Ao observar o salão adornado, os brindes à boa saúde do novo rei, abraços e brincadeiras entre amigos, Anna quase se esquecia que viviam uma guerra não muito longe da costa esquecida de Pendiham. Não esquecia, porém, que aquela era a primeira vez que ela não tivera parte na organização e também não teria nenhuma tarefa quando os nobres saíssem e os criados tivessem que limpar o salão.
A verdade era que Anna jamais esperara que algo assim pudesse acontecer a ela e, ainda naquele momento, ainda depois do "sim", tudo parecia um sonho muito difícil de se acreditar. A menina que nunca pensou que poderia se casar - e John, justo John, sabia bem o motivo - estava ali: rodeada por toda a nobreza. Servida por aqueles com quem já dividira aposentos. Sabendo que a mãe e o pai, pessoas simples, seriam erguidos a uma posição social de maior prestígio, afinal, a Rainha não poderia ter como pais um jardineiro e uma cozinheira do castelo.
Não... não é que estivesse triste, chateada. Apenas incrédula que nem um mês antes a própria rainha lhe tivesse pedido a mão em nome do filho, que voltava da guerra para assumir o trono do pai que falecera após anos de uma doença debilitante. John, o menino que crescera com ela. O mesmo John que a salvou na adolescência quando bárbaros invadiram e saquearam o castelo.
Quando esse último pensamento passou por sua memória, Anna tremeu. Sentou no primeiro local vago que encontrou no salão, tentando situar-se no presente - tão difícil de acreditar - e sem notar que John a observava .
O novo rei, que a tomara como rainha, via nas feições da esposa como ela estava cansada. Não conseguia imaginar o tipo de mudança que ocorria na vida dela. Sabia que não. Mas sabia que a moça estava esgotada pela agitação dos últimos dias. A vida da menina que durante toda a vida servira aos seus soberanos com toda a dedicação que uma criada filha e neta de criados poderia ter, mudara completamente no momento em que o Príncipe John escrevera para casa pedindo que sua mãe não convocasse princesas ou nobres de outro reino e pedisse a mão de uma criada enquanto ele não podia estar presente para fazê-lo; Agora a criada era soberana. Sentava-se no trono e teria sua própria criadagem. O jovem rei mal imaginava o quanto aquilo assustava sua esposa. Gentil como a mãe, ele pediu licença para se afastar do grupo com quem conversava e ajoelhou-se diante dela.
— Não se senta mais aqui entre o povo, majestade... É ali o seu lugar – disse, sorrindo e sinalizando o trono com um gesto breve.
O sorriso da moça refletiu o do marido. Pensou em dizer que, de uma forma ou de outra, ela sempre pertenceria ao povo, mas limitou-se a sorrir e responder quase em um sussurro:
— Estou esgotada...
Apertando um pouco a mão dela, John perguntou em uma voz suave:
— Isso eu posso ver em seus olhos... prefere ir descansar?Ela balançou a cabeça e fez um gesto, como se pudesse afastar aquele pensamento com a mão.
— De maneira alguma. Posso aguentar até o fim das festividades. – ela tocou o rosto dele rapidamente, como se o acariciasse e sorriu. - Não queremos parecer arrogantes, não é? As pessoas precisam de um pouco de diversão, John. É nossa tarefa, não é?
Orgulhoso de como ela parecia a mulher perfeita para a função que agora estava fadada a ocupar, ele afirmou.
— Uma dentre tantas -. Erguendo-se, ofereceu a mão a ela - Então minha rainha me acompanha a uma volta pelo salão? Quero que cada convidado me veja acompanhado da mulher mais linda do mundo.
Anna não pôde esconder o rosto rubro. Segurou a mão do marido para se levantar e, depois, apoiou-se em seu braço. Estava cansada, sim. Mas sabia que o que o marido pedia, era o que o momento exigia.
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Antes da Eternidade
Vampire[Concluída] Anna poderia ser personagem de um conto de fadas: a criada do castelo que se casou com o príncipe herdeiro, logo coroado rei. Mas por que continuar com ele se o meio-irmão, apesar de petulante e aparentemente doente a maior parte do temp...