Um

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—Toma cuidado com as pessoas de lá e principalmente não aceite coisas de estranhos. —Minha irmã disse, me soltando de um abraço de urso.

—E tenta não odiar o Gabriel, é lá o único lugar que você pode ficar... Não quero que ele te expulse ou algo assim. —Mamãe completou, enxugando os olhos com seu lenço de papel, agora todo amassado -Não deixa de ligar também, filha. Não gosto da ideia de te ver longe de mim.

—Não se preocupem, vou ligar sempre que puder e também tem os feriados prolongados. Não vamos ficar muito tempo sem nos ver. E sobre o Gabriel... Talvez eu o sufoque com o travesseiro enquanto ele dorme. —Sorri para elas e recebi um olhar desconfiado de mamãe —Só estou brincando.

Com a carta de aceitação e um telefonema empolgado para meu pai, descobri que Gabriel tinha uma casa em Cambridge, perto da universidade. Meu pai então, deu a ideia de que eu não precisaria gastar dinheiro com apartamentos ou quitinetes, era só um irmão fazendo um favor para o outro.

A ideia era péssima. Eu e Gabriel nos odiávamos desde a primeira vez que eu e Daphne jantamos em sua casa, no feriado da ação de graças, quando eu tinha meus dez anos e Gabriel catorze. Ele me atirou frango no cabelo e, como vingança, eu coloquei pequenos pedaços de amendoim em seu bolo de aniversário, o que resultou em Gabriel ficar internado por três dias no hospital por causa de sua grave alergia. Desde então, somos como cão e gato e eu não sei como morar em baixo do mesmo teto que ele, principalmente sozinhos, poderia dar certo.

Mas eu também não queria que minha mãe gastasse suas economias comigo. Eu só precisava ir para Cambridge e arrumar um emprego para poder me manter bem lá.

—Pega aqui, Lou. —Minha irmã me entregou um pacote fechado —Não gaste tudo de uma vez, apenas se for necessário.

—Eu tenho algum dinheiro comigo, Daphne. Não precisa...

—Esse dinheiro não vai fazer falta. Apenas pegue. —Insistiu.

—Tudo bem —Eu disse, guardando o pacote na bolsa —Agora eu preciso ir, ou vou perder o vôo.

Nós três nos abraçamos novamente e, enquanto eu caminhava para longe, tentava não deixar o medo de estar sozinha tomar conta de mim. Era a primeira vez em dezoito anos que eu iria estar sem mamãe ou Daphne por perto e isso me causava um pânico enorme.

(...)

Depois de muito tempo, finalmente cheguei no aeroporto de Cambridge, na Inglaterra. Peguei um Uber que me levou até o endereço que meu pai me passou, e então parei em frente ao pequeno apartamento recém pintado que eu havia visto em uma foto que meu pai mandou no WhatsApp.

Ele tinha seis andares e várias janelas de vidro fumê, com uma entrada um pouco estreita e nenhuma alma generosa para me ajudar com as malas. Fiquei durante minutos apertando o botão redondo do número trinta e dois, que ficava no quarto andar e que era a casa de Gabriel. Só depois de um tempo ele abriu o portão e nem se preocupou em me ajudar com as malas.

Com dificuldade, cheguei no quarto andar e bati na porta uma, duas e três vezes. Aquele idiota devia estar zoando com a minha cara. Depois de respirar fundo e de xinga-lo várias vezes mentalmente, a porta se abriu e dei de cara com uma mulher um pouco velha. Talvez uns trinta e poucos anos... Ela tinha cabelos curtos e escuros, olhos castanhos e a boca cheia e vermelha. Não deixei de notar um piercing no canto da boca. Apesar de aparentar ser mais velha, era incrivelmente bonita e alta e, apesar do frio, usava uma micro-saia. A mulher me olhou de baixo a cima e sorriu, passando por mim e deixando a porta aberta.

Revirei os olhos e empurrei as malas para dentro. Eu queria tomar um banho quente e uma bela xícara de café, pois o frio em Cambridge estava demais.

Atração sem LimitesOnde histórias criam vida. Descubra agora