Capítulo 9

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Ao chegarem em casa Ricardo deixou bem claro que não precisava de babá e insistiu que Laura continuasse com a sua rotina. Ela recusou-se a ir planejar as coisas do casamento sabendo que seu pai estava doente em casa, então Ricardo ofereceu seu escritório aos dois para que pudessem analisar o risco da expansão da construtora e do financiamento necessário. 

Carlos e Laura não poderiam estar mais desconfortáveis com a parceria, mas depois de algumas horas de trabalho ambos estavam impressionados um com o outro. Carlos sempre admirou Laura pela sua capacidade de fazer coisas incomuns e surpreendê-lo. E Laura sempre amou sentir-se admirada por ele. Mas dessa vez ela foi surpreendida também, notou o quanto ele amadureceu, quantos talentos tinha e o notável talento para os negócios. 

Aos olhos de outras pessoas aquela poderia ser uma tarde enfadonha, ambos enfiados em trabalho e cálculos, mas para eles aquilo era puro prazer. Discutiam em harmonia quais riscos poderiam cometer, calculavam seu lucro em potencial e quando ele ou ela cometiam algum erro o outro ensinava como melhorar, o que estava errado e não havia julgamentos entre eles. Ambos sentiam que haviam encontrado uma zona segura. Podiam odiar-se, xingar-se, matar-se, mas não quando se tratava de negócios. Quando tratava-se de negócios se tornavam uma única pessoa. 

No final da tarde já estavam rindo um com o outro e o conforto que sentiam poderia ser notado por qualquer um. 

Laura estava com um amplo sorriso que foi desaparecendo aos poucos quando notou que uma linda mulher abria a porta do escritório. Carlos e Laura estavam distantes um do outro e eles apenas estavam conversando e rindo, mas mesmo assim ambos sentiram como se houvessem sido pegos fazendo algo errado ou vergonhoso. Laura observou a mulher a sua frente. Era jovem, talvez uns 23 anos, a pele bronzeada, o rosto fino, olhos escuros e cabelos perfeitamente cacheados que lhe caiam até o meio das costas. Ela era magra, mas tinha um corpo esbelto, uma mulher verdadeiramente bela e invejável. 

Laura quis odiá-la imediatamente, mas era impossível, a jovem portou-se educadamente e exalava doçura. 

- Com licença... Desculpe-me interrompê-los. Carlos, a dona Socorro disse que você estava aqui. Eu vim visitar Ricardo, não sabia que ainda estava aqui. Devo esperá-lo ou vai demorar a ir pra casa?

- O trabalho por aqui já acabou. Podemos ir. 

- Teremos que buscar o bernardo no futebol. 

- Certo. Ah.... Laura está é minha esposa Lúcia, querida esta é Laura. 

Laura não sabia ao certo o que se passava em seu coração. Nem poderia imaginar como deveria ser o seu semblante neste momento. Ficou imóvel, talvez por não ter lhe caído a ficha do que realmente significava a descoberta de que Carlos agora estava casado. Durante todos esses anos ela se concentrou tanto em seguir em frente que não imaginou que ele poderia fazer o mesmo. "Como não havia notado a aliança na mão dele"

Lúcia sabia quem Laura era, ouvira Carlos contar aquela história bem mais do que realmente quisera ouvir. Era uma história de dor e ainda via a dor nos olhos dele. Lúcia sabia o que a presença de Laura poderia fazer com ele, ela admitia que Carlos ainda a amava, talvez até mais do que há 16 anos quando se conheceram. 

- É um prazer conhecê-la querida, Ricardo fala muito a seu respeito. 

Foi Lúcia quem quebrou o silencio. Ela tomou a liberdade de entrar mais no comodo e apertar docemente as mão de Laura. Ainda que Lúcia desejasse odiá-la pela dor que causara em Carlos e por ser a verdadeira dona do coração daquele homem, ela não conseguia. Não era da natureza de Lúcia odiar outra pessoa e ela também entendia Laura, mas desejava fervorosamente que a verdade caísse sobre Laura para que ela entendesse o quanto Carlos a amava. Talvez assim superassem de vez as dores do passado. 

- Imagino... é um prazer conhecê-la também. Se puderem, fiquem para jantar, acredito que meu pai ficaria feliz com visitas. 

- É uma oferta maravilhosa, mas precisamos pegar o Bernardo no futebol e meu filho não fica muito animado em ter que esperar. Ele é muito carinhoso, sente-se esquecido quando demoramos. 

