigo para voltarmos ao tema dos macacos e gritei de volta para ela. E assim ficamos nos fuzilando, um ao outro, por muito tempo. Até nos acalmarmos e voltar ao assunto do momento.

Depois de um momento analisando as estátuas e depois de muita discussão da escolha do macaco certo, Kelsey escolheu o Babuíno. Ela então colocou sua mão sobre uma marca que apareceu na estátua e um tremor começou no lugar. A estátua se moveu, e começou a nascer uma árvore no lugar. Quando ela já estava no tamanho normal de uma árvore, nos aproximamos. Peguei uma folha e cheirei, e percebi que era uma mangueira. Comentei isso com Kelsey. Peguei uma flor branca e fui em direção de Kells para colocá-la em sua orelha, mas ela se afastou sem nem mesmo me olhar. Com raiva deixei a flor cair no chão e a vi perder todas as pétalas.

Depois de alguns segundos avistei uma fruta brilhando no alto da árvore. Era uma manga, a mostrei para Kelsey e lhe expliquei sobre o fruto ser a manga, fazia sentido. A manga era os produtos mais exportados e conhecidos da Índia. Mas só havia um jeito de pega-la. Sugeri a Kelsey para ela subir em meus ombros, enquanto eu a guiava para pegar o fruto. No começo ela retrucou, mas logo aceitou.

A coloquei em meus ombros, delicadamente ela ficou de pé sobre eles bem perto do fruto, e o arrancou. Mas nesse momento, senti suas pernas e pés gelarem. Ela ficou paralisada do lugar olhando fixamente para frente, com o fruto na mão. Seu medalhão brilhava incandescente. A chamei várias vezes, mais ela não respondia e nem me olhava. Depois de um tempo, senti seu corpo ficar leve e balançar, quando percebi Kelsey estava caindo desmaiada. Rapidamente a peguei nos braços, antes de atingir o chão. Ela estava totalmente apagada.

A maldição do tigre - Versão Ren // KishanOnde histórias criam vida. Descubra agora