Conhecendo

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Eu tinha cinco anos quando meus pais e eu precisámos nos mudar, meu pai perdeu o emprego que tinha na cidade e minha mãe tinha uma casa no interior, uma cidadezinha pouco conhecida.

Eu não saia muito quando morávamos na cidade, eu recebia aulas em casa, meus pais diziam que era melhor assim, eu não entendia muito, eu era uma das únicas crianças que não ia a escola.

Quando nos mudámos eu lembro de ter ficado maravilhada com o novo lugar, haviam grandes árvores, flores por todos os lados e de todas as cores, a casa era pequena mas aconchegante, na entrada havia um caminho de pedrinhas bem posicionadas, e ao lado grama verde recém cortada, uma porta amarelada de madeira na entrada da casa nos desejava boas vindas, eu sempre quis entrar numa dessas casinhas simples do interior.

Lembro de estar usando um vestido rosa e de meus cabelos cacheados estarem livres, dançando com o vento, o cheiro lá era diferente do da cidade, tinha cheiro de casa, de grama cortada, das flores no jardim e quando chovia o cheiro da terra molhada preenchia meus pulmões e eu me sentia maravilhada.

Dentro da casa era simples: uma sala pequena com algumas estantes cheias de livros empoeirados, algumas poltronas, um sofá e uma mesinha de centro de madeira enfeitada com um jarro de flores da época que já não estavam tão bonitas, perto dali, havia uma cosinha, com uma daquelas geladeiras antigas, alguns armários e uma mesa de jantar com quatro cadeiras, havia também um pequeno corredor que levava ao banheiro e aos quartos.

Lembro que foi nessa casa que aprendi que a beleza não estava na aparência mas sim no coração, porque a nova professora que papai contratou insistia pra que eu alisa-se meus cabelos.

" você ainda é criança, não consegue entender que seria muito mais bonita se mantivesse os cabelos lisos, veja, sua pele não é tão escura e seus olhos são claros mesmo para castanhos, alise os cabelos e ninguém poderá falar que você não é filha de seus pais. "

Me peguntei porque alguém poderia falar de mim só por ser diferente da maioria, só por não parecer muito com minha mãe, foi então que pedi pra minha mãe alisar meu cabelo e ela me perguntou porque, quando contei, eles trocaram minha professora, mamãe disse que meu cabelo era lindo e que eu era linda do jeito que eu era e ser diferente deles não era tão ruim, até porque, ninguém pode ser igual a ninguém.

Algo que eu amava naquela casa era o espaço novo que eu tinha para brincar e o fato de ter tantos pequenos animais para conhecer, um dia olhando as flores vi nascer uma borboleta azul, era linda e voou pra longe quando tentei me aproximar.

Eu gostava de subir em árvores para colher frutas, mesmo com mamãe dizendo para não fazer isso, que poderia me machucar, mas em cima das árvores era meu lugar favorito.

Minha mãe começou a vender flores quando nos mudámos e eu aprendi a colher com cuidado pra não me machucar nos espinhos.

Papai arrumou um novo emprego no interior, mas perto de nossa nova casa e sempre que ele estava perto de chegar, eu corria pra casa, tomava banho e o esperava na porta, quando ele chegava na cerca de proteção que ficava ao redor da casa, eu corria até ele e o abraçava, era a melhor sensação do mundo e ele sempre me trazia coisas novas e diferentes do centro.

Era uma boa vida, as vezes as crianças vizinhas apareciam para brincar, mesmo que suas casas fossem bastante distante das demais, nós nos juntávamos e corríamos por todas as casas chamando nossos amigos para ir até o lago que ficava no final de uma pequena floresta por trás de nossas casas.

Nós brincávamos de tudo que podíamos imaginar, mas minha parte favorita era quando nossos pais também iam e podíamos entrar no lago.

Quanto mais eu crescia, mais aquele lugar se tornava meu porto seguro. Eu tinha duas amigas que também estudavam em casa como eu e nossos pais se juntaram para termos aulas juntas com a mesma professora, as vezes a professora trazia consigo um garoto da nossa idade, nos brincávamos juntos quando acabava a aula.

As vezes era apenas eu e Marcos, as meninas voltavam pra casa mais cedo e o garoto e eu subíamos na mais alta das árvores e comíamos juntos os frutos que conseguíamos pegar.

Marcos tinha dez anos quando eu tinha oito e o tempo que passávamos juntos era muito divertido, o garoto era um pouco mais alto que eu, tinha cabelos amarelos como sol e olhos azuis como a água do lago, alguns achavam estranho que andássemos juntos, um garoto loiro com uma menina morena, mas não ligávamos, não tinhamos idade pra ligar.

Meus pais já não podiam pagar mais professores particulares pra mim, então ele conversou com a nossa professora para indicar uma escola pública e acabei estudando na mesma escola que Marcos e toda vez que eu saia de casa meus pais ficavam preocupados e eu não conseguia entender os motivos, não na época, todos estudavam no mesmo lugar e a maioria ia andando sozinho até a escola, que não ficava muito longe.

Eles diziam ter medo de me deixar sozinha quando eu não estava, mas os ouvia conversar escondido as vezes, tinham medo que algo de ruim me acontecesse, medo que eu não quisesse voltar pra casa, medo que eu descobrisse a verdade, porém um dia eu descobriria, não importa o quanto me protegessem, ou o quanto tentassem.

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Anjo MeuOnde histórias criam vida. Descubra agora