Meridan andava de um lado para o outro dentro da sua sala escura no edifício do governo, em Cefurbo. A frustração tomava conta dele, a raiva se espalhava por todo seu corpo como o veneno de uma cobra peçonhenta. Sua preciosa invenção continha falhas, e isso poderia prejudicar todo o seu plano.
Ele já tinha feito o que estava ao seu alcance para tentar ocultar o defeito do primeiro e grande lote de rastreadores. Inventou desculpas, camuflou provas, mentiu e manipulou até mesmo soldados para que ficassem à espreita nos arredores da Central. Mas agora a verdade já rondava os ouvidos de Viktor Thiegan.
Já bastava pensar que ele estaria sempre por trás da implantação da Nova Era, - ele havia deixado Viktor levar todo o crédito por isto -; cogitar a possibilidade de ter o plano anulado era demais para Meridan. Seu trabalho árduo e duro jamais poderia ser desperdiçado. Em mente, não cobiçava o poder direto. Preferia manter-se discreto puxando as cordas de seus fantoches. O que o deixava com mais raiva era saber que um deles agora tinha escapado de seu controle por causa de um erro próprio. Odiava apelar para planos B, mas já que era o caso...
- Velho gordo maldito! - resmungou Meridan, deixando escapar um pouco de cuspe.
Parou em frente a grande janela que havia em sua sala e respirou fundo. Encarou o reflexo dos próprios olhos intensamente verdes no vidro. Tudo haveria de se resolver em questão de horas. Sentou-se em sua mesa e começou a escrever uma carta. Era melhor adiantar o trabalho que teria de ser feito a qualquer momento mesmo.
"Estimado Senhor Gobert,
É com o coração apertado que me dirijo ao senhor nesta carta. Os trágicos acontecimentos recentes exigem a presença da senhorita Lorna Thiegan em Cefurbo o quanto antes. Tenho absoluta certeza de que o pai dela prezaria isso imensamente, mesmo que as condições para que ela saia do esconderijo não pareçam favoráveis.
Além disso, carrego comigo a certeza de que a própria gostaria de estar aqui neste momento tão delicado. Até porque, agora chegou o momento de tomar o que lhe é de direito.
Reitero que farei absolutamente tudo o que for preciso para que ela esteja entre nós em total segurança. Espero que a confiança depositada por Viktor em minha humilde pessoa seja suficiente para que o senhor considere tal pedido.
Entenda, caro Gobert, que agora muitas coisas estão nas mãos da senhorita Lorna Thiegan e é imprescindível que ..."
Uma batida na porta fez com que Meridan interrompesse o que estava escrevendo. Jogou a caneta em cima da mesa, já sabendo o que estava por vir.
- Sim? - disse, com a voz firme.
Um funcionário qualquer de Viktor abriu a porta, de cabeça baixa. Se Meridan havia garantido algo em todos esses anos, era temor - que ele preferia chamar ironicamente de respeito.
- Sim? - repetiu. O homem entrou na sala em passos rápidos, o desespero visível estampado nos olhos quando ergueu a cabeça e encarou Meridan. A hora tão esperada finalmente chegou.
- Senhor - falou, a voz oscilante. - Governador Thiegan está acamado. Não sabemos o que aconteceu. Ele simplesmente estava tomando sua taça diária de vinho tinto. Desmaiou, e achamos que foi envenenado.
- Como? Como isso é possível? Como deixaram isso acontecer? É certo o diagnóstico? Quem faria uma coisa dessas? - Meridan ficou de pé, falando alto em tom de indignação.
- Por favor, senhor. - agora o funcionário também fungava, e levou as mãos ao rosto, enxugando as lágrimas - Por favor. Vamos investigar. Mas por hora, a urgência é outra, se me permite. Já chamamos todos os melhores médicos de Cefurbo. Eles não conseguem reanimar o Governador. De fato, as extremidades do corpo dele estão ficando... roxas. Embora o coração bata fraco... quem sabe o senhor não possa fazer algo mais efetivo.
- É claro, - respondeu Meridan, torcendo para que sua expressão facial fosse apenas de choque e terror. Procurou, inclusive, parecer um pouco trêmulo. - tudo o que eu puder fazer por Viktor, meu amigo. Vamos! Rápido!
E se levantou para acompanhar o funcionário até os aposentos de Thiegan, com o coração batendo rápido em satisfação e alívio.
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Crônicas da Nova Era - A Busca
FantasyLIVRO 1. Artur levava uma vida tranquila em uma vila sem nome até o desaparecimento de seu pai. Quando pensa em obter respostas para o acontecimento, acaba sendo levado até elas de forma inesperada e descobrindo algo muito maior por trás do que real...