MAYA
Solto os cabelos ao vento. A brisa fresca faz um esboço de sorriso formar no meu rosto, quase sem esperança. As folhas caem com o balanço dançante das árvores. Nuvens tampam o sol, formando uma sombra gigante e agradável. As pessoas no parque se divertem com sorrisos contagiantes e risadas sonoramente aconchegantes. Tudo à minha volta dá sinais de felicidade, decido me deixar invadir por ela. A cada passo, as preocupações caem. Meus pés se movem automaticamente, e sinto como se estivesse descalça sobre a grama fresca.
Empurro um pouco atrapalhada a porta do café que está agitado por ser sábado. O falatório chega zunindo em meus ouvidos. Vou em direção ao balcão abandonado, até surgir um garoto loiro que não parece ser coreano, nem mesmo asiático.
- Bom dia!- Sorri com uma arca dentária de dar inveja. Por isso, retribuo com um sorriso fechado para não me sentir levemente humilhada.- Gostaria de fazer seu pedido?
- Bom dia. Na verdade, vim para falar com a sua chefe.- Percorro o local com os olhos.
- Ah, a menina da entrevista de emprego!- Diz empolgado, me deixando esperançosa.- Ela gostou de você. Mas não conseguiu entrar em contato porque não achou seu currículo. Aqui entre nós, com aquela bagunça na sala também fica meio impossível achar algo.- Tento segurar o riso pelo jeito engraçado que se aproximou com a mão em formato de concha, sussurrando seriamente e com medo de escutarem.- Vou avisar que está aqui.- Assenti freneticamente.
Ele se afasta e sorrio aliviada, já sem atenção voltada para mim e podendo balançar a cabeça animada como se tocasse minha música favorita ao redor. Não demora muito para voltar e me acompanhar até uma porta no corredor, localizada ao fundo da cafeteria.
O cômodo de madeira imita o restante do estabelecimento. Sentada de frente para uma mesa grande e com muitas papeladas espalhadas sobre, a mulher sorridente me recebe, fazendo o nervosismo esvair por inteiro com seu jeito simpático.
Temos uma conversa fácil, como se não tivesse uma vaga de emprego entre nós, e sim duas estranhas de gostos comuns que acabam de formar uma amizade inusitada. Ela diz que entrará em contato comigo o quanto antes e que a vaga já é praticamente minha, tanto por ter preferência de proximidade do local quanto de pessoas "genuinamente gentis". Eu demonstro com todas as certezas o quão grata estou. Antes de sair do lugar flutuando de felicidade, peço um café forte e gelado para o atendente, cuja origem minha mente ainda tenta decifrar.
Chegando no apartamento, meu humor se espalha por todos os lados. Percebo que não é um dia tão ruim para dar a faxina que adiei por semanas. Coloco minha playlist para tocar, e às vezes ao invés de zanzar com o aspirador de pó, paro para fazer dançinhas esquisitas e interpretações dignas de fama ao som do R&B.
Termino um pouco depois da hora do almoço. Vou tomar o banho que meu corpo tanto pede. Coloco a água no frio pela temperatura quente que minha pele já possui com o suor grudento. Visto meu short folgado junto da blusa fresca de alça. Vou para a cozinha ainda colocando a cabeça enrolada pela toalha molhada para pensar em algo para preparar.
Percebo o quão não saudável sou ao carregar a caixa da pizza da noite passada e me sentar no sofá. Devoro em cerca de 5 minutos e estufada procuro algo de interessante na tela à minha frente. Deixo em um filme qualquer. Meus olhos se fecham por vontade própria quando me dou conta que passar a madrugada em claro não é nada proveitoso.
MINGYU
Percorro a área desentendido. Minha última lembrança é de que estava de noite e segui Maya até o quarto quando ela decidiu dormir cedo depois do passeio imprevisível que fez pelo parque com seu portfólio e lápis em mãos. Franzo o cenho por ter certeza que o quarto não é um lugar cheio de árvores. Fico tonto sem saber ao certo para qual lugar da floresta olhar. Procuro uma forma de descobrir qualquer pista de como vim parar aqui. Ando. Corro. Estou perdido na escuridão. Depois de muitos zigue-zagues inúteis, paro em frente a um rio. Sinto cheiro de perfume no ar. Canela. É quando a vejo. Linda em plenitude. Nas águas. Sorrindo, brincando como uma criança. Apenas iluminada pela luz da lua que já quase se despede pela manhã raiando e a deixando insanamente perfeita. E eu estou aqui. Sem querer deixar a realidade duvidosa à minha frente. Zarpo em sua direção, sou atraído pela cena. Como um pirata perdidamente hipnotizado pela sereia mais bela. Travo com a água já sobre meus joelhos. Não preciso abaixar a cabeça para saber disso. Simplesmente a sinto gelada sobre minha pele.
