A TEORIA DO RETORNO

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Vocês já ouviram falar da "teoria do retorno"? Não, não é "lei do retorno", é "teoria do retorno". Ela diz basicamente que no período de um ano, há um intervalo entre dois semestres, e ao retornar desse intervalo para "entrar de cabeça" no segundo semestre, as coisas podem ser piores do que o primeiro. Ainda não pegou a referência? Estou falando do período escolar. E o intervalo são as férias... Eu acho que vocês já entenderam. O porquê de eu estar explicando isso? Bom, vocês vão descobrir.

♣️

Passou um tempo e as férias se acabaram. Tudo voltou a ser como era antes, ou pelo menos eu achava isso.

No meu colégio, havia algo chamado "aula coletiva", que eram basicamente 3 ou dois alunos, um sentado do lado do outro prestando a atenção na aula. Essas coisas, segundo o diretor da escola, era para ensinar as pessoas a trabalharem em grupo... E eu sempre sentei junto a Martins e Xê, desde que as aulas começaram, porque, afinal, eles sempre foram meus melhores amigos. Só que daquela vez, Xê não estava conosco, e sim com Luma, e seu lugar foi ocupado por Alma, e eu me senti como um "intermediário", já que eu estava no meio de Martins e Alma, isso me transformava em uma "ponte" que havia entre eles. 

Enquanto o professor explicava a matéria, Alma parecia meio pensativa, com a mão sob o queixo, e eu não estava me importando muito com aquilo, até que ela me cutucou.

- Abrahão...

- Oi... - falei da forma mais discreta possível, já que estávamos sentados bem na fileira da frente e se o professor percebesse a nossa interação, iríamos levar uma baita bronca.

- Vamos na estação de trem hoje?

Percebi que Martins deu uma leve olhada para ela.

- Sim - respondi. - Vamos sim?

♥️

- Vocês gostam muito daqui, não é? - perguntou Alma apoiada na grade da estação, que estava ali para impedir com que algum idiota caísse dali e esborrachasse a cara no trilho.

- É... Nós gostávamos - disse eu olhando para baixo.

A um tempo atrás, eu estava exatamente naquele lugar, na mesma posição, e eu vi Alma passando com Danilo ali e eu a olhei, e a única coisa em que pensei, foi que eu gostaria que ela tivesse do meu lado e não do dele, e quem diria que ela estaria. Ficamos ali em silêncio e eu pensei: Puxa alguma conversa, seu idiota... Você tem a chance de estar do lado de Alma e não faz nada! Então, quando fui abrir a boca, ela abriu antes.

- E então, você nasceu no Rio mesmo?

- Sim - respondi.

- Então, me conte a sua história.

- Como assim? 

- Sua história de vida. O que você passou para chegar até aqui. 

- Para quê isso?

Ela sorriu e respondeu:

- Deixe de ser chato e conte logo.

- Meu nome é Abrahão Herrera Silva, sou...

E comecei a contar coisas sobre mim, falei sobre Nicole, Becca e Ana, sobre fatos da minha infância, que eu amava arte, odiava ficção adolescente... E essas merdas...

- E então - disse eu -, me conte a sua história.

- Você não quer ouvir - disse ela.

Fiz uma expressão facial de indignado e falei:

- Poxa, te contei a minha, agora retribua.

Ela ficou séria, olhou para baixo e disse:

- Tudo bem, eu te conto, e o que for falado aqui, morre aqui.

- Prometo.

Eu não estava acreditando no que eu estava ouvindo. A história dela era de fato assustadora, pesada, deprimente... E foi uma das poucas vezes na minha vida que eu me senti realmente abalado por estar ouvindo uma história. Ela era abusada pelo pai quando era bem pequena, a mãe descobriu e se separou dele, depois disso, se casou com um cara, e se mudou com ele para o Rio de Janeiro para fugir do homem. O padrasto de Becca era super protetor e amava a enteada. Ela, numa noite, foi estuprada por alunos da escola onde ela estudava, o que fez ela sair da escola em que estava, para naquele dia... Estar ali... Do meu lado.

- Seu padrasto estar me olhando daquele jeito no carro, tem algo a ver com essa história?

Balançou a cabeça como sinal de positivo.

- Ele não confia mais em garotos - respondeu. - Tive que insistir muito para ele permitir com que eu saísse com você - disse.

- E isso também tem a ver com o fato de você não se misturar muito com os outros?

Sorriu de forma triste e disse:

- Você está entendendo.

Vai seu imbecil, diz logo para ela! Minha mente gritava. Ela estava olhando para baixo triste, com certeza chateada por aquelas lembranças terem vindo à tona. Então, me aproximei dela. Aproximei mais o meu rosto... Aproximei minha boca dela... Ela me olhou de forma bela, e eu olhei de volta, nos aproximamos mais ainda... Até que... Nos abraçamos! Depois que eu fiz isso, fui pensar, mas que merda! E então Danilo passou, para pegar o trem, me olhando com uma cara bem feia, e eu rebati o olhar.


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