Cap. 6 - Parte II

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   O BICHO está apoiado nas patas traseiras e traz algumas coisas no colo. Ele vai até o centro e coloca o que traz sobre a mesa. Eu observo tudo em silêncio ouvindo as unhas dele baterem no chão a cada passo que dá.

   -- Sirva-se. -- Ele diz. -- É o que achei. coletarei mais frutos, mais tarde. -- Eu não me mexo e ele percebe. -- Venha. -- Ele me estende a pata crescida e feia em um gesto inofensivo. Mesmo morrendo de medo, acho graça em sua tentativa de me passar confiança.

   Vou em direção a mesa dando passos lentos sem tirar os olhos dele, que me observa calmo. Ele puxa uma cadeira. Olho para aquele rosto monstruoso e não consigo decifrar suas emoções: Talvez ele queira mesmo, me fazer sentir-me bem, me passar confiança. Mas, quem sabe, ele só esteja me entretendo para dar o golpe quando menos espero, e ser mais divertido. Acredito mais na segunda, afinal  para que outro motivo ele ia querer me alimentar? Fico parada indecisa se vou ou não até ele.

   -- Eu não vou machuca-la.

   -- Me dê, ao menos um motivos para acreditar em você. -- Digo e por incrível que pareça minha voz sai firme, porém  não estou nada confiante, minhas pernas faltam pouco despencar.

   -- Responderei suas perguntas.

   -- Então o que quer de mim? -- minha voz é de súplicas.

   Ele não diz nada, e mesmo necessitando dessa resposta mais que tudo, no momento, agradeço-o mentalmente por poupar-me a agonia que sua voz me causa.

   Desvio os olhos do monstrengo e verifico o que ele trouxe. Castanhas. Meu estômago está vazio. Puxo a cadeira oposta a dele e me sento, deixando-o parado segurando a cadeira vazia. Estou tremendo e espero que ele não perceba.

   Pego uma castanha e tento quebra-la batendo na mesa mas não consigo. Ele me observa com aqueles terríveis olhos cor de sangue. Olho ao meu redor e não vejo nada com que quebrar aquela casca grossa.

   Ele solta ma risada demoníaca e sombatória e, simplesmente, por onde acabou de aparecer, sai me deixando sozinha, com fome e sem conseguir comer. Vou ter que dar um jeito nele, ou terei que me aventurar na floresta, se não quiser continuar sendo marionete deste monstro, que, ainda não acredito que existe e o pior, está comigo.

   Desisto das castanhas e volto a observar os quadros. Procuro assinaturas mas não encontro nenhuma. Em nenhum deles.

     Sem nada para fazer, tento mais uma vez comer os frutos, e não consigo, então deixo-os onde estavam e volto a observar os quadros. O Sol já está alto e começo a sentir calor, então tiro a jaqueta que Jim me deu e vou até a escrivaninha de madeira velha e empoeirada. Sobre ela, um tinteiro descansa, a muito sem ser usado, assim como um livro grosso e antigo. Há vários papéis empilhados ao lado do livro e estão muito amarelados. Nada escapa do poder corrosivo do tempo. Pego alguns e trago a altura dos olhos para tentar ler o que está escrito. Sopro a poeira e aperto os olhos, mas o amarelado parece ter se fundido com o preto da tinta.

    Vou até a porta e não consigo deixar de apreciar um feixe de luz do sol que me atinge. Observo a mata e fico maravilhada com sua beleza. Volto a atenção aos papeis.

    "Anjo meu.
  Sinto não poder contar-te o que tanto me incomoda e o que aquela porta esconde. Peço-lhe que me perdoe, pois estou a amar-te muito.
    Seu K."

O Lobo e Eu (EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora