28. Levada - II

813 132 202
                                    


Li Ka Hua

Para minha sorte, papai não conseguiu falar com minha avó. Não tenho certeza se ela o estava evitando ou realmente os horários em que ele telefonava não compatibilizavam com a estada dela em casa. Por vezes ele ameaçou viajar até a China, mas consegui dissuadi-lo da ideia, era impensável imaginá-lo longe de mim daquela forma com tudo aquilo acontecendo. Havia dois dias que voltáramos de viagem, mas eu estava tão exausta mentalmente que pareciam anos, as coisas na escola não estavam melhores, mesmo os alunos da classe 1 que antes me ignoravam completamente passaram a me tratar como uma pária, contudo eu suportava tudo aquilo, enquanto ele estivesse bem, nada daquilo era forte o bastante para me afetar.

Comecei a chegar mais cedo na escola, saía com a minha mãe no horário de suas aulas na universidade (que normalmente eram na parte da manhã) assim ela me deixava no instituto pelo menos meia hora mais cedo, isso me dava tempo de refletir sobre as coisas na escola, na minha vida. Como tudo havia saído dos eixos daquela forma? Os encontros com Aidan se resumiam à sala de aula e queria saber por que ele ainda insistia em permanecer ali ao invés de voltar para sua sala anterior. O novo professor de literatura era um sujeito inteligente, mas daqueles que não está interessado em laços estreitos com os alunos, ele quer mediar conhecimentos e sua função se resume a isso, de modo que não estava muito ansiosa para os seus três tempos àquela manhã, decidi então passar um momento de solidão no terraço.

Conforme avançava pelo hall e os corredores os olhares de ódio na minha direção eram tão pesados que me sentia sufocada pela energia negativa. Apressei os passos, subindo as escadas, na tentativa de ver-me livre daquela aura de rejeição. O vento frio me recebeu fazendo meu corpo estremecer mesmo dentro da pesada gabardina que vestia, as lágrimas ameaçavam cair, mas me esforcei por reprimi-las, estava mais frágil do que realmente era nos últimos dias. Não demorou mais que cinco minutos até Aidan aparecer ofegante no meu campo de visão, aquele estava sendo um dia longo e mal havia começado. Quando cheguei à escola o vira rapidamente no hall de entrada, mas ele não fez qualquer menção de falar comigo, entendera o recado. No final não sei por que esperava que fosse de outro jeito, não podia culpa-lo por estar com medo demais de mim para se aproximar, por isso era chocante o fato de ele ter corrido nove lances de escada até ali.

— O que... — Tentei falar quando finalmente achei minha voz, mas ele me interrompeu se aproximando e pegando meu pulso.

— Agora não, você precisa sair daqui, depois eu explico.

A voz dele saia falhada por conta do esforço, eu estava tão perplexa com aquele comportamento que me permiti ser guiada por ele, mas um grupo de alunos acabou impedindo nossa passagem. Percebi que a irmã de Janet Morgan, Jenny, e Savannah Breaks estavam a frente dos demais não precisava ser muito inteligente para ligar os pontos com todos os olhares de ódio direcionados a mim no hall de entrada. Será que Aidan fazia parte daquilo e se arrependera no último minuto? Ele recuou um passo me pondo atrás dele, se não estivesse tão perturbada com tudo aquilo teria rido da situação, ele estava tentando me proteger? Eu, que mandara cinco homens para o hospital não fazia muito tempo?

— Jenny...

— Imaginei que você estaria aqui. — Cortou ela em tom frio, a expressão cheia de fúria e desprezo. — Você estava ao lado dela quando Alissa morreu, quando Jan foi expulsa, você não passa de um traidor, Aidan!

— Ela não fez nada! — A voz de Aidan era tão sem força que nem mesmo ele acreditava no que dizia ou estava fazendo um esforço sobre-humano para acreditar. — Ela nem mesmo estava aqui quando o senhor Sojiru se foi! Use a razão, Jenny! Desse jeito só vai piorar as coisas para você e Janet.

Olhos Vazios ✔ [DISPONÍVEL ATÉ 30/11]Onde histórias criam vida. Descubra agora