Capítulo 6 - A carta misteriosa

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Eu não dormi muito bem. Fiquei umas boas horas pensando. Minha cabeça parou de doer quando estava prestes a amanhecer. Sonhei com vovó. Foi um sonho bom. Nós estávamos na igreja, louvando a Deus. O violão estava na minha mão, eu tocava e havia um sorriso lindo em meu rosto. Estávamos felizes. Eu podia sentir Deus. Infelizmente, quando meus olhos se abriram, vi que tudo não passou de um sonho. Estava em um quarto chique, vivendo sob o teto de um pai que não ia com a minha cara. A única parte benéfica de estar em Nova Orleans era Lise, Matt e Lena.

Levantei-me e olhei o celular. Havia uma mensagem. A princípio, animei-me, mas lembrei que ninguém tinha o meu número.

"Faça uma recarga e ganhe 50MB. Mega promoção. Apenas hoje!"

— Ótimo! — Bufei.

Já era quase meio-dia. O sol brilhava lá fora e o jazz tocava.

Respirei fundo e me ajoelhei diante da cama. Há alguns dias eu não orava. Sentia-me extremamente distante do céu, distante de Deus. Fechei os olhos e tentei formular palavras. Nada saiu. Meus lábios não se moveram e nenhuma lágrima rolou. Não conseguia me conectar. Meus pensamentos vagavam longe, desde a música que tocava às palavras de Felipe na noite anterior. Soquei o colchão depois de cinco minutos ajoelhada e nenhuma conexão estabelecida. Levantei. Abri a janela para entrar um ar. A música animada tornou-se mais alta. Fui para o closet, separei algumas roupas e tomei um banho de trinta minutos.

Eu conseguia sentir medo, tristeza, dor, vazio. Sentia um misto de emoções em massa. Nada de Deus. Tudo o que eu ouvia Dele era o silêncio ensurdecedor. Ele conhecia meu coração, sabia que eu precisava desesperadamente Dele, que eu precisava sentir sua presença. Entretanto, cheguei à conclusão de que eu não importava para Ele, assim como não importava para Felipe. Fui rejeitada por meu pai carnal e estava sendo ignorada por meu Pai Celestial. Isso doía demais.

Vesti a calça jeans de lavagem escura, uma regata branca e sapatilhas da mesma cor. Penteei meus cabelos e os amarrei em um rabo de cavalo. Coloquei um dos perfumes que Lise me deu. Tinha cheiro de rosas. Arrumei minha cama e coloquei o celular no bolso.

Estava quase saindo do quarto quando o vento derrubou algumas coisas da escrivaninha. Caminhei até o móvel branco, juntei os dois enfeites que caíram. Um era a Torre Eiffel e o outro era um gatinho de madeira, ambos presentes de Lena. Ao colocá-los sobre a escrivanhia, notei um papel dobrado ao meio. Não me lembrava de tê-lo colocado ali. Talvez, Lise ou Felipe tivessem deixado aquele papel. Peguei a folha branca e a desdobrei.

"Querida filha,
falo contigo mesmo quando não ouves a minha voz."

Meus olhos marejaram. Não sabia como reagir. As lágrimas começaram a rolar instantaneamente. Minhas mãos estavam trêmulas e um temor muito grande apossou-se de mim. Então, eu O senti, mesmo que por uma fração de segundos. De pé, diante da escrivaninha e daquela folha, meu coração e meu pensamento iniciaram uma reconexão com o céu.

Fui interrompida quando a porta do quarto abriu. Enxuguei meu rosto e me virei. Era Felipe. Ele usava uma roupa de chefe de cozinha.

— Bom dia.

— Bom dia.

— Vim chamá-la para almoçar. Você está sem comer há muito tempo.

— Ok. — Dobrei o papel e larguei no mesmo lugar.

— Passou a dor de cabeça?

— Sim.

Queria acreditar que ele realmente estava preocupado comigo, no entanto, grande parte de mim acreditava que Lise o obrigou a ir até meu quarto me acordar e ser gentil comigo.
Fizemos o trajeto até o restaurante. Estava movimentado.

De Pai Para FilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora