5. O Guardião da Borboleta

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Aidan

— Já disse isso um milhão de vezes, ela é da minha turma, só isso. Sou o representante e, dessa forma, de algum modo, responsável por ela. — Expliquei novamente na esperança que ela compreendesse, mas sentindo que aquela mentira mal funcionava para mim mesmo.

— Ah, é mesmo só isso, Aidan? — A voz dela era irônica. — É nisso que você quer acreditar ou que você quer que eu acredite?

Lágrimas começavam a se formar nos olhos dela, senti-me cruelmente responsável e fiz a única coisa que sabia ser capaz de acalmar o coração dela, puxei-a pelo pulso e a beijei quase desesperadamente. Eu não conhecia Li Ka Hua, tudo que sabia sobre ela fora lido em páginas de internet, era impossível que eu sentisse algo além de curiosidade a respeito dela. Em contrapartida, Janet e eu namorávamos há 5 anos, nos conhecíamos desde sempre, sabíamos das manias aos defeitos um do outro. Fosse o que fosse que me puxava para Li Ka Hua não era nada além de uma curiosidade acirrada.

— Não há nada acontecendo. — Garanti, ofegante, quando me separei dela. — Eu não a vejo dessa forma, tá?

Ela assentiu dando um sorriso enquanto lágrimas escorriam pelo seu rosto. Acariciei seu rosto enxugando-as e a puxei delicadamente para o jardim da escola, ficava perto dos dormitórios, bancos dispersos no meio de flores silvestres de todas as espécies. Quando percebi que ela estava mais calma tomei suas mãos entre as minhas e decidi ser sincero, pelo menos parcialmente.

— Eu não podia contar isso para ninguém, mas vendo como as coisas estão andando, acho melhor que você fique sabendo...

— Do que está falando? — Ela ergueu o olhar para mim, confusa.

— O senhor Sojiru conversou comigo antes de Li Ka Hua vir para cá...

Faltava uma semana para a transferência da aluna nova e toda a escola já estava especulando que tipo de garota era ela. Todo mundo já sabia que era neta de uma das fundadoras da escola, de origem chinesa e, sobretudo, envolvida em um assassinato no Japão onde morou por mais de dois anos com o pai, que era dono da maior rede de hotéis cinco estrelas da China, com filiais espalhadas em toda Ásia e boa parte da Europa. Tivemos aulas suspensas durante toda semana para reuniões e mais reuniões com os professores, soube por uma conversa entre as secretárias que a avó da novata havia feito uma videoconferência com a diretora a fim de garantir o melhor tratamento para a neta.

Algumas pessoas achavam que ela tinha problemas mentais ou algum tipo de deficiência, o assunto do momento era como seria a aparência da aluna nova e o quanto ela estaria disposta a contar sobre o assassinato que testemunhou. Alguns, inclusive, já discutiam como poderiam tirar proveito dela, uma vez que era dentre nós uma das mais ricas. Entretanto, eu estava atento o bastante para perceber certo clima de tensão entre os professores, em especial o senhor Sojiru, tutor responsável pela minha turma, ele anunciou na sexta feira que a aluna transferida seria parte da nossa turma — mesmo que seu nível devesse estar na classe 1-1 — e que contava com o nosso melhor comportamento.

No fim da aula, antes que eu saísse para minha próxima sala, ele me pediu que fosse vê-lo em sua sala na hora livre, pois precisava conversar comigo. Comecei logo a buscar mentalmente alguma baixa no meu desempenho acadêmico ou a última regra que eu decidira quebrar, mas nada me vinha em mente de modo que mal consegui me concentrar na aula de estudos humanos. Quando o sinal do tempo livre soou precisei me esforçar para não ir correndo até a sala dele, incapaz de conter a minha preocupação. Bati duas vezes e sua voz abafada mandou que entrasse.

Olhos Vazios ✔ [DISPONÍVEL ATÉ 30/11]Onde histórias criam vida. Descubra agora