Rita.

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"Os teus olhos viram o meu corpo ainda informe, e no teu livro todas estas coisas foram escritas, as quais iam sendo dia a dia formadas, quando nem ainda uma delas havia."
(Salmos 139.16)


"Quando a luz dos olhos meus

E a luz dos olhos teus

Resolvem se encontrar

Ai que bom que isso é meu Deus

Que frio que me dá o encontro desse olhar..."

     -Rafael! –A voz de Leandro veio até o rapaz o tirando da concentração do poema de Vinícius de Moraes.

     Por que sempre insistiam em atrapalhá-lo somente quando ele estava lendo? Rafael se afundou ainda mais em seu sofá e fingiu que não havia escutado.

     -Rafaeeeeeeel! –Leandro apareceu na sala. –Misericórdia garoto! Está surdo é?

     -Para algumas coisas eu prefiro estar surdo.

     Leandro revirou os olhos coloridos:

     -Eu preciso te contar um negócio.

     -Pode falar.

     -Mas primeiro preciso que você venha comigo.

     -Olha, Leandro! Eu estou muito ocupado para ir...

     -O assunto é sério. –De repente o rosto de Leandro escureceu.

     Sem saber o porquê assim que Leandro falou aquelas palavras o coração de Rafael se apertou. No mesmo instante o rapaz colocou seu livro ao lado e se levantou para acompanhar o homem.

     Rafael ainda insistiu algumas vezes no assunto perguntando o que havia acontecido, mas Leandro permanecia em silêncio, por fim Rafael apenas o seguiu e deixou a ansiedade o consumir.

      O rosto de Leandro estava mais sério do que o que era de se esperar, o rapaz pensou em mil e uma coisas que estavam acontecendo, mas nada parecia ser o bastante para tudo aquilo.

     -Você precisa ser forte, irmão. -Leandro parou de andar quando chegou perto de uma vala de esgoto.

     O homem deu um passo para o lado abrindo passagem para que o jovem chegasse mais perto e observasse o que estava ali.

     Assim que seus olhos processaram o que estava vendo o estômago de Rafael se contorceu e no mesmo instante sentiu vontade de vomitar, não só pelo cheiro, mas a cena que estava diante de seus olhos o causou repulsa.

     O corpo de Rita estava irreconhecível, suas roupas estavam rasgadas e quase não cobriam seu corpo totalmente machucado. Seus cabelos tão cheios de vida, estavam ressecados e cheios de lodo.

     -Ela está... -Rafael não terminou a frase, mesmo que tentasse, não conseguiria.

     -Morta. -Leandro completou. -Eles acharam o corpo dela essa noite. Certamente morreu de overdose.

     Rafael não tinha dúvidas, os olhos fundos, os ossos que apareciam sob a pele de Rita não deixava dúvidas de que a garota havia usado droga até seu corpo aguentar.

     -Então? O que a gente faz? -Leandro perguntou quando o silêncio de Rafael já havia se tornado incômodo.

     -Como assim?

     -Você é o único parente vivo que ela tem, então você que decide o que deve ser feito com o corpo dela.

     Rafael engoliu em seco juntamente com todos os seus sentimentos em relação a sua irmã.

     -Façam o que quiserem. -Ele falou por fim se virando para ir embora, a visão do corpo de sua irmã era algo que ele queria esquecer o mais depressa possível.

     -Mas Rafael...

     -Queime o corpo então.

     -Você é louco? Ela é a sua irmã! -Leandro gritou.

     -Isso -ele apontou para o corpo já apodrecendo com alguns ratos caminhando por cima. -não é a minha irmã. -Ele se virou e por incrível que parecesse as lágrimas não vieram.

Feito de PedraOnde histórias criam vida. Descubra agora