Ship of Dreams (Parte 2)

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              As duas passagens permaneciam sobre a mesa e Sebastian as encarou, culpando-se mortalmente por tê-las apostado. Foi, com toda a certeza, a decisão mais estúpida que já tomou e jamais se perdoaria. Ele realmente sabia que se perdessem, perderiam todas as moedas, os itens e o sonho de embarcar no Navio dos Sonhos, e este pensamento lhe atormentava mais do que as palavras rudes de Edan. Respirou fundo. Sentindo os olhares sobre si, percebeu que era a sua vez, mas estava inseguro e temeroso demais, por isso demorou alguns segundos. Mas, por fim, ergueu os olhos, cravando-os firmemente em Lexa e, relutantemente, colocou as cartas na mesa.

— Hm... Dois pares. — Lexa repetiu, avaliando o jogo exposto. Mordeu os lábios e divagou o olhar pelos dois latinos até pousar em Anya. Sentou-se de lado na cadeira para encará-la melhor e forçou a decepção e a lástima na voz. — Eu realmente sinto muito.

          Walsh arregalou os olhos diante daquelas palavras, incrédula. Sabia o que significavam. Por mais que já estivesse esperando a derrota, ouvir que perderam era a última coisa que gostaria de escutar. De repente, ficou extremamente furiosa e fez questão de cuspir toda a sua frustração e raiva. Iria acabar com a raça da mais nova ali mesmo.

— Sente? Que sente o quê, Lexa. Vá se danar! Eu disse para não apost... — esbravejou, em disparada, mas antes que pudesse terminar de dizer tudo aquilo que pretendia, fora interrompida pela voz repleta de animação de Fairchild, que se sobrepôs a sua.

— Eu realmente lamento que tenhamos que dizer adeus à Europa, minha amiga, porque vamos para a América! — Lexa exclamou alto as últimas palavras, comemorando a sua vitória. — Full House, baby!

           Ao jogar as suas cartas na mesa, imediatamente levantou-se da cadeira quando viu que Anya já estava de pé e a abraçou fortemente, acomodando-se no calor daquele abraço fraternal. As duas sorriam de orelha a orelha e a felicidade repentina contagiou todos aqueles que presenciavam a cena, exceto os dois latinos, os quais eram os únicos que não comemoravam.

— Vamos para a América! Meu Deus, eu não acredito. — dizia Anya. Qualquer vestígio de ira virou pó depois da revelação do jogo e Walsh festejava, esquecendo que há poucos estava quase esganando Lexa. — Vamos para a América! Indra vai nos matar, garota. — ela ria. 

— Com certeza ela vai.

— Vamos para casa! Meu Deus! Eu já disse que eu te amo hoje? — Anya questionou com um sorriso despretensioso nos lábios assim que tomaram distância e beijou algumas vezes a bochecha da mais nova, ao passo que segurava o rosto dela com ambas as mãos.

— Bom, se "eu te amo" para você é sinônimo de "sua pirralha, eu disse para não apostar tudo!", "eu juro que vou arrancar a sua cabeça fora", "eu te faço comer poeira se ficarmos sem grana" ou "se você perder tudo, juro que a sua luta nesta terra acabará no mesmo instante", então, sim, você já disse. Muitas vezes, por sinal. — Lexa alfinetou, erguendo uma sobrancelha e esboçou um sorriso de canto zombeteiro. Anya tinha uma resposta na ponta da língua, mas estava animada demais para sequer se importar com tal provocação.

                Para poupar tempo, Fairchild se afastou da amiga e foi recolher os itens que ganhara no jogo, pois Walsh já estava com as passagens em mãos. Ela juntou tudo num montinho e os deslizou até a beirada da mesa, mas antes que pudesse colocar tudo dentro de sua mochila, foi interrompida por um Edan furioso que agarrou o seu colarinho bruscamente e fechou a mão livre num punho, pronto para acertar o lindo rosto dela com um soco certeiro. Lexa fechou os olhos com força, esperando pela pancada que tinha quase certeza que deixaria uma grande marca, mas o golpe não veio, para a sua sorte. Ao invés disso, o latino revoltado descontou a sua ira em Sebastian, homem este que, ao ser golpeado, tombou para trás. Ela não conteve a risada, tampouco os outros em volta, mas não deixou de se imaginar no lugar do cara agora gemendo de dor no chão. Terminou de guardar todas as coisas e voltou a sua atenção à Anya, que beijava as passagens.

— Nós vamos para a América! — repetia, extremamente feliz. Seu sorriso era enorme, assim como o de Lexa, cujos olhos verdes brilhavam mais do que qualquer estrela. — Vamos para a América!

— Não, não. Quem vai para a América é o Titanic, minhas caras, dentro de apenas 5 minutos. — informou o senhor dono do bar, apontando para o relógio pregado na parede atrás de si. 5 minutos para 12h00, elas constataram. — É melhor se apressarem.

              Numa troca rápida de olhares, entenderam que era hora de partir. Anya buscou a sua mochila ao pé da cadeira que antes estava sentada e Lexa colocou a sua nas costas, puxando a mais velha pelo braço quando saíam do bar em disparada. Correram apressadamente pela considerável extensão que separava o bar do Titanic e adentraram à multidão, desviando com destreza dos objetos e pessoas, vez ou outra esbarrando em alguém. Lexa corria na frente e toda hora olhava por cima de seu ombro para ver se sua amiga ainda permanecia em seu encalço. Ambos os cabelos lisos esvoaçavam com o vento e Anya acabou perdendo a boina que soltou de sua cabeça enquanto corria, mas não se preocupou em voltar para pegar, deixando-o como uma lembrança de que um dia esteve ali.

— Achei que fosse mais rápida que isso, Walshzinha. — Lexa zombava da amiga sem diminuir o ritmo dos seus pés, que moviam-se velozes contra o chão. Ela ria.

— Espera até eu te alcançar, pirralha. — a resposta foi devolvida no mesmo tom de deboche, logo após desviar com agilidade de um homem que surgiu do nada em sua frente.

                Subiram pela ponte que levava do porto ao navio e gritaram para que o comissário responsável pela entrada esperasse. Foram abordadas por ele, mas não tardou para que suas entradas fossem permitidas. Assim, o homem fechou de uma vez a porta de aço, vedando, por fim, aquela área do navio. Elas correram pelos corredores da 3ª classe com pressa, rindo e provocando uma a outra.

— Somos as filhas da mãe de mais sorte no mundo. — disse Lexa, a animação que sentia era visível. — Eu te disse para ter um pouco mais de fé. 

             Perdidas no labirinto que eram os corredores, finalmente conseguiram chegar a tempo nas amuradas da popa do navio para dar um último adeus àqueles que ficaram em terra firme. Acenavam com entusiasmo e diziam que sentiriam saudades, embora não conhecessem ninguém. Sorriam largamente. E foi assim que, soltando as amarras, o arquitetônico navio deixou vagarosamente o cais nº 44 do porto de Southampton, levando consigo pessoas de quarenta nacionalidades diferentes, mas com sonhos quase semelhantes. Aquela quarta-feira de céu aberto seria para sempre lembrada como sendo "O dia em que o imponente navio Titanic zarpou em sua viagem inaugural".

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