III - Chiaroscuro

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    John havia deixado Pendiham logo após o casamento. Regressou brevemente e novamente foi cumprir sua obrigação como líder de um povo pela segunda vez. Nesta altura,  Anna stava no quinto mês de gestação e sem o marido por três meses inteiros.

    As notícias do campo de batalha eram poucas, escassas. A moça vivia com o medo constante de perder o novo marido sempre que as cartas demoravam um pouco mais que o habitual para chegar.

    Neste intervalo de tempo parecia que  a vida no castelo, antes tão fadada à rotina, havia se rendido a horrores semelhantes àqueles que os soldados tinham que enfrentar. O primeiro regresso de John não fora ao acaso ou por conta de uma súbita saudade da mulher que amava. O pai de Anna, a quem ela procurara ávida e esperançosamente no salão  no dia de seu casamento havia perecido e ele sabia que a moça, grávida do primeiro filho, precisaria de apoio.  Uma sucessão de mortes, principalmente entre habitantes mais velhos de Pendiham começaram a ocorrer. Poucas semanas depois da partida do filho, a rainha mãe também se adoentou, mas ao contrário do pai de Anna, começava a se recuperar depois de dias e dias acamada. A atual rainha, que por muito tempo acompanhara a sogra como sua criada, praticamente retomou a antiga função e permaneceu em sua companhia, fazendo tudo para ajudá-la no que precisasse.

    Naquela noite a lua nova pairava sobre o mar especialmente calmo de Pendiham. A rainha Eliza pediu para que Anna a procurasse assim que pudesse. Não que aquilo fosse necessário. Anna a visitava várias vezes ao dia, mas Eliza sabia que isso a apressaria na visita noturna.

   Preocupada com o que a rainha mãe poderia precisar, Anna foi ao encontro da sogra assim que recebeu seu recado.

    A Senhora tentava se mostrar bem disposta, porém seu rosto ainda estava pálido e os olhos não tinham brilho algum. Sentava-se, como de costume, com a postura de uma rainha em uma poltrona alta no canto do quarto e sorriu simpática ao ver a moça se apresentar.

— Fiquei aflita com seu chamado, Eliza... - disse, enquanto fechava a porta atrás de si —Aconteceu alguma coisa? Não está se sentindo bem?

— Não, Anna. Não aconteceu nada que a deva preocupar. Já estou quase bem – Sorriu e, embora seu sorriso ainda conservasse um pouco do cansaço, parecia mais real do que aqueles que ela tentava exibir apenas para despreocupar aqueles que tomavam conta dela –. Não foi para aborrecê-la com uma vida que já está em tempo de terminar que a chamei aqui, mas para falar da criança que floresce em seu ventre... da vida que está por vir.

    Anna pensou em censurá-la quando disse que sua vida estava no fim, mas assim que ela citou a criança que estava para nascer, a menina pousou a mão no ventre e deu um meio-sorriso.

    Eliza então continuou:

— Deve saber que para um rei o maior orgulho é ter um filho homem e... - Parou, fitando Anna seriamente – Não vai se sentar, filhinha? – Anna puxou a cadeira da penteadeira, ainda muda, e sentou-se de frente para a sogra, que continuou – Eu dizia que para meu John, como para qualquer soberano, o maior orgulho é ter um herdeiro homem para seu nome, seus bens e seus feitos. E como está grávida, acho que é a melhor hora pra falar sobre isto.

Isto? - repetindo a última palavra, ela esperava encorajar Eliza a continuar a falar.

— Anna, não se frustre caso não seja um menino. Ou, que Deus nos livre, perca esta criança. Você é jovem, muito jovem, e ainda poderá dar muitos filhos ao John.

    Ao pensar apenas na hipótese de não poder segurar seu filho com vida nos braços, os olhos de Anna transbordaram lágrimas e ela preferiu não falar mais uma vez, enquanto a senhora mais velha, que parecia alheia ao seu sofrimento, continuou:

Antes da EternidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora