Artur e Lucas estavam abrigados no topo de uma árvore. Haviam achado alguns frutos doces nela e se escondido ali para comer e passar a noite, além de se acalmarem a respeito dos acontecimentos recentes.
Mas Artur não conseguiu comer muito diante dos relatos de Lucas sobre a Central. Ouviu tudo, boquiaberto, apenas associando cada detalhe a seu pai, que estava preso naquele lugar horroroso. Tentou imaginar o tempo todo se seu pai tinha ou não se submetido aos efeitos dos rastreadores ou anestésicos. Será que seu pai era um trabalhador ou estava forçado ao treinamento do exército? E sua mãe? Estaria ela confinada também, trabalhando em algum serviço pesado, fazendo alguma coisa para fortalecer aquilo tudo, contra sua própria vontade? Saberiam eles o que realmente estava se passando por ali?
Lucas contou também a respeito da sua fuga. Levou dois tiros de raspão nas pernas, escondia-se também em topos de árvores e demorou muitos dias até conseguir se livrar da perseguição iminente de guardas. Só depois de muito tempo, quase morimbundo, encontrou Makai, que o ajudou a se recuperar. Com o tempo, estabeleceram fugitivos ali, ao redor, resgatando outras pessoas e escondendo-se. Queriam reunir quantos membros fossem possíveis para o R.Q.N.C3. Os planos dividiam-se sempre entre voltar à Ponta Quebrada e Cefurbo para disseminar notícias e formarem seu próprio exército para combater os planos da Nova Era. As possibilidades eram sempre perigosas, não havia gente suficiente, e agora, depois do desabamento, tudo tinha sido praticamente em vão.
Dormiram um sono inquieto e desconfortável. Artur acordou primeiro, sentindo o frio da manhã e os primeiros raios de sol iluminando a floresta. Cutucou Lucas e eles recomeçaram a caminhar. Artur sentiu um pouco de medo de perguntar o que fariam agora. Provavelmente seu incômodo transpareceu, porque Lucas logo disse:
- Não se preocupe, Art. Vai ficar tudo bem.
- Para onde estamos indo?
- Você vai ver...
E assim prosseguiram, em silêncio, e sem parar. Artur parou de tentar adivinhar as horas. Era difícil calcular algo por ali, com as árvores encobrindo o céu. Pensou em pedir para pararem um pouco, mas não precisou. Lucas logo o conteve, indicando uma nova árvore para que eles subissem. Lá em cima, apontou para algo não muito distante. Então, Artur viu:
- A Central!
- Perdemos tudo, Artur. Tudo o que tinhamos juntado até agora. Eu só consegui sair vivo dos escombros porque alguns de nossos sobreviventes estavam ali, escondidos, preparando-se para combater o que quer que fosse, como sempre havíamos combinado e nos preparado. Mas foram abatidos, eu suponho. Vamos ter que recomeçar aqui, eu e você. Com sorte, Makai e Anele vão se virar bem. Porém, não podemos ficar parados até reencontrá-los. Está disposto a fazer alguma coisa efetiva, agora?
O coração de Artur estava acelerado, cheio de esperança.
- SIM! - ele gritou - É tudo o que eu mais quero! É só me dizer o que temos que fazer, me fale! Eu faço tudo... tudo... meus pais...
- Calma, garoto. - Lucas advertiu. - Não podemos simplesmente entrar lá pela porta da frente, não é mesmo? Vamos ficar por aqui. Observar, colher informações. Decidir o que vamos fazer quando chegarmos lá. Se é que vamos conseguir entrar. Pense comigo, encontrar o seu pai ou a sua mãe no meio de tanta gente não é fácil. Eu mesmo nunca vi o exército sendo treinado. O prédio da Central é baixo, mas você não acreditaria na quantidade de portas e corredores que existem por lá.
Sim, qualquer coisa, pensou Artur. Agora sentia-se mais perto do que nunca de obter felicidade plena, de ver a busca pelo pai e pela mãe concluída. Não conseguia, em nenhum momento, assimilar os obstáculos que enfrentaria para isso.
Desceram da árvore e contornaram uma área de grama baixa, para ficarem no rumo da entrada do prédio. Passaram por uma área de folhas densas, todas caídas no chão, e algumas estavam amontoadas. Artur achou estranho, mas Lucas passou direto por elas. Ele, no entanto, se aproximou cada vez mais, enquanto o rapaz já se distanciava. Deu um chute no monte.
De repente, sentiu um movimento brusco por debaixo de suas pernas e viu-se preso e uma enorme rede trançada; pendurado em um árvore. Berrou o nome de Lucas, alarmado, e viu o amigo correr até ele.
- Droga, Artur, droga! Por que foi que você se meter aí dentro? Eu não acredito! - Lucas tentava de todas as maneiras escalar a árvore para ver onde a armadilha estava amarrada. Artur tentava se balançar para que a rede se soltasse, mas em vão. Lucas também se cansou e ficou lá embaixo, olhando para o menino sem esconder o desespero. Tinha as duas mãos na cabeça e andava de um lado para outro.
Até que, num movimento brusco, um estampido atingiu a corda que segurava a rede em que Artur estava preso, e ele caiu com tudo no chão. Lucas correu para ele, checando se algum membro estava quebrado e ajudando-o a se desvencilhar dos fios trançados. Não perceberam que, nesse meio tempo, estavam sendo cercados por mais ou menos uma dúzia de guardas armados. Até que um deles falou:
- Olá, garotos. Por favor, não façam movimentos bruscos. Se levantem e se virem para nós bem lentamente. Vocês também estão cercados pelo alto. Vamos ser gentis, por enquanto, e vamos levá-los até a Central para um interrogatório. Tivemos informações sobre rebeldes não capturados correndo pelos entornos e temos certeza que vocês fazem parte do grupo, portanto, poupem-nos de qualquer justificativa que lhes passar pela cabeça. Estamos entendidos?
Artur tremeu. Iria, finalmente para a Central. Não como gostaria, mas iria - e tinha sido mais fácil do que imaginava. Olhou para Lucas e no fundo de seu coração confiou que em breve, já dentro do prédio cinza, eles dariam um jeito de fazer alguma coisa. Para sair de lá, e é, claro, para encontrar seus pais.
Ele e Lucas colocaram as mãos atrás da cabeça e seguiram as instruções passadas. O guarda que liderava aquela pequena comoção posicionou-se atrás deles, com armas apontadas para suas costas. Os outros cercaram-lhes e foram guiando o caminho.
E, pela primeira vez na vida, Artur entendeu que felicidade e medo podiam sim caminhar juntos e no mesmo ritmo.
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Crônicas da Nova Era - A Busca
FantasyLIVRO 1. Artur levava uma vida tranquila em uma vila sem nome até o desaparecimento de seu pai. Quando pensa em obter respostas para o acontecimento, acaba sendo levado até elas de forma inesperada e descobrindo algo muito maior por trás do que real...