- Mingyu!
Mesmo a vendo se debatendo, não consigo ir para sua direção. O tempo para por alguns segundo como se acabasse de criar meu próprio pequeno infinito. Um zumbido soa. Perco completamente meus sentidos. Ela está se afogando. Não sou capaz de me mexer. Minha respiração começa a ficar descompensada, fazendo o peito subir e descer depressa. O infinito acaba quando insiste em gritar pelo meu nome...? Não entendo o que está acontecendo, nem quero. Aumento os passo me apressando, mesmo com as pernas dormentes. Os braços magros enlaçam meu pescoço porque eu não sei como toca-lá de início. Os cabelos fazem carinho no meu rosto assustado. Chove flores de jasmim. Estou perdido nas estrelas que insistem em ficar nesses olhos no momento que se afasta e encontram os meus. Me sinto embriagado de prazer pelo seu aroma mais perto do que nunca.
- Obrigada.- Ela diz molhando os lábios, fazendo água na minha boca.
As pálpebras se fecham, e tenho medo de que ela abra voltando a não me enxergar. Desencadeia arrepios por todo meu corpo, os abrindo e ainda parecendo me ver. Faz o medo desaparecer.
- Isso é real?- Sussurro para mim mesmo, mas ela escuta.
Seu corpo molhado pressiona contra o meu, o gelo que toma conta de mim derrete, explicando assim a razão pela qual Maya não está tendo hipotermia. Cada átomo dela irradia fogo. Pelo menos quando entra em contato com meu corpo. Como se não fosse o bastante. A roupa completamente encharcada e colada desenhando suas curvas chega a fazer uma gota de suor percorrer meu rosto. Me vejo em um beco sem saída. Sendo envenenado aos poucos. Prendo a respiração. Quando nem ao menos sei se algum dia pude inspirar e expirar. Minhas dúvidas se tornam inúteis na hora que sua mão levanta a minha. Os dedos levemente encostando os meus. Maya levanta meu queixo com a mão livre, me fazendo desviar a atenção do ato incrivelmente viciante. Seu olhar me abriga. Se apodera de mim, não ouso nem pensar em lutar contra. A ideia do corpo tão próximo que quase forma apenas uma pessoa, das minhas pernas roçando nas suas e bambeando, não de frio, mas de nervoso, faz todo fôlego que acabo de encontrar sumir de novo. Ouço algo, mas ignoro por um curto período, até me dar conta de que são seus pensamentos. Eles me dizem que eu sou o motivo do brilho cegante dos seus olhos. Que o teu sorriso aumenta por estar cogitando ganhar um beijo meu e jura nunca ter sido tocado e nem ao menos desejado isso antes. Que sou o único a despertar um arrepio interminável por todo seu corpo quando se aproxima abusivamente curiosa para se acolher em meus braços. Sou o motivo do calor inflamável de sua pele. O dono dos sonhos mais perfeitos que dão cores vivas a sua vida. Sou seu protetor, seu guia, tua sombra. Dizem também que possuo o cheiro mais viciante de todos existentes e até mesmo dos não existentes. Que seu segredo mais oculto e desejo mais profundo são a mesma pessoa, eu. Me parte quando eles sussurram que não entendem porque seu peito dói tanto ao ver minha partida. A saudade reprimida. Sou tua inspiração mais bela. E por fim, a voz em sua mente diz que me torno mais parte dela a cada dia. Como um solavanco, algo dentro de mim pulsa no milésimo segundo que a vejo piscar quase que em câmera lenta, com os olhos sorridentes e inocentes voltados para os meus sem saber que acabo de descobrir o que nem ela percebeu. E persiste em latejar por todo meu corpo. Desesperadamente sem parar. Até mesmo em minha boca e principalmente em meus ouvidos, fazendo a surdez se instalar. Levanto a sobrancelha e fito meu peito. De onde vem a coisa que parece se rasgar com numerosas batidas, pulos e socos. Maya solta meu rosto, mas deixa a pele por onde tocou formigando. A palma para sobre onde minha atenção e preocupação estão. Estremeço enrubescido focando agora em suas pupilas se dilatando.
- Seu coração está acelerado.
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Sky. {Mingyu} EM MUDANÇA
Fiksi PenggemarSe o céu não estivesse ali, Maya não estaria completa. A vida não teria sentido. Nem mesmo o amor existiria. A vaga lembrança de se deitar sobre a grama com sua mãe, depois de correrem alegremente pelo jardim, e observar o céu que a encantou mais qu...