Ship of Dreams (Parte 1)

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                     Porto de Southampton, Inglaterra – 10 de Abril de 1912. Quarta-feira.

         Com a notícia de que o Titanic zarparia rumo à América naquela manhã de quarta-feira em sua viagem inaugural, o porto de Southampton tornou-se pequeno diante daquela euforia demasiada da multidão que contemplava a luxúria e estrutura monumental do "Navio dos Sonhos" — como assim tinha sido apelidado por muitos — atracado no cais há alguns dias. Tratava-se de uma obra-prima magnífica feita pela mão do homem, sendo esta dona de uma beleza incapaz de ser descrita em palavras. Apreciar valia muito mais a pena e era justamente o que todos faziam.

        Conforme os minutos passavam, as pessoas iam pouco a pouco embarcando, cada classe social entrando no navio por sua respectiva passarela e somente os da 3ª classe precisavam passar pela fila de inspeção. Outros, aqueles que já estavam dentro do transatlântico, acenavam para os que deixariam para trás, saudosos. Entretanto, aquele "adeus" que diziam significava, na verdade, um "nos encontraremos novamente". Tinham esperanças e esperança era a única coisa que todos eles tinham em comum. Qualquer insegurança, aflição ou medo que guardavam desapareceu no momento em que pisaram no Titanic, dando lugar a certeza de que os seus sonhos brevemente se tornariam realidade.

         John Jacob Astor IV, o homem mais rico a bordo do navio, e sua esposa Madeleine Astor embarcaram meia hora antes da buzina melódica de um carro ser ouvida, indicando a chegada de alguém, de forma que abriu caminho entre a multidão. Era um Abadal vermelho seguido por dois Renault 1912 clássicos e demasiado luxuosos pertencentes ao ricaço Finn Collins. Dentro de dois destes estavam Clarke, a noiva; Abby, a sogra; e Zoe e Karl, dois dos criados particulares, mas o último era muito além de só criado, era também braço direito do empresário. Os três veículos pararam numa posição triangular e o motorista do carro da frente desceu para abrir a porta para as damas. Clarke estendeu delicadamente a mão e o homem a segurou, ajudando-a a descer do veículo. Logo em seguida, desceu Abby após Finn, e foi ele quem fez às honras.

– Então este é o navio que não naufraga? – a senhora Griffin questionou, com um sorriso maravilhado no rosto. Ela observava analiticamente cada detalhe, como sempre fazia com tudo e todos, mas desta vez não procurava por defeitos, estava satisfeita com a imagem do imponente navio.

– Sim, ele realmente não afunda. – Collins assegurou, gesticulando ligeiramente para o Titanic. – Nem Deus conseguiria afundá-lo.

          Clarke, por sua vez, não via nada de mais no transatlântico que conseguiu reunir uma aglomeração de pessoas no porto e, francamente, não compreendia tal animação. Era um navio de estrutura grandiosa como um outro qualquer, em sua perspectiva. Nada além disso. E embarcar em direção aos Estados Unidos era a última coisa que desejava para a sua vida. Sentia como se estivesse acorrentada, pagando por algum castigo e não pudesse se libertar das correntes de maneira alguma. Queria gritar até a sua garganta sangrar, arrancar os próprios cabelos e denunciar em atitudes alarmantes a sua frustração, mas preferiu manter a compostura, fina e educada, como uma boa moça deveria ser. Abby comumente cobrava tal comportamento e a censurava com um simples olhar quando a jovem quebrava alguma regra ou cometia algum erro. Era rigorosa demais, mas dizia que era para o próprio bem da filha, assim como quando a forçou a noivar de Finn, homem muito mais velho, para que a família Hussain-Lloyd Griffin mantivesse o bom nome, já que estava praticamente falida. Clarke jamais entenderia o jeito de sua mãe de querer o seu bem, disso tinha certeza.

          A belíssima jovem de apenas 17 anos vestia um terninho branco com detalhes em roxo justo ao corpo, bastante comportado, com a saia cobrindo completamente as suas pernas e uma gravatinha preta por dentro do blazer com um broche discreto. Usava luvas brancas em ambas as mãos e um chapéu arredondado roxo com abas longas, onde tinha como adorno um laço enorme de cetim estampado. Clarke estava estonteantemente deslumbrante, ninguém poderia negar. Sua roupa impecável exaltava a sua fineza e, sobretudo, a sua beleza incomparável.

— É melhor nos apressarmos. — Finn sugeriu após checar o relógio de bolso. Segurava uma bengala em uma das mãos e usava um chapéu de caixa longa na cabeça, adereço que combinava com o terno preto elegante. — Karl, cuide das bagagens. Estamos indo. — ao escutar a ordem, o homem assentiu prontamente e não tardou a ir verificar as malas.

              Assim, Collins ofereceu o braço direito à noiva, que o segurou, e juntos seguiram pela passarela que levava ao saguão da primeira classe, onde Abby informou os nomes ao comissário de bordo encarregado de vigiar a entrada da elite. Zoe vinha atrás dos três. Em seguida, rumaram em direção às suítes 52, 54 e 56, lugares em que ficariam hospedados.

             Enquanto isso, há alguns metros dali, num bar um pouco afastado do cais, Lexa Fairchild e Anya Walsh jogavam Poker contra dois homens latinos. Um deles, Sebastian, apostou duas passagens de 3ª classe para a primeira viagem do transatlântico Titanic, atitude impensada esta que enfureceu o seu amigo, Edan, que o amaldiçoava a cada segundo com palavras que as duas jovens garotas não eram capazes de compreender, pois eram pronunciadas em um carregado espanhol. Sendo assim, ambas mantiveram suas atenções apenas no jogo.

           Lexa mordia a extremidade do cigarro entre seus dentes e batia em constância os pés por baixo da mesa, ansiosa. Estava concentrada nas cartas que segurava em uma das mãos, mas, vez ou outra, seus olhos, levemente semicerrados, estudavam os movimentos e jogadas dos seus dois adversários. Edan, com uma carranca enorme no rosto, estava sentado a sua frente, de costas para a grande janela de vidro que exibia a imagem do imponente navio atracado no porto ao longe. Sebastian estava a sua direita, bastante apreensivo, por sinal.

— Lexa, se a gente perder, eu juro por Deus que arranco a sua cabeça fora. — pouco feliz com a situação, Anya tentou intimidar a mais nova enquanto pegava irritada uma carta no montinho. — Você apostou tudo o que tínhamos!

            Lexa direcionou sua atenção à loira frustrada ao seu lado e esboçou um sorriso, achando graça daquela ameaça vã:

— Quando não se tem nada, não se perde nada. Essa é a verdade. — replicou e ofereceu uma piscadela à amiga, que bufou em resposta. Logo em seguida, colocou o cigarro que pendia em seus lábios dentro do cinzeiro sobre a mesa e deu um rápido gole em sua cerveja. — Tenha um pouco mais de fé.

           E Anya tinha. Entretanto, não era tão otimista quanto a outra, era realista, e sabia que perderiam. O jogo em suas mãos estava péssimo e, certamente, o de Lexa também estaria. Mas ainda tinha esperanças, mesmo que mínimas e quase imperceptíveis, pois era o que restava. Suor emergia em sua testa e ela mordia o interior das bochechas com certa apreensão. Por um instante, seu olhar direcionou-se à Lexa, que encarava analiticamente o próprio jogo. A garota era uma boa jogadora, tinha que confessar, e habilidosa, ainda que tenham sido raras as vezes que conseguira vitória em alguma aposta.

— Ok, pessoal, hora da verdade. — Fairchild anunciou, atraindo a atenção de todos sentados em torno da mesa. Sua voz era surpreendentemente pacífica. Ela respirou fundo, juntando as cartas na mão em uma só fila. — Anya? — chamou pela mais velha, decidindo começar por ela, já que esta estava demasiadamente impaciente. Assim, logo que revelou as cartas, Anya jogou as costas com vontade no encosto da cadeira, derrotada, e cruzou os braços. Nada. Não conseguiu nada. Lexa remexeu a boca, batucando os dedos na mesa, e fitou o homem defronte de si. — Edan? — o rapaz estava nitidamente decepcionado. Seus olhos claros, uma bagunça de emoções, encararam as orbes verdes de Lexa antes de expôr o próprio jogo. Nada também. Ele não conseguiu acumular ponto algum. Lexa assentiu, seu coração começando a bater depressa contra a sua caixa torácica. Talvez tivessem uma chance de ganhar. Talvez não. Anya endireitou a postura quando viu o jogo do latino e estudou a reação da morena diante daquilo. Não sabia o que dizer. Até aquele momento, tudo empatado. 







Então, o que estão achando da estória? Devo continuar? 

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