Bitanic

Women and Children first

                   Com a certeza do inimaginável, os 20 botes começaram a ser preparados para a evacuação do navio, que exigia rapidez e agilidade. Havia quase 2200 pessoas a bordo e a insuficiência de botes condenaria a grande metade, já que a impossibilidade de salvar a todos era evidente e este fato era o que mais assombrava os tripulantes, principalmente o capitão Smith, cujo rosto lívido denunciava explicitamente a gravidade do problema.

                  Os comissários de bordo foram encarregados de avisarem, de porta em porta, todos os passageiros da primeira, segunda e terceira classes a seguirem em direção ao convés dos botes com coletes salva-vidas. Este trabalho cansativo e demorado tornou-se necessário porque não existiam alarmes nem tampouco alto-falantes nos corredores, o que tornava a comunicação complicada. Ademais, para piorar, a maior parte dos passageiros dormia àquela hora. Entretanto, mesmo com toda a dificuldade, os membros da primeira e segunda classes foram instruídos pacientemente a colocarem os coletes e foram tratados, é claro, com toda a cordialidade e educação. Em contrapartida, essa polidez toda se extinguiu quando o cenário se voltou à terceira classe, que, ao invés da gentileza, foram acordados com berros e tratados como uns quaisquer.

                  A completa incompreensão dos passageiros a respeito do que acontecia dificultou o desocupar das cabines, pois muitos deles não estavam felizes com a ideia de deixar os próprios quartos. O processo foi bastante vagaroso. Do lado de fora, a noite sem luar estava terrivelmente fria e as 3 das 4 gigantescas chaminés — a quarta chaminé funcionava apenas como ventilação, ao contrário das outras, que eram funcionais — cuspiam fumaça com um barulho ensurdecedor. Isso acontecia devido à ordem dada de colocarem-nas para expelir sob pressão todo o vapor com a finalidade de evitar uma explosão quando a água gelada do oceano entrasse em contato com as caldeiras. À vista disso, os passageiros optaram por ficar do lado de dentro do navio, longe do barulho, enquanto a preparação de todos os botes estava quase sendo finalizada. O retardar da evacuação só contribuiu para a perca ainda mais de tempo.

                  Enquanto isso, o Capitão Smith tomou as devidas providências e direcionou-se à sala dos telégrafos, onde encontravam-se os dois operadores de rádio: Jack Philips e Harold Bride. Disse a eles a posição que o Titanic se encontrava naquele momento e pediu que enviassem um CQD, ou seja, um pedido de socorro seguido do código de identificação da chamada do Titanic: MGY. Os dois apressaram-se em tentar contatar algum navio que estivesse próximo.

                 Esta busca, porém, não obteve muito êxito. Entrar em contato com as outras embarcações estava sendo difícil. Conseguiram o Californian, todavia ele estava com alguns problemas e o Olympic encontrava-se longe demais, tal como o Carpathia, mas este apresentou uma melhor resposta. Estava localizado a cerca de 100km de distância e, ao atender o pedido de socorro, imediatamente acelerou sua velocidade a 17 nós e passou a seguir de encontro ao Titanic a todo vapor. Previa-se que chegaria dentro de aproximadamente 4 horas.

                 Ainda na sala de telégrafos, o capitão Smith, ao compreender a posição exata do Carpathia e o tempo que ele levaria para chegar, simplesmente abandonou o cômodo sem dizer uma única palavra. Só podia ser um pesadelo! 4 horas era muito tempo e tempo era algo que o Titanic infelizmente não tinha.

               No convés mais inferior do navio, bem depois da passagem da tripulação, Lexa encontrava-se dentro de uma sala com os pulsos algemados ao cano de ferro por onde passava a ventilação. O segurança responsável por vigiá-la a deixou ali sozinha quando soube que o Titanic tinha poucas horas de vida, porque estava naufragando. Pelo olho de boi na parede ao lado esquerdo de onde estava, conseguia ver que o nível da água do oceano subia gradativamente. A parte da frente do Titanic estava sendo inundada em constância por causa do fluxo intenso da água, a qual aos poucos alcançava os outros níveis do navio.