CAPÍTULO DEZ - O irmão.

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Fernando engoliu em seco quando ouviu da boca de Laura aquela história de que ela achara Marcelo enterrado vivo na mata. A mãe dele, que acompanhava tudo ali, ficou desesperada e queria correr até a casa dos patrões para contar:

- Calma, mãe. Calma! Eu vou até lá e... Eu dou um jeito. Mas não faça nada.

- Tentaram matar o menino Marcelo, que horror! Tudo bem, meu filho, vá até lá e o traga para casa.

Fernando pegou seu cavalo e o puxou pelo caminho, acompanhando Laura e Thirza, pensando em como sua vida poderia acabar com aquilo, totalmente arrependido pelo que fez, mas, ainda assim, tentando encontrar uma maneira de reverter aquilo tudo.
Thirza foi durante todo o caminho sentindo fortes arrepios que, ela tinha certeza, queriam lhe dizer algo. Tudo ficou mais claro quando ela observou o que acontecia ao olhar para Fernando: Os arrepios aumentavam. Testou tomar distância e ficava normal. Mas resolveu não falar nada para Laura.

Os três chegaram e encontraram Marcelo sem emitir os gemidos de antes, dormia e ressonava alto. Fernando se aproximou da velha cama de ferro onde o rapaz estava e realmente não sabia o que fazer a partir dali:

- Acho que você deve levá-lo para casa. - Disse Izabel.

- É. - Respondeu Fernando, meio distraído - Vou fazer isso.

- Mas acho que não dá para levá-lo a cavalo no estado em que ele está. - Disse Laura. - Você deveria ter pego a caminhonete ou deixar que ele durma aqui até pela manhã.

Fernando  cobriu o rosto com as mãos em sinal de desespero e puxou Laura até lá fora onde pudessem conversar a sós:

- Eu não estou aguentando mais.

- Eu sei que é difícil vê-lo assim, Fernando, sei que, apesar de ele não merecer e ser um bosta, ele é como um irmão pra você.

- Eu quero fugir. Quero ir embora desse lugar, levar minha mãe e você.

- Como assim?

- O Marcelo precisa ir para o hospital. A gente vai levar ele até lá, eu vou em casa pegar minhas coisas, você pega as suas e nós vamos. 

- Por que isso agora?

- Você me ama?

- Claro que eu te amo, Fernando, mas antes de fazer isso preciso saber o que está acontecendo e... - O rapaz a interrompe com um beijo.

Laura sentia que o namorado escondia algo, conhecia ele o bastante para saber quando tinha algo de errado. Prometeu que iria com ele para onde quer que fosse, até porque ela acreditava que o espírito de Bianca já descansava em paz e não voltaria mais a perturbá-la. 

Fernando montou no cavalo e voltou à fazenda para pegar a caminhonete.

O céu já ficava claro, estava para amanhecer. E à espera do namorado, Laura contou para Thirza e Izabel que iria embora.

- Não, você não pode! - Alertou Izabel.

- Por que não?

- Você não pode deixar Santa Liberdade até que tudo se ajeite.

- E não é só isso. - Thirza interveio. - Eu preciso entender o que significam os arrepios que sinto cada vez que olho fixamente para o Fernando.

- Espera, você está dizendo que há algo de errado com o meu namorado, é isso? Me desculpa, Thirza, mas dessa vez não vou levar em consideração o que você me diz. O Fernando é a pessoa mais pura do mundo.

- Não sou eu quem está dizendo e nem digo que Fernando é uma pessoa ruim. Mas eu preciso descobrir. Eu vou enxergar através dele assim como fiz com você.

X

Fernando entrou em casa correndo para falar com sua mãe, tentando convencê-la de que ela teria que ir embora com ele de qualquer maneira:

- Filho, nossa vida é aqui e ainda mais agora depois do que aconteceu com o Marcelo. Aliás, onde ele está? Ele está bem?

- Mãe, me escuta. - E vieram flashs da briga em sua cabeça. - Fui eu mãe! Preciso fugir porque eu bati no Marcelo e quase o matei.

A mãe dele pareceu ficar tonta com aquela notícia e pediu que Fernando não brincasse com aquilo:

- Eu não estou mentindo, mãe. 

- O Marcelo te considera um irmão, como você foi capaz de fazer isso?

- O Marcelo não me considera irmão coisa nenhuma, ele não presta! Ele sempre humilhou a mim e a você!

- Ele é só um garoto.

- Garoto, mãe? Ele é um garoto enquanto eu tenho que ser um homem com minhas responsabilidades e tarefas infindáveis aqui nessa droga de fazenda!

- Vai embora, filho.

- O quê?

- Você fez algo muito errado, mas não estou preparada para ver você sofrendo as consequências disso.

- Mas eu não posso deixar a senhora aqui.

- Você precisa ir, eu estou mandando!

Depois de muito chorar no colo da mãe e ver que aquilo era o melhor a ser feito, Fernando pegou a mala, colocou algumas roupas dentro e já estava de saída, abraçando a mãe com tanta força, jurou voltar para buscá-la, mas ao quando abriu a porta de casa, se deparou com os cavalos da fazenda todos espalhados e correndo de um lado para o outro, outros se retorciam no chão como se sentissem fortes dores:

- Mãe, olha só isso.

- Mas o que está acontecendo com eles?

Eles viram um peão se aproximar às pressas, Fernando pôs a mala para dentro e esperou que ele chegasse:

- Vocês não vão acreditar no que eu vi.- O peão disse, ofegante. - Vocês têm que vir comigo até o curral, aconteceu uma desgraça.

Os três correram até o curral e ao chegaram lá, Fernando e sua mãe ficaram chocados ao verem todos os bois e vacas estendidos no chão, estavam todos mortos.

X

Izabel preparou outro remédio para passar em Marcelo, enquanto Laura ficava andando de um lado para o outro da casa preocupada com a demora de Fernando.

- Já deve ter feito mais de duas horas que ele saiu daqui, aconteceu alguma coisa.

- Calma, menina, vai ficar tudo bem.

Thirza estava sozinha num canto em posse do velho caderno da mãe onde se reunia toda a sabedoria milenar de sua família , descobria ali receitas para os mais diversos fins:

- Aqui! Achei! - Gritou ela, apontando para uma página.

Laura se aproximou, tentando decifrar o que estava escrito em letras tão miúdas:

-  Não vi você pegando o caderno, Thirza.

-São conhecimentos passados de mãe pra filha, não são? Então um dia eu terei que saber, mãe. Pois bem, eu já quero saber mais, preciso controlar essa sensibilidade que sinto. Preciso saber agir em determinada situação. Aliás, por que a senhora fica com essas compressas de folhas na testa dele, sendo que eu acabo de encontrar uma feitiçaria aqui para tirá-lo desse estado em questão de minutos? 

Ela precisa voltarOnde histórias criam vida. Descubra agora