14. Danna

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Estávamos sentados no sofá. Minha mente estava longe, mas na verdade não tão longe assim. Estava revivendo a noite passada. Cada toque, cada beijo, cada gemido, cada olhar... E então as palavras que ferraram com tudo. É, às vezes, palavras só tinham a função de transformar um momento bonito numa grande merda.

Sempre achei que só existe um amor para a vida inteira, e eu amo Samantha mesmo depois da morte.

Eu sorri no momento em que ouvi essas palavras, mas no fundo tive vontade de bater nele. Não foi o que ele disse. Porra, ele ainda ser apaixonado pela esposa falecida não é ruim, sério. Isso significa que eles cuidavam um do outro, que o que tiveram foi especial, foi importante. Ama-la mesmo depois de sua morte, me mostra muito sobre o tamanho do coração de William Holt.

Não, não foram as palavras. Não foi o sentimento que ele admitiu ainda guardar. Mas foi a noção clara que William deixou para mim: meu coração está fechado, não abrirei espaço para ninguém. Um coração cheio de nada além da saudade e da dor, sem amor, é um coração vazio.

Ele sentiu o que eu senti. Ele estava comigo ali, de corpo, alma e coração. Sim, o coração de William estava ali, comigo, junto com o meu. Puta merda, como ele se nega a se entregar à algo que pode ser tão...

– Danna?

Pisquei algumas vezes para sair dos meus pensamentos e manter o foco no agora. Olhei para os olhos cinzentos de William que me fitavam de um jeito que indicava claramente que aquela não era a primeira vez que tentava chamar minha atenção.

– Estava pensando em algumas coisas – disse evasiva. – Desculpe, você falou algo?

Ele abriu um sorriso e revirou os olhos. William tinha mesmo que revirar os olhos logo quando eu os vi revirar na madrugada por um motivo bem diferente?

– Eu estava pensando um pouco e comentando com você. Ou melhor, com seu corpo, porque claramente sua mente estava longe – brincou, mas parecia indeciso sobre continuar. – Quando você falou sobre não gritar naquele momento... Eu não quero ofender, só não entendo e pesquisei na internet, mas não encontrei muito além de coisas técnicas.

Franzi o cenho sem conseguir ter a menor noção do que ele estava tentando falar.

– Sobre o que você esteve pesquisando?

– Sobre a Síndrome – murmurou baixinho e lançou uma olhadela para Isabella que rabiscava numa folha sobre a mesinha de centro da sala de William.

Minhas sobrancelhas se ergueram quando finalmente entendi.

– Ah, Síndrome de Down. Bem, na internet dá para acharmos algumas coisas bem interessantes se procurarmos bem – dei de ombros.

William coçou a barba por fazer.

– Danna, eu... Ela entende mesmo o que acontece ao redor?

Eu ri. Nossa, eu realmente tive que rir. Quando se é mãe de uma criança com Síndrome de Down parece fazer parte do "protocolo" ouvir coisas assim. Olhei dele, que trazia uma expressão sem graça, e depois para Isabella, nos olhando e sorrindo porque me via rir.

– Sim, William, Bella entende bem – respondi parando um pouco de rir. – Tanto quanto eu, você, Julliet ou qualquer outra criança na mesma idade que ela, com ou sem Down.

Ele balançou a cabeça, mas ainda parecia meio incerto com a minha resposta.

– Pessoas com Down são absolutamente como qualquer outra "normal" – disse fazendo desenhando aspas invisíveis no ar.

Cinco segundos para amar [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora