Cap. 6 - Parte I

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    ESTOU em uma mata sombria, com a visão embaçada, e tem um bicho dos olhos vermelhos correndo atrás de mim. Uma névoa nos rodeia, não permitindo que eu enxergue nada além de um metro a minha frente. As árvores riem da minha situação e seus galhos se entrelaçam em minhas pernas, como cobras, me fazendo cair e diminuindo cada vez mais a distância entre mim e o mostro que me persegue.

     Abro os olhos e me sinto completamente desconfortável, arfando, e suada. Não vejo nada. Meus cabelos da nuca se arrepiam e sinto vontade de chorar. Chorar muito. Pela minha mãe; pela minha avó; por Jim; pelos dois anos que joguei fora; por meu pai; por Elane; pelas pessoas que sumiram; Por Robert, Kell e Tia Jane; Por Tio Sebastian; por ser fraca; por ser medrosa; por estar sozinha; por estar prestes a ser engolida; por estar viva; por ter nascido. Por tudo. Choro. Dois dias sem chorar e já estranho essa sensação que era tão comum para mim.

   Em meio aos soluços ouço algo bufar e gemer preguiçosamente.

   Já passei medo demais esses últimos dias para ser amedrontada por bufos e gemidos, apesar de serem muito altos para meu gosto.

    Estou deitada em uma superfície lisa, dura e gelada. Nada me cobre. Estou arrepiada de frio. Me remexo chorando baixinho, lembrando de tudo o que passei.

    -- Xiiiii. -- Alguma coisa faz ao meu lado. -- Está tudo bem.

     A voz é extremamente rouca. Voz de monstro. Repasso tudo em minha cabeça, desde o momento em que estava na escola até minha captura e abafo os soluços. Talvez se me comportar ele não me coma.

    -- Vá dormir. -- Pede.

    -- Quem é você? -- Tento falar. Talvez consiga alguma informação. -- O que quer de mim?

    -- Tirarei suas dúvidas assim que amanhecer. Agora vá dormir.

   -- Não consigo. -- Digo tentando ser o mais melosa e sensível possível, quem sabe assim ele se compadeça.

   -- Tente. -- A voz monstruosa diz me fazendo travar de medo. Minha respiração fica entrecortada e não consigo me mexer.

   É o que faço. Mas mesmo assim vejo o dia amanhecer e, finalmente posso verificar com clareza onde estou, e o pior, com que ou quem estou.

    Os raios entram por um buraco iluminando o local. A primeira coisa que vejo é uma prateleira, sem nada em cima, só pó. As paredes são de pedras. O chão é de contra piso e tem um banco de madeira em um canto. Tudo sujo e empoeirado.

    A criatura ainda dorme pesadamente. Agora que consigo obcervá-lo melhor evito olhá-lo. Sinto o medo se espalhar por todas as partículas de meu corpo quando meus olhos encontram aquele ser. Ele é mais assustador do que eu pensava. Seu corpo está esparramado no chão, na posição que os animais que tem quatro patas deitam. Agora percebo sua forma. Um lobo. Se tivesse que descrevê-lo diria que é um lobo-demônio. Bem maior que um lobo de verdade, presas mais grandes, suas unhas são o dobro das unhas dos lobos normais. Suas orelhas são mais grandes e empinadas, além de mais peludas e feias, à noite, elas passam a impressão de pequenos e grossos chifres.

     O cômodo é fechado; tem como abertura apenas dois buracos na parede, um é pequeno e o outro é um pouco maior e desce até o chão. Passo uma olhada rápida no mostro e ele dorme. Considero por um momento a possibilidade de fugir. Salvaria minha pele. Mas não faço ideia de onde estou, quão longe estou de casa e, provavelmente, ficarei perdida na mata e morrerei de qualquer forma. Meu cérebro começa a listar as inúmeras formas de morrer nessa floresta. Qual é melhor: ser devorada por um demônio estranho e maníaco, ou morrer sozinha em uma mata que dizem ser amaldiçoada? O final é o mesmo. Choro. Outra vez. E me sinto fraca por isso.

O Lobo e Eu (EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora