Respirou com cuidado enquanto se acomodava da melhor forma possível. Já era de manhã e o vento fresco passava pela porta de vidro mal fechada, esvoaçando as cortinas cor champanhe que não cumpriam seu propósito em deter a luz matinal. Mas não se importava com a luminosidade, já estava acordado a tempos, apenas velando o sono daquele anjo que ressonava tranquilo sobre seu peito. Sim, essa era a denominação perfeita para descrevê-lo; anjo. E toda aquela cena parecia ser tirada de um conto de fadas, de um livro sobre seres fantásticos, algo como um fragmento do paraíso em terra. Sorriu com o pensamento.
Acariciava as costas dele, girando os dedos pela pele quente e macia coberta pelo fino lençol branco com flores cinzentas. Todo o ambiente parecia colaborar com aquele clima angelical, até mesmo como a luz se refletia nos móveis claros e se direcionam para eles, o baixo som das cortinas se movendo com o sabor da brisa matinal. Tudo era puro, trazendo uma paz inigualável ao quarto. O corpo de Yuuri estava encaixado a si, ao seu lado esquerdo com uma perna entrelaçada a seu corpo, a cabeça repousando sobre seu peito e um braço o rodeava, como se mesmo inconsciente quisesse o manter ali. Como se tivesse medo que ele fugisse dali. Mas não iria a lugar nenhum. O rosto estava sereno, as bochechas rosadas e pareciam um pouco gordinhas tão de perto e os cílios longos faziam uma leve sombra, tudo passava uma sensação de delicadeza, de inocência.
Se arrumou melhor sobre os travesseiros, sentindo a bochecha alheia se pressionar mais contra seu peito. O sono dele era pesado e ele se ajeitava bastante durante a madrugada, mas não chegava a ser desconfortável para Victor, era até divertido _ tirando o fato de ter acordado com um tapa em seu nariz, aquilo doeu. Suspirou, olhando o teto pintado em um tom pastel, pensando no que faria dali por diante. Teria que conversar com sua mãe, ela entre todos era a que mais queria um neto o mais cedo possível, e com seus avós paternos, que queriam ver a herança de seu filho dar frutos _ por que para eles, vindos de uma família firmemente tradicional, até mesmo a fato de seu filho ter se casado com uma beta bailarina e seu neto ter se tornado um ator era um ultraje ao seu sangue. E agora a situação com certeza iria piorar para seu lado, se eles descobrirem que o ômega que escolheu como parceiro não poderia gerar uma cria, não queria imaginar o tamanho do peso que cairia sobre Yuuri e ele. Era muita coisa para considerar ao mesmo tempo.
Suspirou profundamente, tentaria entrar em um consenso com seus problemas e suas tendências pessimistas depois. Queria apenas curtir o momento. Mas era uma pena que o destino não colabora com nenhum pecador. A porta foi aberta por um moreno que olhava o celular distraído e que franziu o nariz assim que adentrou o cômodo, o cheiro de sexo ainda estava presente no quarto, fraco e quase imperceptível, mas o faro de Otabeck sempre foi muito apurado. Os olhos negros miraram a cama e o rosto se franziu em descontentamento e desconforto. Obviamente sabia o que tinha ocorrido ali, e isso não o agradava. Victor o encarou, sem saber o que fazer ou como agir perante aquela situação constrangedora a que se encontrava.
– bom dia– foi a única coisa que saiu de seus lábios. O moreno apenas soltou o ar que estava preso em seus pulmões, passando o peso para apenas uma perna e apertou a ponte do nariz com dois dedos, tentando encontrar um ponto de equilíbrio para seus pensamentos, já não bastavam as confusões do dia anterior, agora isso!
–acorde ele, o café já está posto e ele tem compromissos mais tarde.– falou simplesmente, dando a volta por cima de seus passos anteriores e fechando a porta em seguida. Na cama, Victor ficou olhando sem entender, até que a fixa caiu. Ele estava na cama, nu e com o irmão dele igualmente nu o abraçando, e para piorar o cheiro mais que denunciava tudo o que ocorreu na noite anterior. Estava mais do que encrencado nas mãos de seu cunhado, assim pensava. Então, o melhor a se fazer era o que tinha sido dito; acordar o ômega.
– Yuuri– alongou o ‘u’ do nome, gostava da sonoridade quando o fazia, enquanto cutucava de leve a bochecha cheiinha na tentativa de acordá-lo. Mas ele apenas resmungou alguma coisa e se virou na cama, o largando e se enroscando no lançou como uma criança pirracenta. Riu – acorda belo adormecido– o abraçou por traz e começou a roçar o nariz por seu pescoço, provocando cócegas e tirando uma risada espontânea do outro– parece que eu consegui!– comemorou.
–sim...conseguiu– resmungou o moreno asiático, se virando de frente para o outro, e com certa preguiça, brincou– mas não é assim que a princesa desperta, não é?
–Claro majestade, o farei, corretamente, com todo prazer –um seus lábios num beijo calmo, uma saudação de bom dia carinhosa. Pareciam um casal.
***
Pesado.
Essa palavra definia perfeitamente o clima que pairava pela mesa de café da manhã já posta e muito bem distribuída. Parecia que uma nuvem carregada passeava por ali. Tinha apenas quatro pessoas sentadas à mesa, comendo num silêncio que parecia não ter fim, dois morenos e dois russos. O russo loiro parecia não estar ali, suspirava enquanto rolava um pedaço de tamagoyaki pelo prato com os hashi, sem fome e com aparência de quem não pregou os olhos durante uma madrugada inteira.
Yuuri parecia alheio ao clima tenso enquanto conversava por mensagem com alguém pelo celular e comia as cegas o que estava em seu prato, não parecia tenso e nem preocupado com o olhar quase assassino que Otabeck lançava para Victor. Já o platinada, tentava se concentrar em sua comida _ que por sinal estava muito gostosa _ e a parede atrás da cadeira vazia a sua frente nunca fora tão interessante como naquele momento. Sentia o olhar negro queimar sua pele e sabia que tinha que resolver algumas coisas com o outro alfa _ inclusive tentar entender o porque de tanta raiva, não parecia vir apenas da cena de mais cedo no quarto do ômega.
– Otabeck, poderia controlar seu cheiro. Está sufocante– Yuuri reclamou, finalmente guardando o celular e prestando atenção ao redor. Ele não estava tenso, mas também não parecia relaxado – Minako pediu para informar que as gravações de hoje foram canceladas. Parece que tiveram problemas na rede elétrica do estúdio, provavelmente algum roedor danificou algum cabo e, com a chuva de ontem, um curto-circuito queimou alguns dos aparelhos de filmagem.– suspirou dando de ombros, parecia cansado– disseram que nossa folga começa hoje.
– ela me ligou mais cedo e informou a mesma coisa. Mas não parece ser nada muito sério.– o Altin se pronunciou, com o tom usual, após parar de emitir tantos feromônios.– mas isso não significa que você está de folga, ainda tem uma pilha de documentos esperando sua análise e assinatura em seu escritório– o mais novo engoliu a seco– eu tenho feito boa parte de seu trabalho no último mês, mas esses precisão de sua aprovação direta.
–isso eu já sei!– apoiou o cotovelo na mesa, repousando o queixo sobre a mão – não precisa jogar na minha cara que estou, praticamente, negligenciando meu trabalho ultimamente...
A discussão infantil se estendeu por tempo o suficiente para todos terminarem de comer e o clima melhorar um pouco. Victor observava a cumplicidade entre aqueles dois, eles realmente se conheciam muito bem e tinham um entrosamento perfeito. Como irmãos de sangue, mesmo não sendo, mas tinham compartilhado uma vida inteira juntos e isso tinha muito mais peso do que meros laços sanguíneos. Admirava isso, e agradecia por Yuuri estar na companhia de alguém tão dedicado quanto o cazaque.
Sorriu. Tinha que conseguir a aprovação de Otabeck, certo?
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Heart Of Kaleidoscope [Victuuri/ Otayurio]
RomanceVictor Nikforov, um ator e modelo russo. Renomado e respeitado em vários países a fora. Uma pessoa particularmente reservada em sua vida pessoal e com muito poucos escândalos em sua ficha, animado e bem educado. Sempre preocupado com sua imagem. E t...