Foram dois dias naquele hospital, indo em casa somente para tomar banho e voltar para o lado de Luiza. Os médicos fizeram todos os exames possíveis, mas não encontraram nenhum foco de infecção. A febre persistiu durante o primeiro dia, mas no segundo dia sua temperatura foi normalizando. Minha criança estava triste e isso acabava comigo.
- Ei... olha o que eu trouxe! - Entrei no quarto com uma boneca em mãos.
Clara tinha ficado no hospital com Luiza, enquanto eu resolvia alguns problemas do restaurante. Na volta acabei passando em frente a uma loja de brinquedo e vi a boneca que ela tanto me pedia. Era mais uma tentativa de fazer Luiza sorrir um pouco.
Ela olhou para porta assim que ouviu minha voz.
- Mas não é a boneca que você tanto queria? - Clara disse animada.
Luiza olhou para a boneca em minhas mãos e sorriu fraco.
Clara me olhou preocupada.
Entrei no quarto e sentei ao seu lado.
- Gostou, querida? - Coloquei a boneca ao seu lado.
Ela mexia nos cabelos da boneca, mas nada falou.
- Luiza... fala com a mamá... - Meus olhos se enchiam de lágrimas toda vez que era ignorada por ela.
Minha filha resolveu fazer algum tipo de voto de silêncio. Ela quase não falava. Vivia triste e cabisbaixa. Eu sabia bem o motivo. Mas não ela tinha que se acostumar com a ausência de Ana.
- Vou com sua mãe ali fora, amor! - Ela concordou e sorriu para Clara. - Já volto! - Clara beijou sua mão e me puxou para o corredor do hospital.
Ela andava de um lado para o outro, como fazia toda vez que ficava nervosa.
- Isso já passou dos limites! - Falou me encarando. - Essa menina está sofrendo, porque você é uma cabeça dura!
Nunca vi Clara tão irritada.
- Isso acaba hoje! - Pegou o celular no bolso.
- O que pensa que vai fazer? - Disse tentando pegar o celular da sua mão. Clara desviou com facilidade.
- Eu vou avisar a Ana! - Olhei irritada para a menina. - Não adiante me lançar esse olhar mortal! O que está em jogo aqui é a saúde de Luiza!
- Acha que não me preocupo com a saúde da minha filha! - Disse um pouco alto.
- Eu sei que se preocupa! Você é a mãe dela! Mas entenda Cristina, você terminou o relacionamento com a Ana, não a Luiza! - Meu coração se apertou. - Você não querer ver Ana eu até entendo, mas o que custa chamá-la para ver Luiza. Sua filha precisa disso...
Fechei os olhos e respirei fundo.
- Se ligar para Ana eu não vou te perdoar... - Clara arregalou os olhos. - Não se meta nisso, Clara! - Ela recuou assustada. - Pode ir embora, eu fico com Luiza! - Virei as costas e voltei para o quarto.
Clara não voltou. Eu passei o resto da tarde velando o sono da minha filha, até que o médico entrou no quarto.
- Como vocês estão? - O pediatra de Luiza entrou sorridente com alguns papeis na mão.
- Olá, doutor! - Sequei minhas mãos suadas na minha calça. Eu sabia que aqueles papéis eram o resultado dos exames.
- Tenho uma boa notícia! - Disse sorrindo. - A mocinha aqui está liberada! - Disse brincando com Luiza. - Posso falar um minuto com você?
- Claro! - Saímos do quarto por alguns minutos.
- Cristina, não encontramos nenhum foco de infecção. - Respirei aliviada.
- Mas o porquê dessa febre?
- Arrisco a dizer que foi uma febre psicogênica ou mais conhecida como febre emocional... Luiza passou por algum estresse emocional esses dias?
Fechei os olhos e abaixei a cabeça.
- Sim...
- Então é possível que seja por isso. Fique tranquila ela não tem nada físico... - Ele me olhou com ternura. - Mas crianças são sensíveis e muitas vezes não conseguem demonstrar seus sentimentos... A febre é uma reação a isso, ela está triste.
Tudo o que eu não queria aconteceu... Meus problemas com Ana afetaram minha filha mais do que imaginei.
Abri a porta de casa para Luiza. Ela estava agarrada a nova boneca e ainda cabisbaixa. Entrou sem esboçar nenhuma reação.
Fechei a porta e observei ela indo até seu quarto e voltando com a fada de pelúcia que Ana deu a ele de presente nos braços. Luiza sentou no sofá agarrada a boneca.
- Posso ver desenho?
Eu sorri fraco.
- Claro, amor! - Peguei o controle da Tv e coloquei no canal que ela mais gostava.
- Vou fazer um lanche para você, Ok? - Ela apenas balançou a cabeça.
Aquele silêncio da minha filha estava me matando.
Clara não estava em casa, acho que ainda estava chateada comigo. E tenho quase certeza que descobri um novo dom, magoar todos a minha volta. Bufei.
Fiz o bolo de chocolate preferido de Luiza, sentei ao seu lado no sofá para ver desenho, coisa que quase não tinha tempo. Ela mal tocou no bolo. Ria com os desenhos e não largava a bendita boneca. O sono foi batendo e aos poucos ela foi deitando no meu colo, até que adormeceu.
Tentei tirar a boneca dos seus braços, sem sucesso.
- Me perdoe, querida... Mamãe não queria que as coisas chegassem a esse ponto... - Acariciava os seus cabelos. - Eu prometo que isso vai passar. - Acho que disse mas para mim, do que para ela.
Beijei seu rosto e sai do quarto, deixando a porta entreaberta como ela gostava.
Tirei os copos e pratos da sala e quando voltei o desenho que estava passando me fez sorrir e lembrar. Gato Félix passava na Tv. Lembro quando comparei Ana a esse desenho bobo, já que era a única coisa que me fazia parar em frente a Tv quando criança.
Sentei no sofá agarrada a uma almofada e chorei... chorei vendo um desenho! Até um maldito desenho me lembrava aquela mulher!
A campainha tocou.
- Esqueceu a chave de novo, Clara? - Levantei enxugando as lágrimas. - Já não disse para colocar essa... - Abri a porta e me calei no mesmo momento.
Ana estava parada com o semblante bem irritado.
- O que está fazendo aqui? - Disse surpresa.
- Porque não me contou que Luiza estava doente? - Ana me encarava com seriedade.
- Ela já está bem, obrigada! - Tentei fechar a porta mas Ana empurrou.
- Escuta aqui, Cristina! - Ana empurrou a porta com certa força. - Não coloque Luiza no meio dos nossos problemas! Ela não tem nada a ver com isso!
- Clara não tinha nada que ter...
- Ela foi a pessoa mais sensata daqui! - Ana colocou as mãos na cintura e claramente me enfrentando falou:
- Vai me deixar entrar ou terei que passar por cima de você?
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Amor Doce Amor
Romance"Passei minha pequena toalha pelo rosto, tirando um pouco de farinha espalhada. Olhei mais uma vez para o corredor e ouvia cada vez mais vozes diferentes. Quando se trabalha em um cozinha você se acostuma com cada som que sai das panelas, dos utensí...