Bônus Felipe

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Genevieve Beaumont.

Lembrava-me perfeitamente do dia que sua chegada foi anunciada. Diane e eu estávamos em uma bela ponte de Nova Orleans, observando o pôr do sol.

— Preciso contar uma coisa. — Seus olhos miravam o horizonte.

— O quê?

— Estou grávida.

Naquele momento, puxei-a para meus braços e senti que a ferida de meu coração podia fechar com a chegada daquele bebê. Há dois anos Matt e eu tínhamos perdido nossos pais em um acidente, ele estava num momento "vida louca", bebia e temia que estivesse envolvendo-se com drogas, entretanto, eu seria pai. Não poderia haver algo que pudesse me deixar mais feliz.

Os pais de Diane ficaram muito felizes com a notícia. Infelizmente, o pai dela faleceu poucos dias depois, vítima de um infarto.

Acompanhei toda a gestação, compramos uma casa em um bairro mais afastado da correria da cidade. Eu pintei o quarto de nossa menina. Eu queria que fosse uma menina, para poder ser o seu herói. Chorei quando a médica disse que era uma menininha, chorei mais ainda quando ouvi as batidas do seu coraçãozinho.

Mobiliamos todo o quarto de nossa princesa. Eu escolhi o nome Genevieve pelo significado: mulher de boas origens. Até porque, a família Beaumont era muito querida em Nova Orleans, por causa do restaurante e tudo o mais. Éramos quase que uma família modelo, até nossos pais morrerem e tudo acontecer.

Compramos ursinhos de pelúcia, bonecas e fizemos de tudo para que ela tivesse a vida que merecia ter.

Nem tudo saiu como o esperado.

Quando a bolsa de Diane rompeu, fomos com largos sorrisos no rosto para o hospital. Nunca esqueceria de suas palavras:

— Eu te amo, Felipe. Obrigada por me dar o maior presente de todos. Vamos amá-la e protegê-la. — Sua mão segurou a minha. Apesar da dor das contrações iniciais, ela estava sorrindo.

Por algum motivo que não entendi na hora, o obstetra solicitou que eu me retirasse da sala de parto. Relutante, o fiz. Ophelia, a mãe de Diane, e Matt, tentavam me acalmar. Andava de um lado a outro. Afinal, minha filha estava prestes a nascer. Não via a hora de segurá-la em meu colo, poder aquecê-la no calor de meus braços, fazê-la dormir, amá-la e protegê-la de tudo que lhe oferecesse risco.

— Sr. Beaumont. — Ouvi a voz do médico.

— Minha filha nasceu, doutor? — Questionei com um sorriso de orelha a orelha.

— Meu jovem... — O médico suspirou pesadamente. — Houveram complicações no parto. Sinto em dizer, mas terá que escolher entre sua esposa e sua filha. Não poderemos salvar as duas.

Naquele momento, o mundo desabou em cima de mim. Eu tentei gritar, mas a voz não saiu. Queria poder trocar de lugar com alguma delas e salvar as duas. Ophelia se ajoelhou na beira de uma cadeira e orou a Deus. Matt parecia estar transtornado, assim como eu. Sem dúvida alguma, foi o dia mais doloroso de toda a minha vida.

— Doutor... — Hesitei.

— Precisa ser rápido, meu jovem. Sua mulher está muito fraca. Se for rápido, poderemos salvar ao menos uma. — Podia ver a dor e o semblante cansado do homem a minha frente.

Eu olhei para minha sogra, a qual assentiu com extrema dor. Juntei todas as minhas forças e tentei abafar o choro compulsivo. As lágrimas já banhavam meu rosto. Sentia raiva de mim mesmo pelo que ia dizer, mas era preciso. Era o certo. Sei que Diane escolheria isso.

— Salve minha filha.

Senti como se estivesse apunhalando a mim mesmo naquele instante. Ophelia me abraçou e choramos. Após o parto ser realizado, levaram-me até o quarto onde estava Genevieve e Diane. Minha mulher tinha um sorriso gigante no rosto, embora estivesse fraca demais.

— Obrigada, por tudo. Por escolher nossa menina. Cuide dela. Eu te amo, pra sempre.

Foram suas últimas palavras, o seu último suspiro. Peguei Genevieve em meus braços. Derramei muitas lágrimas a mais. Odiava-me pelo que tinha feito e temia que Genevieve me odiasse algum dia. Apesar da dor, Matt insistiu que deveríamos ter uma foto do dia do seu nascimento, mesmo que fosse um dia triste. Forcei um sorriso e tiramos a fotografia no berçário.

No dia seguinte, houve o funeral de Diane. O tempo todo, Genevieve esteve em meus braços. Entretanto, não me via apto para cuidar dela. Não da forma que eu deveria cuidar. Eu escolhi entre ela e Diane. Era algo que eu deveria lidar sozinho, uma amargura que eu deveria lidar sozinho.

Registrei-a com o meu sobrenome. Iria sustentá-la, seria seu pai, mesmo que não fosse da forma mais convencional. Entreguei-a para Ophelia, a qual recebeu minha menina com muito amor e carinho. Coisas que, talvez, eu nunca fosse capaz de lhe proporcionar. Elas mudaram-se para Birminghan, no estado do Alabama e eu tentei seguir em frente.

Porém, não houve um dia sequer em que não pensei nela. Com o tempo, conheci Anelise e permiti-me amar novamente. Foquei no meu trabalho e tentei fazer com que minha dor e culpa sucumbissem, mesmo que isso incluísse ficar longe de minha pequena.

Fui visitá-la uma vez, quando ela tinha sete anos. A saudade estava me 0sufocando. Tentei não me apegar muito, não queria que Genevieve quisesse uma proximidade comigo.

Mas Ophelia se foi e eu estava tentando me manter calmo. Na verdade, não sabia como reagir. Não sabia como ser um pai. Não sabia como explicar para ela que o motivo para tê-la afastado não foi a falta de amor, foi amá-la demais.

De Pai Para FilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora