Março de 1815

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        CAPÍTULO UM

        O dia estava lindo, não fosse a tristeza que assolava a vida de Melise.

        Ela sempre admirou a natureza nos seus mais diferentes aspectos, desde quando caía uma chuva torrencial, até quando o sol se mostrava claro, sob um límpido céu azul; desde uma noite escura e sem brilho, até uma luminosa, repleta de milhões de estrelas. Porém, com a recente morte dos pais - há dois meses - e apenas uma semana para sair da propriedade que fora sua residência por vinte e um anos, percebeu-se que a vida colocou em jogo toda a sua capacidade de ser resiliente.

        Há poucos meses, Melise não poderia imaginar que a felicidade de outrora se transformaria em algo distante e inatingível. Felizmente, sempre aproveitou ao máximo do que a vida lhe proporcionou. Amou os pais e os obedeceu incondicionalmente, enquanto eram vivos.

        Infelizmente a vida nem sempre é justa.

        Naquela tarde cinzenta de janeiro, chegou a triste notícia da morte de seus queridos pais. A carruagem em que eles haviam saído para uma curta viagem, junto com seu único irmão, havia caído no lago gélido a pouco menos de cinco quilômetros de sua residência, na manhã chuvosa daquele fatídico dia. 

        As lembranças a acompanhavam desde então, como se fizesse uns poucos dias; quem sabe, poucas horas; tamanha a dor que teimava em não diminuir.

        Era terrível ter de suportar tudo aquilo sem ninguém para amparar ou oferecer um abraço, uma palavra. Até o seu irmão sucumbira junto com os pais. Tudo que ela possuía acabou num único dia. A saudade era profunda e a dor se transformara na maior companheira. Apesar disso, o choro de Melise, naquele dia, não foi por pena de si mesma, mas unicamente por sua perda.

        No entanto, já havia derramado todas as lágrimas a que tinha direito. Agora precisava agir rapidamente e sem emoção. Ela compreendia que o seu luto deveria ser esquecido momentaneamente, para, de forma prática, decidir o que fazer a partir da próxima semana. Afinal de contas, o primo que havia herdado a propriedade chegaria naquela tarde para se apossar de sua herança.

        Ela já havia decidido que não poderia permanecer na propriedade, uma vez que essa passaria, de forma injusta, sob o seu ponto de vista, a pertencer ao filho de um tio distante e com o qual ela não tinha intimidade. Tudo porque seu pai só tinha um filho,  que, com a sua morte, seria seu herdeiro legal. Entretanto, a despeito de todas as possibilidades inimagináveis, ele havia morrido no mesmo dia do pai. Acontecimento terrível que não só trouxe tristeza a Melise, mas também a destituiu da possibilidade de permanecer no único lugar que conhecera como lar e onde tanto fora feliz.

        Melise decidiu sair antes da chegada do primo. Arrumou os vários baús, porque tinha bastante roupa e sapato. Os pais sempre lhe deram o melhor e nunca faltou um vestido novo para passear ou ir à igreja. Também sabia que jamais voltaria a sua casa. Não  suportaria ver outra pessoa cuidando das coisas que seus pais conquistaram com tanto esforço e preservaram com tanto amor.

        Há algumas semanas descobrira um anúncio no jornal que buscava uma preceptora para uma criança de dez anos, e havia se candidatado ao emprego. Por pura sorte, apesar de não ter antecedentes ou carta de referência, foi aceita, com a condição de que se apresentasse na semana seguinte, para assumir o seu trabalho. O pai da garota viajaria e queria deixar a filha sob orientação da nova preceptora.

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