"Um filho... Eles tem um filho..." Dessa vez a dor atingiu-lhe em cheio. Saber que Carlos havia se casado doía, mas saber que ele havia tido um filho, isso destruiu-lhe por dentro. Carlos e Lúcia perceberam o quão mal Laura ficou e fizeram a única coisa que poderiam. 

- Bom, foi um ótimo trabalho esta tarde. Eu venho ver Ricardo assim que possível. Me dê notícias caso algo aconteça com ele. Com licença. 

- Novamente, foi um prazer conhecê-la. 

Lúcia acenou de longe enquanto saía de mãos dadas com Carlos. Laura acenou de volta tentando valentemente manter o sorriso amarelo em seu rosto. Quando a porta se fechou ela caminhou lentamente até a porta e a trancou. Assim que terminou de girar a chave parou de mantar a postura altiva e permitiu que todas as suas frustrações saíssem de seu corpo através das lágrimas. Fazia muito tempo que não chorava desta forma. Imaginou como Bernardo seria, se tinha os olhos castanhos claros do pai. "O seu bebê ela não quis, mas o de Lúcia tinha aceitado com amor. Qual era o problema daquele homem? Como pôde?" O mundo parecia infinitamente cinzento para Laura.

Já estava na hora do jantar quando ela se permitiu sair do escritório do pai. Passou no banheiro e tentou parecer descente. Conseguiu certa melhora com os olhos inchados que agora perdiam um pouco da vermelhidão. Deu-se por satisfeita com o pouco progresso, não estava com paciência para parecer perfeita. 

Passou na sala de jantar para avisar o pai que estava indo a casa da avó e que jantaria com ela. Sabia que o pai estava bem e que dona Socorro faria-lhe companhia. 

Laura pegou seu carro e foi em completo silencio até a casa da avó. Não saia-lhe da mente a imagem do colchão coberto de sangue e da perda de seu querido filho. Focou-se nas palavras do médico que dizia a respeito da possível dificuldade em engravidar após o acontecido. E tudo o que mais desejava naquele momento era ter um filho em seus braços. 

Sua avó espantou-se quando abriu a porta e viu a neta, imediatamente notou o estado de Laura e abriu-lhe os braços. 

Laura aceitou aquele bem vindo abraço e recomeçou seu choro. Sentaram no sofá e Laura deitou sua cabeça nas pernas magras da avó. 

- Diga minha filha... Deixe-me ajudá-la. 

- Eles tem um filho... ele arrancou meu filho de mim, mas com ela... eles tem um filho vó. 

- Bernardo? Você conheceu o Bernardo?

- Não. Eu conheci Lúcia. Ela é perfeita... é bonita, doce, não consigo nem odiá-la. 

- Você não deveria estar convivendo com esse rapaz. Não sei o que se passa na cabeça de seu pai por gostar dele. Querida, você está noiva. Você tem um futuro brilhante! Esqueça Carlos. Ele morreu na sua história. Bom Deus, quem é Carlos? Pense em Thomas, você terá seus filhos com ele e será muito feliz... Qual o sentido de lamentar-se tentando entender as loucuras desse maldito homem? Não se deixe enganar, Carlos não faz nada sem um intuito. 

- Mas tem que haver alguma explicação. Não faz sentido. Que ambição ele poderia ter? Ela não me pareceu uma mulher muito sofisticada. 

- Carlos tem uma imagem a zelar. Lembre-se de minha palavras, ele é igualzinho ao pai. Logo ele será um político, escreva o que digo. O pai dele tem grandes ambições para o filho. Carlos viu uma maneira de tornar-se um bom empresário em sociedade com o seu pai, mas vai usar as empresas para os negócios sujos do pai dele. 

- Essas acusações são muito sérias vovó. 

- Eu sei, estou te falando isso para que fique de olho. Não se deixe enganar pelo rosto bonito dele. Thomas sempre será o melhor para você, ele te ama de verdade. Concentre-se em você, no seu futuro e na sua felicidade. 

Laura sentiu-se melhor com as palavras da avó. A senhora demonstrava tanta convicção de que Laura seria imensamente feliz ao lado de Thomas que até a convencia. Laura saiu dali com as desconfianças da avó e com uma missão a cumprir, descobrir se Carlos estava usando a empresa de Ricardo para os negócios sujos do pai. 

Após jantar com a sua avó ela voltou para casa e entrou pela madrugada escolhendo os lugares de cada pessoa na festa e organizando os convidados nas mesas. Quando a exaustão chegou finalmente adormeceu. 


O Tempo que estive aquiOnde histórias criam vida. Descubra agora