Dor

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...

Entrei na forma física e segurei Soffia em meus braços, senti seu desespero enquanto ela caia e algo se remexeu dentro de mim, algo que eu não sabia que existia.

Ter dado a Maria a chance de dizer adeus quase havia me esgotado e eu estava cansado quando segurei a garota em meus braços, eu sabia que Maria podia me ver quando agradeceu e que era a mim que se dirigia, então quando água deixou meus olhos e aquela sensação estranha tocou meu coração eu gritei.

- PAI, PORQUE PERMITE ISSO? PRA QUE ARRANCAR O CORAÇÃO DESSA GAROTA PRA SABER SE ELA É DIGNA? NÃO CONSEGUE VER QUE NÃO É ESSE O DESEJO DE DEUS PARA COM SEUS FILHOS? NÃO VÊ QUE O QUE FASES É ERRADO, CHEGA DESSA GUERRA ESTÚPIDA MUDE SUA DECISÃO, OU EU ME RECUSO A SER CHAMADO DE SEU FILHO.

Abracei Soffia com toda a força que eu tinha e chorei pelo seu sofrimento, eu queria poder fazer mais por ela, mas apenas me sentia inútil naquele lugar, mudei de forma novamente e cobri seu corpo com minhas asas, tirando o máximo de dor da garota que eu poderia conseguir e quando a escuridão veio para tomá-la usei aquela dor para destruir aqueles bichos nojentos e mandar um recado a Lúcifer.

Soffia tinha um guardião e mesmo que eu não pudesse fazer nada contra a maldição, eu faria algo por ela, eu daria minha vida se fosse preciso.

- Mãe, eu não sei se estou seguindo o caminho certo, eu não sei o que estou sentindo queimar em meu peito. - chorei esperando que minha mãe ouvisse de onde estivesse. - me perdoe por ser falho, não sou digno do céu ou de seu amor, não consigo cumprir com minhas obrigações, não consigo não sentir e não querer interferir, estou lutando contra tudo que acreditei por tanto tempo, eu entendo se desistir de mim.

Senti o vento suave contra meu rosto e dexei que ele o secasse e me renovasse.

Levantei e carreguei Soffia até seu próprio quarto enquanto a mesma estava desmaiada, eu não sabia o que mais poderia fazer, então apenas fiquei ao seu lado segurando sua mão enquanto seu mundo ruia, esperando que meu poder se restaurasse pra que eu pudesse lhe dar bons sonhos.

...

Ela não falava, não dizia uma palavra desde que tudo aconteceu, ela apenas abraçava o garoto de cabelos amarelos enquanto a caixa que guardava o corpo de sua mãe voltava para dentro da terra, ao lado do lugar que seu pai fora enterrado.

Um homem falava algo sobre cinzas e pó e pedia que Deus guardasse o espírito de Maria, Soffia chorava abraçada ao garoto e segurando minha mão mesmo eu não estando lá fisicamente.

Eu tive medo de perde-la quando me perguntou onde eu estava durante os piores dias de sua vida e esse era apenas mais um deles, mais um em que estava ao seu lado e ela não poderia me ver.

No quarto ela havia dito quase como num sussuro que entendia que vida e morte não eram minha responsabilidade, eu não havia entendido, mas eram suas primeiras palavras depois de um dia inteiro e das belas palavras que as outras pessoas falavam sobre sua mãe.

Quando a menina viu Anie correu e a abraçou, a velha senhora a braçava como uma avó abraçaria seu neto, fez carinho na cabeça de Soffia e permitiu que ela chorasse dizendo que a garota precisaria ser forte agora.

Soffia disse a Marcos que não queria ir para casa sozinha, então o garoto avisou os pais que ficaria um tempo com ela até que melhorasse e todos voltamos pra casa.

Soffia não queria comer, ou beber, ou mesmo se levantar, na verdade, penso que ela não queria mais viver, a não ser quando Marcos estava por perto.

Por isso ela já não escutava mais a minha voz, ou fingia que não escutava, mesmo eu afirmando que estaria ali com ela não importava o que acontecesse.

Apenas o menino de cabelos amarelos conseguia fazer a menina Soffia beber ou comer algo, mesmo que ela não sorrisse mais ou demonstrasse algum traço de vida.

A luz havia deixado os olhos de Soffia, eu tinha medo de que tudo que eu um dia ouvi se tornasse realidade e o coração de Soffia se tornasse escuro para sempre, fazendo com que todos os Nephilins fossem condenados a infernus.

Quanto mais o tempo passava mais eu tinha medo, os amigos de Soffia vinham e iam embora sem uma palavra, Marcos praticamente a obrigava a comer e beber algo pra que ela não se matasse e em um daqueles dias ela atirou um copo de água contra a cabeça dele, que desviou com destreza fazendo o copo se espatifar numa parede próxima e o garoto gritar dizendo que as coisas não podiam continuar daquele jeito e que ele não conseguia ve-la se deteriorando.

Eu me sentia inútil porque mesmo com os sonhos bons que eu trasmitia para ela, a garota não levantava, não sorria e não desejava viver.

Ela só queria dormir e viver para sempre no mundo perfeito que eu estava criando e aquilo trazia algo a meu coração que eu não conseguia compreender.

Então tomei uma decisão, Soffia não teria mais sonhos bons, até que se recuperasse, ou ao menos que voltasse a gritar comigo, perguntando onde eu estaria.

...

Anjo MeuOnde histórias criam vida. Descubra agora