14 - Dante

42 6 0
                                    

Já se passaram alguns dias desde que vi a minha sobrinha. Os olhos castanhos eram iguais aos do meu falecido irmão, o seu rosto pequeno lembrava-me tanto Elizabeth. Estaria tão jovem e bonita, como há 18 anos atrás? Claro que sim. Para vampiros puros como nós, o tempo não passa, não afecta ou envelhece. Estamos condenados a ficar petrificados na juventude.

Hoje, olhar pela janela não me acalma de maneira nenhuma, estou bastante impertinente, sem vontade para conversas. As árvores estavam baças, sem cor, sem vida. Os animais estavam sossegados, escondidos, não queriam sair dos seus ninhos e tocas. O céu estava escuro e coberto de nuvens. Aproximava-se uma grande tempestade, talvez dentro de 2 horas a mesma caísse. Não me importava, hoje apenas queria estar sozinho, sem ser incomodado.

Queria ter a oportunidade de rever Maggie, mas também queria conhecer melhor o meio vampiro caçador. Não conseguia esquecer a semelhança que existia entre os seus olhos e os da minha antiga amada. Seria possível? Ou estava o meu coração a enganar-me?

O meu coração estaria a bater desenfreadamente, se ele estivesse vivo. Por isso, invejo os humanos, por terem o seu coração vivo e, mesmo assim, desperdiçarem as suas vidas por algo absurdo, como a eternidade.

Gosto imenso de Sienna, a minha guarda-costas e amiga, mas ela não hesitou aceitar ser transformada num ser imortal, sem vida, sem cor e sem batimento cardíaco. Não a condeno, depois de todo o sofrimento por que passou. Acredito que lhe dei uma nova vida, naquela noite.

Já a transformei há 150 anos, mas parece que tudo aconteceu ontem.

*150 anos atrás*

Sei que é Inverno. Sinto-o no fumo que a minha respiração cria, em contacto com o ar gélido que me rodeia.

Não estou nada alegre ou bem humorado, discuti com o meu irmão John. Ele insiste em dizer que os humanos devem ser protegidos de demónios como nós. Para John, não basta apenas ser rei de humanos e demónios, deve proteger ambos. Não consigo concordar com as suas palavras, porque os mortais são o nosso alimento. Sem eles, no mínimo morreríamos de fome.

O meu irmão não concordava com a forma que eu via os humanos. Aos seus olhos, eles são muito mais do que alimento, fonte de juventude. São pessoas que sentem, que têm a capacidade de amar, precisam de alguma proteção. Eles são os primeiros a ajudar-nos, se for necessário.

Em parte, John tinha razão. Os mortais ajudam-nos em tudo o que carecíamos, mesmo que isso signifique a sua morte. Talvez, só talvez, John tenha razão no que diz todos os dias.

Os humanos talvez valham a pena proteger e amar.

Já estou a caminhar por estas ruas sombrias há algumas horas e começo a ser dominado pela fome, sede. A necessidade de beber sangue cresce no meu interior. Mas não vejo nenhuma pessoa por perto ou nas redondezas nestas ruas sem cor.

Não quero continuar neste caminho solitário, a pensar no que devo ou não devo fazer em relação aos mortais. Serão mesmo capazes de grandes feitos? Serão os mortais capazes de amar com todas as suas forças, como se precisassem do amor para viver?

Quero acreditar na bondade humana, mas não consigo. Somos nós que passamos por vilões, mas amamos incondicionalmente. Somos culpabilizados por crimes feitos por mortais insolentes, que acham que estão acima dos criadores do Céu e do Inferno. Somos os monstros perfeitos, mas evitamos o contacto com os seres frágeis que nos rodeiam.

Após alguns metros de caminhada, olho para ela. Ela passeia sozinha pelas sombras da noite, parecendo indefesa. Aproximo-me dela calmamente, para não a assustar.

O Caminho para a EscuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora